1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Bélgica relembra 100 anos da Batalha de Passchendaele

Jefferson Chase as
31 de julho de 2017

Cerimônia no cemitério militar britânico de Tyne Cot homenageia vítimas de uma das mais sangrentas batalhas da Primeira Guerra Mundial, cujo sentido estratégico é até hoje questionado por historiadores.

https://p.dw.com/p/2hT0n
Gedenkfeier Erster Weltkrieg Ypernschlacht
Banda militar se apresenta durante a cerimônia realizada em Ipres, na Bélgica Foto: picture-alliance/dpa/Y. Mok

Representantes das antigas nações beligerantes estiveram nesta segunda-feira (31/07) em Ipres, na Bélgica, para participar de uma cerimônia que rememorou a Batalha de Passchendaele, iniciada nesta data há cem anos.

Passchendaele, que opôs o Reino Unido e seus aliados ao Império Alemão, foi uma das maiores carnificinas das sangrentas da Primeira Guerra Mundial e durou de 31 de julho a 31 de dezembro de 1917. Ela também é conhecida como a Terceira Batalha de Ipres, em referência à cidade da Bélgica em cujos arredores se desenrolou.

A cerimônia desta segunda-feira ocorreu no cemitério militar britânico de Tyne Cot, onde está enterrado o maior número de combatentes da Commonwealth em todo o mundo.

A cerimônia foi organizada pelo Reino Unido e pela Bélgica e reuniu o príncipe William e a duquesa de Cambridge, o ministro alemão do Exterior, Sigmar Gabriel, e o rei Filipe da Bélgica e a rainha Matilde. "A diplomacia não deve nunca mais falhar como ela falhou em 1914", disse Gabriel. "Nunca mais deverá acontecer uma guerra no centro da Europa. A Europa unificada é o nosso projeto de paz e o nosso futuro", afirmou.

Apesar de não ser hoje tão conhecida como outras campanhas da Grande Guerra, como Somme ou Verdun, a Batalha de Passchendaele foi similar em magnitude e destruição. Nas suas memórias, o primeiro-ministro britânico David Lloyd George escreveu que Passchendaele sempre estará entre as batalhas "mais gigantescas, tenazes, ferozes, fúteis e sangrentas" já combatidas.

Guerra de exaustão

A Alemanha entrou na Primeira Guerra Mundial nos primeiros dias de agosto de 1914 com a invasão da Bélgica e de Luxemburgo, numa tentativa de contornar a fronteira franco-alemã, fortemente protegida, e cercar Paris a partir do norte. Os Aliados conseguiram conter o avanço dos alemães na Primeira Batalha de Ipres, em novembro de 1914, e os frontes foram delimitados. Iniciava-se a guerra de exaustão.

Em 1915, as forças alemãs fizeram uma segunda tentativa de capturar a maior cidade da região na Segunda Batalha de Ipres. Essa campanha ficou famosa porque foi a primeira em que a Alemanha usou gás tóxico no front ocidental e a primeira em que uma divisão de uma antiga colônia (a Primeira Divisão Canadense) derrotou uma potência europeia na Europa. O equilíbrio de forças se manteve – a cerca de 60 quilômetros de Dunkirk e 250 quilômetros de Paris.

A área ao redor de Ipres era uma proeminência aliada em território dominado pelos alemães, o que tornava a sua defesa custosa. Assim, as forças aliadas decidiram lançar uma ofensiva em julho de 1917, com o objetivo de fazer as forças das Potências Centrais recuarem e, com isso, conseguir ocupar os morros da região, de importância estratégica. Foi esse movimento estratégico que levou à Terceria Batalha de Ipres, ou Batalha de Passchendaele.

Só que os Aliados esqueceram de considerar o tempo nos seus planos.

Lama e mais lama

O céu estava carregado quando as forças britânicas iniciaram sua ofensiva, na madrugada de 31 de julho de 1917, e isso foi um presságio. Enquanto algumas formações conseguiram avançar cerca de quatro quilômetros, outras tiveram que recuar e perderam até 70% do seu contingente.

Em agosto de 1917, aquela área da Bélgica viu quatro vezes mais chuva do que no mesmo período de 1914, o que impossibilitou as tropas de ambos os lados obter avanços decisivos. Fotos dos campos de batalha mostram um lamaçal sem fim, entrecortado por algumas árvores secas de copas cortadas. Lloyd George chamou Passchendaele de "a campanha da lama".

Belgien Schlacht von Passendale
Soldados canadenses na Batalha de Passchendaele, na Bélgica, em 1917Foto: Imago/United Archives International

Ao longo de cinco meses, ciclos de ataques e contra-ataques se repetiram. Ganhos territoriais eram medidos em metros e não em quilômetros. O vilarejo de Passchendaele esteve no centro da carnificina. Imagens aéreas mostram que ele foi completamente destruído durante a batalha.

Ao fim da campanha, os ganhos territoriais foram mínimos, e a perda de vidas, imensa. As estimativas divergem muito. As mais conservadoras dizem que 217 mil soldados alemães e 250 mil membros das forças aliadas morreram. Mas é provável que o número de mortes seja muito maior.

Influência sobre os rumos da Grande Guerra

Assim como não há um número definitivo de mortes, não há consenso se a Batalha de Passchendaele trouxe algum resultado para as partes beligerantes.

Defensores da ofensiva liderada pelos britânicos e em especial do comandante britânico Douglas Haig argumentam que a batalha forçou os alemães e enviar, para o front em Flandres, tropas que poderiam ter sido enviadas para outras frentes de batalha. E, apesar de as perdas entre os Aliados terem sido maiores, os alemães estavam em bem menos condições de perder soldados. Assim, a Batalha de Passchendaele pode ter ajudado a convencer os comandantes alemães de que a guerra não poderia ser vencida sem uma ofensiva final – que acabou se revelando desastrosa.

Por outro lado, pode-se argumentar que os rumos da guerra foram determinados em outros lugares em 1917, com a decisão da Alemanha de se engajar numa guerra submarina sem limites, o afundamento do RMS Lusitania e a entrada dos Estados Unidos no conflito. E o número de mortos dessa batalha assusta até os dias de hoje.

Ao analisar a importância das Batalhas de Passchendaele, do Somme e de Verdun, Lloyd George observou que nenhum delas alcançou os objetivos que as motivaram. "Em cada um dos casos, tornou-se claro já no início da luta, para qualquer um que observasse o seu desenrolar – exceto para aqueles que eram responsáveis pelo planejamento estratégico que concebeu a tragédia macabra – que o objetivo não seria alcançado. No todo, elas foram responsáveis pelo massacre ou mutilação de algo entre 2 milhões e 3 milhões de homens valentes."

O poeta e ex-soldado inglês Siegfried Sassoon fez uma avaliação mais concisa. Num poema escrito do ponto de vista de um soldado caído, Sassoon dizem apenas: "Eu morri no inferno (eles o chamavam Passchendaele)".