Ciência aprimora a criação de organismos sintéticos em laboratório
2 de abril de 2014Há doze anos, pesquisadores criaram o primeiro vírus sintético. Cinco anos mais tarde, eles reconstruíram completamente o genoma de uma bactéria. Agora, os biólogos deram um passo além. Jof Boeke e seu time do Centro Médico Langone, da Universidade de Nova York, sintetizaram um dos 16 cromossomos de uma célula de levedura. E elas se parecem mais com os seres humanos do que se pensa.
"Células de levedura são muito mais próximas das células humanas. Talvez as lições que aprendemos sejam mais diretamente relevantes", afirma Jef Boeke. Leveduras são microorganismos com apenas uma célula. Como as células humanas e de outros animais, as da levedura são eucariontes, ou seja, possuem um núcleo. Isso as distingue de bactérias e vírus.
Quebra-cabeça biológico
Como todas as coisas vivas do planeta, o genoma da célula de levedura e seus cromossomos são feitos de DNA. Máquinas podem sintetizar o DNA quimicamente, mas somente pequenas partes, com cerca de duas mil unidades de pares de bases. O cromossomo da célula da levedura consiste em mais de 300 mil pares de bases.
"Juntar tudo é um desafio", explica Torsten Waldminghaus, da Universidade de Marburg, que também atua na área de biologia sintética. "É preciso muitas pessoas e muitos anos". Para o estudo, Boeke recebeu a ajuda de jovens acadêmicos: mais de 60 estudantes de graduação foram envolvidos no projeto.
Felizmente, as células de levedura facilitaram a vida dos biólogos. Eles alimentam as células com pedaços combinados de DNA e as células começam a resolver o quebra-cabeças, incorporando esses pedaços ao seu próprio genoma, explica Waldminghaus.
Assim, Boeke e sua equipe substituíram pouco a pouco os cromossomos nativos da levedura por peças sintetizadas, até que o cromossomo foi completamente reconstruído.
Ficar com o melhor e descartar o resto
Mas porque os pesquisadores iriam querer sintetizar um cromossomo? Boeke quer entender melhor as genéticas da levedura e humana. "Isso nos dá uma compreensão mais sistemática sobre o que todos os genes estão fazendo", diz Boeke. "Mostra como eles trabalham juntos para produzir os comportamentos da célula de levedura, para crescer em um determinado ritmo, ou para produzir álcool a partir do açúcar".
Mas é mais que isso. A células de levedura são ferramentas importantes na indústria biotecnológica. Elas são usadas há séculos para produzir pães macios, para fazer cerveja e vinho. Mas esses microorganismos também produzem bioetanol e medicamentos, como a artemisinina, um remédio usado no tratamento da malária.
"Precisamos de organismos que produzam da forma mais barata possível", diz Torsten Waldminghaus. "E isso é muito mais fácil com organismos simples, que carregam apenas o material genético que precisam para sobreviver".
"Chamamos essas células simples de organismos chassi", explica Waldminghaus, comparando o trabalho dos cientistas à fabricação de um carro. O chassi é a estrutura interna do carro – seu quadro e as rodas. "Você pode adicionar coisas e construir o carro do jeito que quiser. Mas se você tiver um Porsche completo, é mais difícil de modificar as coisas".
Jogando a sujeira fora
"Quando você muda o genoma, você esta apostando. Uma mudança errada pode matar a célula", diz Boeke. Mesmo assim, seu time excluiu cerca de um sexto de todas as bases de pares do cromossomo da levedura e as células permaneceram funcionais e similares. Elas continuaram crescendo, transformando açúcar em álcool e se reproduzindo.
Os cientistas removeram os transposões, também conhecidos como genes saltadores. "Essas sequencias de DNA parecem estar lá apenas para fazer mais cópias de si mesmas e são consideradas por muitos de nós como parasitas do genoma", diz Boeke. "Eliminando essas células, acreditamos que teremos uma célula mais estável e confiável".
Células de levedura precisam ter muitas sequências deletadas para que se adaptem a ambientes em mudança na natureza, mas não no laboratório, diz Boeke. "É provável que o DNA ruim tenha um papel na evolução da célula de levedura, mas provavelmente não tem papel em sua sobrevivência diária".
Humanos projetados?
Humanos e leveduras são geneticamente mais próximos do que humanos e bactérias. Mas isso não significa que os pesquisadores poderão criar um cromossomo humano do zero. "O genoma humano é muito maior", diz Waldminghaus. São mais de três bilhões de pares de bases.
Cromossomos humanos são muito mais difíceis de reconstruir porque as células humanas não facilitam as coisas para os cientistas – como fazem as leveduras –, colocando as peças corretas de DNA.
"Talvez fosse necessário ter células de levedura para colocar os cromossomos em conjunto, ou seja, primeiro encaixar nas células de levedura e então talvez fosse possível transferir para a célula humana", sugere Waldminghaus. Mas ele não vê razão pela qual os cientistas tentariam criar um cromossomo humano.
"Claro que queremos aperfeiçoar leveduras e bactérias, assim podemos produzir coisas. Mas queremos realmente otimizar seres humanos? Acho que ninguém gostaria disso", conclui.