Conselho dos Judeus
19 de julho de 2010O Conselho Central dos Judeus na Alemanha é uma instituição com duas finalidades: uma política e outra religiosa. Ele representa 120 mil pessoas das mais de 100 comunidades judaicas no país e preocupa-se, acima de tudo, com a integração de judeus imigrados.
Ao mesmo tempo, o Conselho intervém em debates sociais e, faz prevalecer sua voz como "instância moral quando se trata de temas como radicalismo de direita, passado nazista e Holocausto.
Charlotte Knobloch, presidente do Conselho Central dos Judeus na Alemanha desde 2006, mostra-se quase incrédula diante dos números. "O fato de hoje existirem mais de 120 mil judeus na Alemanha é quase um milagre."
O Conselho Central dos Judeus na Alemanha foi fundado em 19 de julho de 1950, cinco anos depois do fim da Segunda Guerra Mundial. O conflito praticamente exterminou a comunidade judaica na Alemanha.
Dos cerca de 500 mil judeus que viviam no país antes da guerra, restaram 15 mil pessoas. Um terço deles havia escapado do regime vivendo na ilegalidade, os demais retornaram dos campos de concentração ou do exílio. Outros eram os chamados "displaced persons", judeus da Europa oriental que não podiam voltar para seus lares.
"Sentados sobre a mala"
Para a maioria desses judeus, a Alemanha deveria ser apenas um local de estada temporária. Heinz Galinski, o primeiro presidente do Conselho Central dos Judeus na Alemanha, conta que havia poucas perspectivas para aquela população depois das atrocidades da Segunda Guerra.
"Nossa tarefa era dar à comunidade judaica uma maior consciência e oferecer a possibilidade de se organizar aqui. Em qualquer lugar onde vivessem pessoas judias, era preciso haver uma sociedade organizada. E naquela época isso era muito difícil – muitas pessoas estavam ainda indecisas se ficariam ou não na Alemanha. Veio daí a expressão 'sentado sobre malas prontas'."
Além da assistência concreta e do trabalho de reconstrução das comunidades, naquela época a prioridade do Conselho Central era participar da legislação sobre a indenização dos judeus vítimas do regime nazista.
Instância moral
Já naquela época, o Conselho não era considerado apenas representante dos judeus na Alemanha, mas também uma instância moral: uma instituição cujos representantes alertavam para o antissemitismo, para o neonazismo e para que não fossem esquecidos os fatos históricos.
A maneira de lidar com o passado é, até hoje, um tema importante. Em 1998, uma declaração do autor alemão Martin Walser culminou num debate público. Numa conversa, o escritor criticou a forma como os alemães lidam com sua culpa na História – e, quando se referiu ao uso de Auschwitz como um cansativo argumento moral, foi aplaudido pela plateia.
O então presidente do Conselho, Ignatz Bubis, chamou Walser de "incendiário espiritual", que estaria tentando colocar um ponto final no passado nazista.
No fim do seu mandato, em 2000, Bubis mostrou-se resignado. "Eu nunca tentei dizer que Auschwitz é um problema coletivo do povo alemão, e que a responsabilidade é coletiva. Eu tentei apenas comunicar a mensagem: vocês precisam saber o que aconteceu – mas eu notei que para as pessoas isso era secundário, que era tinha pouca importância."
Fator imigração
O Conselho Central assistiu a um crescimento da comunidade judaica nas décadas de 1960 e 1970, provocado pela imigração de judeus da Polônia e da antiga União Soviética. Em 1990 chegaram ao país milhares deles, novas comunidades foram fundadas e as antigas cresceram.
"Pode soar um pouco incomum, mas os imigrantes da antiga União Soviética foram os que realmente estabeleceram a vida judaica na Alemanha num longo prazo. Surgindo assim o judaísmo moderno e autoconfiante", avalia Knobloch.
Ainda assim, os indivíduos das comunidades viam-se confrontados com grandes desafios, inclusive entre os tradicionais e os novos membros. Muitos dos recém-chegados não falavam alemão e não tinham familiaridade com os ritos religiosos e com a cultura judaica.
"Eles tiveram que aprender sobre a identidade judaica e sobre a religião, desde que manifestassem interesse, claro. Tudo teve de ser ensinado, pois o desenvolvimento da comunidade judaica depende enormemente da nossa capacidade de consolidar as raízes judaicas nos nossos novos membros", diz Knobloch.
Relações oficiais
Em 2003, a relação entre o governo alemão e o Conselho Central dos Judeus entrou numa nova fase: o Bundestag aprovou uma lei que faz referência à relação com a instituição judaica.
O acordo estatal selado entre ambas as partes também garantiu à comunidade uma ajuda financeira anual de 5 milhões de euros concedida pelo governo. O acordo é visto não apenas como prova de confiança mútua – ele também ajuda o Conselho a cumprir sua ampla missão social e cultural junto à comunidade.
Grande parte das posições assumidas pelo Conselho Central refere-se a Israel, país com o qual o Conselho tem uma grande ligação. Somente nos últimos tempos é que o Conselho passou a fazer críticas ocasionais – se bem que cuidadosas – relacionadas à política israelense.
Mudança à vista
Até hoje, a instituição foi liderada por pessoas diretamente afetadas pela perseguição nazista, que viveram escondidas ou sobreviveram aos campos de concentração, uma geração contemporânea de testemunhas. Charlotte Knobloch, cujo mandato à frente do Conselho acaba ainda este ano, enxerga uma mudança à frente.
"Em poucos anos, não haverá mais vítimas ou perpetradores [do Holocausto]. Até lá, temos que entender que não temos mais que falar sobre culpa e vergonha, mas mais em responsabilidade", opina Knobloch.
O Conselho Central não está diante apenas de uma renovação em nível pessoal. Há também muita controvérsia sobre sua representação exclusiva, questionada principalmente por comunidades judaicas liberais.
Autora: Cornelia Rabitz (np)
Revisão: Roselaine Wandscheer