Como o Brexit pode afetar não europeus
10 de abril de 2019A incerteza sobre o resultado do Brexit prevalece em toda a parte – entre os cidadãos da UE que vivem no Reino Unido, os cidadãos do Reino Unido que vivem na UE, empresas, viajantes e, de uma forma ou de outra, entre todos os outros.
A categoria "todos os outros" pode ser dividida em cidadãos não comunitários que residem no Reino Unido e cidadãos que não são da UE mas que vivem na UE e trabalham ou viajam para o Reino Unido. Há também a questão dos efeitos diretos e indiretos.
Então, o que um Brexit sem acordo entre Reino Unido e seus maiores parceiros comerciais na Europa significaria para americanos, australianos, indianos, brasileiros, e outros cidadãos de fora da UE que trabalham no Reino Unido, passam lá férias ou estão pensando em investir no país?
Viajantes
Voos para a Europa estão no nível mais barato dos últimos três anos, e Londres é o destino mais popular para a geração dos chamados "millennials", segundo o aplicativo de viagens online Hopper. O preço médio do voo dos EUA para Londres em 2019 é de 782 dólares (735 euros), abaixo dos 796 dólares em 2018.
Embora não sejam estritamente relacionados com o Brexit, os preços podem cair ainda mais no caso de haver uma saída britânica da UE sem acordo. Isto é: se ainda houver voos para pegar. A Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA) avisou que até 5 milhões de passagens aéreas poderão ser canceladas se não houver acordo entre as partes.
E, a menos que outras providências sejam firmadas entre o Reino Unido e a UE, as companhias aéreas de baixo custo licenciadas no Reino Unido perderão o direito de voar para e da UE e entre os demais Estados-membros da UE, o que, naturalmente, atingirá todos, dentro ou fora do bloco.
Além disso, os serviços do trem Eurostar entre Londres e Paris e Londres e Bruxelas poderão ser suspensos depois de um Brexit sem acordo. O governo britânico pediu aos passageiros dos trens internacionais que verifiquem se têm "seguros e termos e condições de passagens" que sejam "suficientes para cobrir possíveis interrupções".
E também há os prováveis engarrafamentos. Pesquisadores do Imperial College dizem que dois minutos adicionais gastos na verificação de cada veículo em Dover e Folkestone, portas de entrada na costa inglesa, podem levar a engarrafamentos de quase 50 quilômetros em rodovias próximas.
Para a maioria dos cidadãos não britânicos, é necessário algum tipo de visto para permanência e uma autorização de trabalho para trabalhar, e isso não mudará. Mas para quem está trabalhando parcialmente no Reino Unido e, também em cidades como Berlim ou Paris, o cenário fica muito mais incerto.
A libra
Todas as crises escondem oportunidades, dizem alguns. Assim, para os viajantes de fora da UE, o dinheiro provavelmente renderá, à medida que a libra deve cair, como se espera, até ficar em torno da paridade com o euro. A moeda do Reino Unido custa em torno de 1,30 dólar, e um Brexit sem acordo provavelmente empurraria a libra ainda mais para baixo, aumentando as perdas em relação ao dólar americano em cerca de 13% desde o referendo de 2016.
Segundo o pior cenário do Brexit previsto pelo Banco da Inglaterra, a libra cairia 25% para aproximadamente o mesmo valor que o dólar. Se você quiser comer, no entanto, essa economia pode, por sua vez, ser consumida por preços de alimentos mais altos.
Estudantes
Cerca de 20% dos estudantes universitários do Reino Unido são estrangeiros e contribuem com mais de 20 bilhões de libras (22,5 bilhões de euros ou 26,5 bilhões de dólares) para a economia do Reino Unido.
Cerca de 40% dos estudantes internacionais da UE que participaram na pesquisa QS International Student Survey (ISS) de 2018 disseram estar menos propensos a estudar no Reino Unido devido ao Brexit – em comparação com apenas 10% dos estudantes não pertencentes à UE.
Talvez surpreendentemente, o QS ISS 2018 tenha descoberto que quase dois terços dos futuros estudantes estrangeiros tenham dito que o Brexit não afetaria seu interesse em estudar no Reino Unido.
Direitos de residência
Os cidadãos da UE que já residem permanentemente no Reino Unido manterão os seus direitos ao abrigo do Sistema de Registro de Cidadãos da UE (EU Settlement Scheme), sendo improvável que a situação dos cidadãos de países terceiros seja alterada.
Cidadãos de fora da UE poderão ter os mesmos direitos de imigração depois do Brexit, como disse a primeira-ministra britânica, Theresa May.
Durante a campanha do referendo de 2016, alguns defensores do Brexit procuraram atrair eleitores da diáspora sul-asiática no Reino Unido com promessas de que a saída da UE – permitindo que Londres restrinja os direitos dos cidadãos da UE de viajarem para o Reino Unido – poderia possibilitar que o governo facilite as regras para os cidadãos de países não europeus. Mas isso é algo incerto.
Empresas
Investidores de fora da UE também podem estar olhando para algumas dessas empresas à beira da falência, esperando uma oportunidade para fazer negócios. No entanto, uma libra mais fraca também elevaria os preços das ações de muitas das maiores empresas britânicas que fazem negócios em todo o mundo, como a British American Tobacco e a GSK.
As empresas do índice FTSE 100, da bolsa de valores de Londres, ganham 70% de sua receita no exterior. E um dólar forte não é algo bom para os mercados de ações dos EUA, porque torna as ações americanas mais caras para investidores estrangeiros.
Outra preocupação é que o impacto de um Brexit sem acordo nos mercados financeiros globais possa atingir os bancos americanos que estão em "risco sistêmico", segundo o órgão americano Conselho de Supervisão de Estabilidade Financeira (FOSC).
Empresas de finanças dos EUA com operações substanciais em Londres não teriam os chamados "passporting rights", os direitos para atuar nos outros países da UE, e precisariam ser autorizadas separadamente "pelos países membros da UE, aumentando as preocupações quanto à continuidade contratuais para um valor substancial e volume de contratos financeiros", escreveu o FOSC.
Os bancos e instituições financeiras dos EUA são responsáveis por entre 40% e 60% da atividade nos mercados globais de derivativos e usam Londres como uma plataforma para atender clientes na UE.
Investidores e trabalhadores
O Reino Unido foi o quinto maior mercado de exportação dos Estados Unidos em 2018, e os EUA foram o principal parceiro comercial do Reino Unido em 2018. O Reino Unido é o maior investidor estrangeiro direto nos EUA, com cerca de 615 bilhões de dólares, enquanto os EUA detêm a mesma posição no Reino Unido, com cerca de 540 bilhões de dólares.
A maioria dos economistas prevê que a economia do Reino Unido vai desacelerar no curto prazo, pelo menos enquanto as empresas seguram seus gastos até que o governo do Reino Unido decida exatamente como vai se separar da UE. As empresas dos EUA empregam cerca de 1,4 milhão de cidadãos britânicos, e as empresas britânicas empregam mais de 1,1 milhão de americanos nos EUA. O Banco da Inglaterra estima que, no pior caso, o Brexit pode afetar a economia com um encolhimento de 5% em um ano.
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