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Lula reposiciona o Brasil no palco global

Thomas Milz
Thomas Milz
20 de novembro de 2024

Assinatura da declaração final do G20 por todos os participantes foi uma vitória dos diplomatas brasileiros. Mas no tocante ao clima ou aos atuais conflitos, texto não passa de uma compilação de lugares-comuns vagos.

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Luiz Inácio Lula da Silva, Olaf Scholz e Emmanuel Macron na cúpula do G20 no Rio de Janeiro, 2024
Presidente Lula conversa com Olaf Scholz e Emmanuel MacronFoto: Silvia Izquierdo/AP

Na cúpula do G20, no Rio de Janeiro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva por fim conseguiu o que queria, e muitos observadores consideravam improvável: uma declaração final conjunta em que os três temas mais importantes de sua agenda foram registrados: combate à fome e pobreza, transição energética e reforma das instituições globais. Essa é a boa mensagem do evento – a única, em meio a formulações vagas e uma comunidade mundial dividida.

Agora a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza do mandatário brasileiro conta com o apoio de 82 países, inclusive da Argentina, cujo presidente, Javier Milei, acabou não concretizando a ameaça de boicotar a declaração final. Seria interessante descobrir como o pessoal de Lula conseguiu que o rebelde rockstar político de penteado indomável não transformasse o G20 num fiasco total. Pois é o que parecia, desde que Milei se manifestara publicamente contra quase todos os planos do Brasil para o documento conclusivo.

A Aliança Global contra a Fome e a Pobreza é a maior conquista do Rio, também para Lula pessoalmente. Já durante seus dois mandatos presidenciais anteriores, de 2002 a 2010, ele tentou inutilmente lançar um projeto global de combate à fome e à pobreza. Agora essa sua causa tão íntima parece estar no bom caminho – embora seja sempre bom ter cautela com as promessas ultra nebulosas que um acordo do G20 representa.

Pragmatismo forçado sob a sombra de Trump

Já o segundo ponto central da agenda do petista, o combate à crise climática, deixou bem claro quão dividido o mundo está no momento. De um lado, os países industrializados ricos exigem a participação das nações emergentes no fundo para o clima: grosso modo, trata-se de uma disputa entre o G7 e o Brics. Esse dilema já resultou num impasse na conferência do clima COP29, que transcorre simultaneamente no Azerbaijão.

Tampouco no Rio se chegou a resultados palpáveis. Oficialmente mantém-se a meta de limitar o aquecimento global em 1,5ºC em relação aos níveis pré-industriais – taxa essa que, afinal, há muito já foi ultrapassada. Na declaração final do G20 procuram-se inutilmente comprometimentos concretos para salvar o clima global.

Pois, afinal, nem mesmo Lula e seus hábeis diplomatas podem fazer milagres. Perante os crescentes antagonismos entre o Ocidente e a China-Rússia, os sinais globais apontam atualmente antes na direção do conflito do que da cooperação construtiva. Perante desse quadro, no encerramento da cúpula Lula citou Nelson Mandela: "É fácil demolir e destruir; os heróis são aqueles que constroem". E acrescentou: "Vamos seguir construindo um mundo justo e um planeta sustentável."

Em relação aos dois grandes conflitos armados atuais, a declaração final do Rio permanece vaga. Consta uma advertência geral pela paz na Ucrânia, mas sem citar nominalmente a agressora Rússia. Nesse ponto, os países ocidentais não conseguiram se impor.

Isso também tem a ver com o fato de o democrata Joe Biden, presente à conferência, estar em vias de entregar a presidência dos Estados Unidos. Portanto ele não teve como prometer muito nem fazer grande pressão na cúpula, já que Donald Trump poderá reverter tudo quando assumir a Casa Branca.

Vagos lugares-comuns: uma vitória diplomática?

Assim, o documento não se pronuncia explicitamente pela integridade territorial ucraniana: motivo de alegria para a Rússia, presente no Rio só através de seu ministro do Exterior. E o fato de o ataque do Hamas contra Israel não ser mencionado com uma só palavra deveria ser considerado, na verdade, uma falha imperdoável, como enfatizou a delegação alemã. Ainda assim, o chanceler federal Olaf Scholz acabou por assinar a declaração final.

Em compensação, defende-se a solução de dois Estados e o reforço à assistência humanitária para os palestinos. Ao que tudo indica, não condenar explicitamente Israel por seu procedimento na Faixa de Gaza foi parte do acordo: aqui, nenhuma crítica a Israel; lá, nenhuma crítica à Rússia.

E quanto à reforma das instituições globais, incluindo a ONU e o Fundo Monetário Internacional (FMI), as esperanças ficam depositadas na África do Sul, que preside o G20 nos próximos 12 meses. Pois no Rio a busca de um compromisso por uma representação mais justa já foi celebrada como uma vitória diplomática.

Isso é bem pouco palpável, assim como tantas coisas nesta cúpula do G20. Contudo, hoje em dia é preciso reconhecer como uma grande façanha diplomática o mero fato de Lula e seus assessores terem sequer conseguido compilar um documento cheio de vagos lugares-comuns.

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Thomas Milz saiu da casa de seus pais protestantes há quase 20 anos e se mudou para o país mais católico do mundo. Tem mestrado em Ciências Políticas e História da América Latina e, há 15 anos, trabalha como jornalista e fotógrafo para veículos como a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. É pai de uma menina nascida em 2012 em Salvador. Depois de uma década em São Paulo, mora no Rio de Janeiro há quatro anos.

O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente da DW.

Thomas Milz
Thomas Milz Jornalista e fotógrafo
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Realpolitik

Depois de uma década em São Paulo, Thomas Milz mudou-se para o Rio de Janeiro, de onde escreve sobre a política brasileira sob a perspectiva de um alemão especializado em Ciências Políticas e História da América Latina.