Integração estagnada
22 de julho de 2009As negociações sobre um acordo comercial entre a União Europeia (UE) e o Mercosul estão na geladeira. Embora os europeus ainda sejam os principais parceiros econômicos do Mercosul, uma aproximação mercantil entre as duas comunidades ainda depende da conclusão da Rodada de Doha, conjunto de negociações que visam diminuir as barreiras comerciais no mundo e que estão atualmente emperradas.
Os sul-americanos reclamam das políticas européias de subvenções e de protecionismo, que consideram o principal empecilho para a penetração de seus produtos agrícolas no velho continente.
O fracasso nas negociações de Doha pode fazer com que os europeus prefiram se aproximar de outros blocos econômicos regionais em detrimento do sul-americano, afirma a cientista política Claudia Zilla, integrante do Grupo de Estudos Americanos do Instituto Alemão de Assuntos Internacionais e de Segurança (SWP) de Hamburgo.
Mercosul: união aduaneira com muitas exceções
"As negociações entre a UE e o Mercosul para um acordo de associação estão hoje totalmente estagnadas, a ponto de podermos dizer que o bloco europeu está atualmente mais inclinado a fechar acordos de associação com outros sistemas de integração na região, como é o caso da Comunidade Andina", explica Zilla.
Por conta de seus problemas internos de integração, o peso político do Mercosul também tem diminuído, o que faz com que os sul-americanos percam terreno entre as prioridades da UE. Na avaliação da especialista, um dos motivos para esse enfraquecimento no panorama internacional é o fato de até hoje o Mercosul ainda não ter conseguido cumprir satisfatoriamente as metas estipuladas quando da sua criação.
"É uma união aduaneira, mas que contém muitas exceções, e é também uma zona de livre comércio imperfeita. Isso quer dizer que já os primeiros passos do processo de integração não foram plenamente alcançados, nem seu aprofundamento foi realizado de forma satisfatória."
Ingresso da Venezuela preocupa europeus
Os tímidos e lentos progressos do processo de entrosamento do Mercosul, bem como a opção de ampliar o bloco com a acolhida da Venezuela colaboraram para aumentar a insegurança dos europeus, que temem que a ampliação prejudique ainda mais o aprofundamento de laços na região.
"Com a inclusão da Venezuela, que ainda não se completou porque não foi aprovada pelos congressos do Brasil e do Paraguai, há uma certa incerteza sobre o rumo que o Mercosul vai tomar", ressalta a politóloga.
China é cada vez mais importante para o Brasil
Além disso, os próprios países-membros têm tido ultimamente outras prioridades, optando por agir isoladamente, fechando acordos bilaterais de cooperação com a UE ou dando mais atenção ao comércio com a China, por exemplo, que ganha cada vez mais influência na região.
"O Mercosul tem um papel cada vez menor dentro do volume comercial do Brasil. Além disso, a China tem se desenvolvido, tornando-se um parceiro comercial de peso cada vez maior. Atualmente, a China é mais importante para o Brasil do que a Argentina."
Paraguai e Uruguai não veem mais vantagens
A economista Barbara Fritz, professora de economia da América Latina da Universidade Livre de Berlim, lembra que as diferenças políticas entre os integrantes do Mercosul também contribuem para dificultar a integração do bloco e, consequentemente, abalam a confiança dos parceiros europeus.
"Um exemplo é a Venezuela, que tem grandes divergências comerciais com o Brasil. Argentina e Brasil também têm orientações diferentes em suas políticas de exportação", observa Fritz. Segundo ela, mesmo os integrantes menores, como Paraguai e Uruguai, já não veem tanta vantagem no projeto como há alguns anos.
"Esses países reclamam que no Mercosul a maior parte das decisões é tomada pelos grandes membros, Brasil e Argentina, e que os pequenos têm pouca influência. Antes, essas nações viam no projeto uma plataforma que trazia vantagens em foros internacionais, nos quais países pequenos têm pouco peso isoladamente. Agora, sua influência regional está tão pequena que isso reduz a vantagem que tinham nas negociações globais, e o custo do Mercosul se tornou caro demais para eles", explica.
UE e Mercosul: valores comuns
Entretanto, a cientista política Claudia Zilla ressalta que, apesar do pouco progresso na aproximação comercial entre UE e Mercosul, os dois blocos compartilham visões e interesses comuns e estão envolvidos em um intercâmbio político contínuo.
"Politicamente, há um diálogo constante e valores comuns aos dois blocos. Tanto o Mercosul quanto a União Europeia favorecem soluções pacíficas para conflitos internacionais. Ambos são defensores do multilateralismo e a favor de um mundo multipolar. São naturalmente valores comuns que, no entanto, não chegam a ser implementados conjuntamente."
Autor: Marcio Damasceno
Revisão: Rodrigo Rimon