Campanha tenta trazer bom humor aos alemães
6 de outubro de 2005As 25 maiores organizações da mídia da Alemanha iniciaram, na última semana, uma campanha orçada em 30 milhões de euros. O lema é no mínimo curioso: "Você é a Alemanha". O objetivo? Tentar levantar os ânimos dos 82 milhões de cidadãos do país.
Programada para estender-se por cinco meses, a iniciativa deve preencher as páginas de jornais e revistas do país com anúncios "em prol do otimismo". Mesmo em meio a um cenário de alto desemprego, fraca conjuntura e estagnação econômica.
Autoconfiança e motivação
"A Alemanha propaga uma imagem de si mesma pior do que a situação realmente é", comenta Bernd Kundrun, do grupo Bertelsmann, o gigante da mídia do país, ao apresentar a campanha em setembro último. "Queremos
impulsionar uma mudança de conscientização, com vistas a uma maior autoconfiança e motivação das pessoas", diz Kundrun.
A grande aliança dos grupos de mídia, que ocupa espaço televisivo e páginas de jornal, atraiu uma boa parcela da sociedade alemã para a campanha. Além de incluir personalidades bem conhecidas da vida pública do país, como o goleiro Oliver Kahn e o crítico literário Marcel Reich-Ranicki.
A iniciativa também busca referências em figuras históricas como Beethoven e Albert Einstein. Tanto na TV quanto nos jornais ou na web, todos os anúncios tentam impulsionar os alemães a tomar as rédeas na retomada do desenvolvimento do país.
Pessimismo e tragédia
Afastar o mau humor e o pessimismo, que vêm dando o tom no país nos últimos anos, pode ser uma árdua tarefa. Com cinco milhões de desempregados numa economia que é a maior da Europa e a terceira do mundo, muitos alemães continuam com medo do futuro, como mostram algumas recentes pesquisas de opinião.
As eleições antecipadas do último 18 de setembro também não ajudaram. O resultado das urnas provocou uma situação em que tanto o chanceler federal, Gerhard Schröder, quanto a líder democrata-cristã, Angela Merkel, reclamam para si o direito de governar o país nos próximos quatro anos.
Crise de identidade tem raízes profundas
Jo Groebel, psicólogo e diretor do Instituto Europeu de Mídia, sediado em Düsseldorf, elogiou a nova campanha, por esta tentar sacudir o país e tirá-lo de seu estado de torpor. Entretanto, salienta Groebel, as raízes da crise de autoconfiança dos alemães são bastante profundas.
"Os alemães têm passado de uma crise de identidade a outra nos últimos 150 anos", observa Groebel. "É verdade que os alemães têm um desejo enorme de estabilidade, mas justamente porque nunca a tiveram. Problemas econômicos, como o desemprego em massa, só vieram a aumentar o medo de que tudo viesse a desmoronar", comenta o especialista.
Reclamar virou passatempo nacional
De uma certa forma, os temores dos alemães são exagerados. O país é o líder mundial em exportações e continua a oferecer a seus cidadãos padrão de vida extremamente confortável.
Entretanto, quando a globalização começou a ameaçar os empregos bem pagos e o governo foi forçado a cortar uma série dos generosos benefícios sociais, reclamar tornou-se o principal passatempo nacional.
Mudança de mentalidade
Embora os organizadores da campanha estejam cientes de que a iniciativa não poderá, sozinha, por fim ao mal-estar dos alemães, espera-se que seja possível pelo menos despertar um desejo de "pôr as mãos na massa" no país.
Um tipo de comportamento que, diga-se de passagem, ajudou a Alemanha a superar o maior obstáculo da sua história: a reconstrução após a Segunda Guerra Mundial.
Humor miserável
Num spot publicitário veiculado pela TV, Ulrich Wickert, um dos apresentadores de notícias mais conhecidos no país, recorre a uma famosa declaração do ex-presidente norte-americano John F. Kennedy: "Não pergunte o que seu país pode fazer por você, mas o que você pode fazer pelo seu país".
Todas as grandes redes de televisão do país transmitiram, simultaneamente, o início da campanha em setembro último, registrando uma audiência de aproximadamente 17 milhões de pessoas. Alguns observadores estão, todavia, céticos quanto ao resultado da campanha.
"É difícil prever se a população vai se mobilizar. É claro que algo tem que mudar. Entretanto, a situação econômica do país está ligada ao humor miserável da população. Quem acha que o mundo vai acabar amanhã não deveria gastar montanhas de dinheiro numa loja de ferramentas hoje", ironiza o diário Sächsische Zeitung.