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'Caos é parte do trabalho de quem faz cinema', diz Andreas Dresen

8 de agosto de 2012

Andreas Dresen, um dos maiores diretores alemães da atualidade, comenta a retrospectiva de sua obra, em exibição no Brasil, e fala sobre a exploração da realidade em seus filmes, estética que agrada público e critica.

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O trabalho do cineasta alemão Andreas Dresen talvez seja uma das melhores maneiras de conhecer a vida das pessoas na Alemanha unificada. Seu estilo, próximo ao documental, utiliza muitas vezes a improvisação para olhar de perto e a fundo em seus personagens. Nas últimas duas décadas, seus filmes dissecaram de maneira direta, e ao mesmo tempo afetuosa, a vida dos mais variados tipos, não apenas sendo o espelho de uma cultura, mas tentando entender um pouco da natureza humana.

Dresden estudou cinema na antiga Alemanha Oriental e conseguiu se adaptar bem ao livre mercado após a queda do Muro de Berlim. Sua visão realista, às vezes dura e ao mesmo tempo terna do cotidiano das pessoas comuns, consegue agradar público e crítica. Seu último filme de ficção, Parada em pleno curso, venceu a mostra Un Certain Regard, em Cannes, por ser original e inovativo, e também o Deutscher Filmpreis, o maior prêmio do cinema alemão.

Deutscher Filmpreis 2012 Bester Film
Original e inovativo, "Parada em pleno curso" bateu o favorito "Barbara" no último Deutscher FilmpreisFoto: picture-alliance/dpa

Em conversa com a DW Brasil, o cineasta falou sobre seu método de trabalho, a realidade no cinema e seus futuros projetos.

DW Brasil: A reação do público brasileiro aos seus filmes é diferente da do público alemão?

Andreas Dresen: Não posso dizer ao certo, mas acredito que a linguagem cinematográfica seja universal, assim como a relação dos personagens em meus filmes. O cinema é o lugar onde as pessoas se reúnem e compartilham seus sentimentos.

Os brasileiros seriam bons personagens para os seus filmes?

Claro, há muitos temas a serem explorados ao redor do mundo. Para mim, seria mais difícil contar uma história que não se passasse na Alemanha, mas o desafio seria interessante.

Quando você entrou em contato com o cinema e quando decidiu que queria fazer filmes?

Ganhei uma câmera do meu pai nos anos 1970, comecei a fazer filmes amadores e aprendi que poderia contar histórias que mexiam com as pessoas. Na Alemanha Oriental, a arte era a única maneira de abordar certos temas. Filmes eram uma boa maneira para me expressar e fui estudar cinema.

Filmszene Halbe Treppe von Andreas Dresen
"Entre casais" (2002) projetou o diretor internacionalmenteFoto: picture-alliance/dpa

Alguns dos seus principais filmes estão na retrospectiva que acontece em São Paulo. Você costuma rever esses filmes?

Pode ser interessante em algumas situações, mas quase nunca acontece. Conheço muito bem todos eles e cada vez que assisto novamente descubro novos erros.

Você trabalha muito com improvisação. Essa é a melhor maneira de extrair o máximo dos personagens em seus filmes?

Para filmes que tratam de temas do cotidiano, a improvisação pode ser muito útil. Quando eu trabalho com improviso, geralmente consigo com que os atores sejam mais naturais. Com um roteiro, as coisas são mais estudadas, calculadas e perde-se o momento, que gosto de registrar como em um documentário. Para filmes com uma estrutura mais complexa, a improvisação não funciona. Não conseguiria ter feito Uísque com Vodka sem um roteiro tradicional.

Quais dos seus filmes foram feitos dessa maneira?

Entre casais, Nuvem 9 e Parada em pleno curso foram feitos sem roteiro. Eram filmes que para alcançar o resultado que eu queria, os atores também tinham que guiar a história. Claro que eles tinha material sobre a enredo e seus respectivos personagens, mas não haviam diálogos escritos.

Film Whisky und Wodka
"Uísque com Vodka" foi feito com um roteiro tradicionalFoto: 2009 Senator Film Verleih

Para um diretor, não é caótico trabalhar em equipe sem roteiro?

Caos é parte do trabalho de quem faz cinema. Como diretor preciso observar, editar as ideias da equipe e encontrar a melhor maneira de contar minha história.

Como seu trabalho em documentários influencia seus filmes de ficção?

Sou um grande fã dos documentários. Gosto de estar com uma câmera no mundo real e me surpreender. Quando você faz um documentário, você parte de uma ideia, mas quando sai para captar as imagens, coisas inesperadas podem acontecer. A estrutura do filme é criada depois. Acho esse processo semelhante à improvisação.

A realidade é importante em seus filmes?

Sou inspirado pela realidade. Não podemos pensar que vamos ver algo autêntico ou real no cinema, o que vemos é a visão de alguém sobre algo. Realidade é o que vemos quando olhamos pela janela.

A ironia de viver e morrer é o tema principal de "Parada em pleno curso"?

A morte é um tema forte e violento, mas também existencial o que abre espaço para a ironia e o humor. Essa dualidade entre comédia e tragédia aproxima e envolve o espectador.

Herr Wichmann von der CDU
Documentário retoma a história do político Henryk WichmannFoto: Presse

Seu próximo documentário é uma continuação "Herr Wichmann von der CDU" feito em 2003. Por que retomar a história do político Henryk Wichmann?

No primeiro filme acompanhei a campanha de Wichmann para o parlamento alemão. Ele não foi eleito. Hoje ele é um ativo membro do parlamento de Brandemburgo. Queria olhar de perto como a democracia se desenvolve através do dia a dia de um político e desmistificar clichês. O filme estréia na Alemanha em setembro.

Como você vê o cinema alemão hoje?

Há uma grande produção e variedade de gêneros no cinema alemão, o que me deixa muito feliz. Gostaria apenas que o cinema comercial fosse um pouco mais inovador e criativo.

Você é familiar com o cinema feito no Brasil?

Infelizmente, não. Só filmes como Cidade de Deus e Tropa de Elite chegam ao mercado alemão. Acredito que pouco do que é produzido na Alemanha seja lançado aqui no Brasil também.

Quais são seu próximos projetos?

Quero fazer um filme para crianças no ano que vem. Acho estranho que exista uma divisão entre diretores de filmes adultos e infantis. Vai ser um grande desafio, pois eles são expectadores muito exigentes.

A retrospectiva dos filmes de Andreas Dresen acontece de 8 a 10 de agosto no Instituto Goethe, em São Paulo. Na segunda-feira (13/08), o cineasta conversa com o público após a exibição de "Entre casais".

Autor: Marco Sanchez
Revisão: Francis França