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Críticas à nomeação de Bolton para a ONU

(av)2 de agosto de 2005

O presidente Bush escolheu o ex-secretário de Estado adjunto para Controle de Armamento como embaixador dos EUA na ONU. Para tal, aproveitou-se do recesso do Congresso. Reações oscilam entre reticência e censura.

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George W. Bush (esq.) e seu novo embaixador na ONU, John BoltonFoto: dpa

O presidente norte-americano, George W. Bush, nomeou nesta segunda-feira (01/07) John Bolton, ex-secretário de Estado adjunto para Controle de Armamento, como novo embaixador dos EUA na ONU. Depois de os democratas e mesmo alguns republicanos barrarem durante meses a indicação no Senado, o chefe de Estado fez uso do meio mais radical que a Constituição lhe permite. A nomeação deu-se por decreto presidencial, passando por cima do Senado, um fato sem precedentes na história do país.

Para tal, Bush aproveitou-se do recesso de verão do Congresso, que lhe permite tomar uma decisão desse porte sem a aprovação do Senado. O motivo para tamanha urgência é óbvio: a cadeira dos EUA na ONU está vazia há mais de seis meses, e já em setembro próximo a Assembléia Geral da ONU vai se reunir para deliberar sobre a mais abrangente reforma de seus 60 anos de existência.

Declarações antidiplomáticas

A oposição estadunidense condena não só os métodos do presidente como a escolha em si, alegando que o diplomata de 56 anos seria inadequado para o cargo, não só do ponto de vista pessoal quanto em termos de competência. Nos últimos tempos, Bolton tem primado tanto pela crítica cáustica às Nações Unidas, como por sua hostilidade aberta contra os que questionam a política externa da administração Bush.

O ex-encarregado do Controle de Armamento já chegou mesmo a questionar a própria existência da organização, nas ocasiões em que ela se interpôs aos interesses americanos. Como ao declarar: "Não existem 'Nações Unidas'. Só há uma comunidade internacional, que ocasionalmente pode ser liderada pela única superpotência. Se o prédio da ONU tivesse dez andares a menos, não faria diferença".

Mensagem nas entrelinhas

Enquanto isso, na Organização das Nações Unidas a notícia foi recebida com relativa fleuma. Alguns diplomatas declararam-se até mesmo aliviados de que o representante dos EUA seja finalmente alguém indicado pelo presidente.

O secretário-geral, Kofi Annan, afirmou que considera Bolton "muito capaz e inteligente". Ele acentuou a necessidade de cooperação nos próximos meses, "para implementar as reformas pelas quais tantos países-membros se empenharam". Fazendo jus a sua função de diplomata-mor, Annan evitou qualquer observação negativa contra o novo homem de Washington na ONU, ou sequer uma alusão às complicadas relações entre os EUA e a organização mundial.

Só nas entrelinhas permitiu-se uma mensagem velada: "Acredito que, quando um embaixador está realmente disposto a ouvir os outros, a trabalhar em conjunto e, em geral, a procurar termos de compromisso aceitáveis, então ele será bem-sucedido aqui", comentou Annan. Na central da ONU em Nova York, paira justificada dúvida de que o conservador linha-dura esteja disposto a compreender o sutil conselho do secretário-geral.

Na próxima página, leia as reações da imprensa européia à nomeação de John Bolton.

Crítica aberta

Em contraste às diplomáticas reações das Nações Unidas, a imprensa européia julgou a nomeação de Bolton com decidido rigor.

O jornal Thüringische Landeszeitung, de Weimar, analisa assim a situação: "Kofi Annan diz o que se costuma dizer em tais ocasiões: 'Vamos cooperar bem dentro do quadro de possibilidades'. O quadro já está mais do que montado, e a coluna de concreto plantada por Bush ou vai se esfacelar com o tempo ou em algum momento tornar-se uma figura do passado. Pois embaixadores vêm e vão. E são sempre servidores de seus senhores. Desse ponto de vista, o Congresso devia quase dar-se por feliz de haver sido ludibriado – assim lhe sobra a evasiva de nunca haver escolhido Bolton. Só que, da forma como Bush procede, não é possível. Muito menos quando se pretende notoriamente ensinar democracia ao resto do mundo."

O austríaco Salzburger Nachrichten acusa o presidente norte-americano de "passar por cima do Senado", acrescentando: "Além disso, seu procedimento diz muito sobre a flexibilidade e o conceito de democracia do presidente".

O Berliner Zeitung abre o jogo: "George W. Bush quer evitar por todos os meios que a Assembléia Geral acabe conseguindo uma maioria de dois terços para a proposta de reforma apresentada pela Alemanha, entre outros. No entanto, seu procedimento também mostra como o tempo urge para o presidente, nove meses após sua segunda eleição. Sua influência já começa a minguar. Apesar das amplas maiorias republicanas em ambas as câmaras do Congresso, ele tem problemas em impor suas metas políticas".

O General-Anzeiger de Bonn disseca a postura do novo embaixador estadunidense em relação à ONU: "A crítica de Bolton não visa fortalecer a ONU. No fundo, ela não é nada mais do que rejeição radical, com tons nacionalistas. Em comparação com Bolton, até mesmo o secretário de Defesa Donald Rumsfeld pode posar de diplomata sensível. Bush se decidiu por Bolton por ele ser tão popular junto à ala conservadora do partido. A ONU é um alvo de hostilidade favorito da direita mais radical, e de um embaixador na ONU só se espera uma coisa: que faça valer os interesses dos EUA."

O romano La Repubblica fala da fria "vingança do imperador ofendido e de seus correligionários neoconservadores", interpretando o golpe de Bush como reação à "bofetada de 2003": "A conta aberta de então – quando o Conselho de Segurança ousou rebelar-se contra o ditame norte-americano, recusando-lhe a permissão institucional para investir contra o Iraque – está paga. Desde ontem não há mais agitadores no prédio da ONU, mas sim um exterminador, escolhido por Bush, para expressar todo o seu desprezo e impaciência pela sexagenária, beligerante Organização das Nações Unidas".