Bibliothek: Destaques do mundo das artes na Alemanha em 2017
26 de dezembro de 2017Última coluna do ano. Hora de revisões. Este ano foi um tempo de altos e baixos extremos ao redor do mundo. Progressos e retrocessos. A Alemanha não permaneceria ilesa. Ao mesmo tempo que houve a legalização do casamento igualitário, permitindo a casais homossexuais os mesmos direitos de seus concidadãos heterossexuais, as eleições de outubro levaram ao Parlamento dezenas de políticos extremamente conservadores.
No campo das artes, Berlim se viu às voltas com a grande polêmica sobre a nova direção do Volksbühne, que passou do alemão Frank Castorf, após 25 anos (1992-2017), às mãos do belga Chris Dercon, levando à ocupação do teatro por funcionários, pedidos de demissão em massa, e um longo debate sobre a relação entre uma comunidade, o Estado e as artes. Não se chegou a uma conclusão, mas os primeiros espetáculos sob nova direção já foram à cena entre críticas positivas e muitas negativas.
Neste fim de ano, alguns autores germânicos de qualidade dominam as listas de mais vendidos. No momento, a loja de artigos culturais Dussmann, de Berlim, elenca entre os autores mais procurados o alemão Daniel Kehlman, com Tyll (Rowohlt, 2017); o austríaco Robert Menasse, com Die Hauptstadt (Suhrkamp, 2017); e a alemã Julie Zeh (n. 1970), com Unterleuten (Luchterhand, 2016).
No Brasil, Daniel Kehlman teve um romance lançado recentemente: F (São Paulo: Companhia das Letras, 2017), em tradução de Sonali Bertuol. A mesma editora já havia lançado os romances Fama (2011) e A Medida do Mundo (2007).
Pessoalmente, o livro lançado este ano aqui na Alemanha que mais me interessou e entusiasmou foi um pequeno volume de Jo Frank, intitulado Snacks (Edition Atelier, 2017). Híbrido e experimental, o livro é uma meditação sobre a língua, suas verdades, seus mal-entendidos, mesclando principalmente o alemão e o inglês, e trazendo à prosa o caráter por vezes desorientador tanto do poema quanto da nota de rodapé.
Na música, este foi o ano em que o duo Lea Porcelain, do vocalista Markus Nikolaus e do produtor Julien Bracht, lançou seu álbum de estreia, Hymns To The Night (Kobalt Label). Com o título apropriadamente tirado do poeta romântico Novalis, as canções com letra de Markus Nikolaus ecoam desde o industrial no-wave da Alemanha dos anos 80 até as experimentações com guitarra de bandas como The Jesus and Mary Chain ou My Bloody Valentine. Para mim, Lea Porcelain é a melhor banda em atividade na Alemanha no momento, e eu recomendo sua música.
Este ano voltei a frequentar exposições e museus com mais assiduidade. Dois lugares em Berlim nunca falham em me dar prazer aos olhos: a Berlinische Galerie e a C/O Berlin. Cito as duas porque foi na primeira que descobri o trabalho de Jeanne Mammen (1890-1976), gravurista e pintora alemã famosa durante a República de Weimar e que havia caído em esquecimento. Estas recuperações da Berlinische Galerie são muito boas.
Na segunda, descobri o trabalho do fotógrafo Willi Ruge (1892-1961), pioneiro da arte na Alemanha, com fotografias belíssimas. Na arte contemporânea, cito as exposições individuais dos jovens Tom Król (n. 1991) no Studio Picknick em Berlim, e Malte Zenses (n. 1987) na Kunstverein Nürnberg. Dois nomes a acompanhar.
Por fim, na arte daquelas imagens que se movem, 2017 viu o lançamento do novo filme do mestre austríaco Michael Haneke, Happy End. Também a Netflix alemã emplacar uma série de televisão, Dark, com dez episódios. Escrita por Jantje Friese e Martin Behnke e dirigida por Baran bo Odar, Dark tem músicos como Apparat, Soap & Skin e Ben Frost na trilha sonora. É boa.
Que venham as surpresas de 2018.
Na coluna Bibliothek, publicada às terças-feiras, o escritor Ricardo Domeneck discute a produção literária em língua alemã, fala sobre livros recentes e antigos, faz recomendações de leitura e, de vez em quando, algumas incursões à relação literária entre o alemão e o português. A coluna Bibliothek sucede o Blog Contra a Capa.
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