Conciliação exemplar da França com a Alemanha
A França tem três feriados nacionais: 14 de julho, em que é lembrada a Revolução Francesa e a Queda da Bastilha; 11 de novembro, que marca a capitulação alemã e o fim da Primeira Guerra Mundial; e o 8 de maio, fim da Segunda Grande Guerra.
Foi pensando no processo de reconciliação com a Alemanha que, em 1975, o então presidente francês Valéry Giscard d'Estaing havia tentado cancelar o feriado do 8 de maio. Além de valorizar com isso o 11 de novembro de 1918, ele gerou protestos de combatentes da Resistência e de veteranos da Segunda Guerra. Estes queriam continuar festejando a capitulação de 1945 e obrigaram o presidente a revogar a decisão.
Colaboração com governo nazista
Não só a liberdade reconquistada, a vitória sobre o fascismo e o fim de uma guerra horrenda são lembrados neste dia. Em primeiro plano, os franceses festejam a consciência tranqüila de um país que não conseguiu se libertar por força própria.
Mesmo que ainda hoje seja comemorado de forma pomposa, no subconsciente dos franceses o 8 de maio carrega consigo um sabor de amargura. Isto porque algumas semanas após a invasão da França pelo Exército alemão, em maio de 1940, a Terceira República foi dissolvida e a Assembléia Nacional transferiu o poder ao já ancião marechal Philippe Pétain. Este estabeleceu imediatamente um novo governo com sede em Vichy e iniciou uma política colaboracionista com a Alemanha de Hitler.
A ocupação do país pelas tropas alemãs e a libertação de cidades francesas por tropas aliadas após o desembarque na Normandia, em agosto de 1944, expuseram ao mundo as fraquezas da França, minimizando a importância da Resistência. Somente depois do apelo do general De Gaulle de seu exílio em Londres é que se formaram grupos de combatentes para auxiliar os Aliados e grupos de exilados na reconquista do país.
Nascimento de uma nova autoconfiança
Enquanto a Alemanha pós-1945 viveu sob o temor de algum dia voltar a ser tão forte e perigosa quanto durante o regime de Hitler, a França concentrou seus esforços em que nunca mais se repetissem a fraqueza e a impotência de 1940.
Para a Grande Nation − denominação, aliás, criada pelo semanário alemão Der Spiegel −, o 8 de maio é o início de uma nova autoconfiança, que marcara sua história graças a Joana D'Arc e Napoleão, mas que tivera um fim provisório com o governo de Pétain.
Às vezes ridicularizada, a propensão francesa de ressaltar seu prestígio é uma conseqüência direta deste histórico ataque de fraqueza, que teve seu fim no 8 de maio.
De Gaulle e a recuperação
A França não esteve presente quando Roosevelt, Churchill e Stalin reorganizaram a ordem política mundial após o fim do conflito. As derrotas francesas na Indochina; as dificuldades enfrentadas na época em que a Alemanha vivia seu milagre econômico; a guerra na Argélia − todas são demonstrações claras de que a França havia perdido seu poderio no mundo.
Somente o retorno do general De Gaulle ao país, em 1958, trouxe a tão esperada recuperação: a França tornou-se potência nuclear, às colônias na África foi concedida a independência, e as hostilidades com a Alemanha chegaram ao fim, dando lugar a uma reconciliação exemplar.
O 8 de maio significa para a França o lento e doloroso despertar de uma paralisia e a esperança de uma nova grandeza. Muitos dos atos de determinação do governo em Paris − independentemente de que partido − ainda hoje remontam ao 8 de maio.