Arte de olho na cultura hacker
4 de fevereiro de 2003Na Bienal de Veneza de 2001, o grupo de artistas [epidemiC] declarou o vírus de computador como obra de arte. Em 37 linhas, o código–fonte do vírus programado pelos web artistas "narra" o desempenho de um vírus, que vai a uma festa com a meta de se proliferar.
def fornicate (guest):
try:
soul=open (guest, "r")
body=soul.read()
soul.close()
if find (body,"[epidemiC]")==_1
soul=open (guest,"w")
soul.write(mybody+"nn"+body)
(...)
Sem a intenção de contaminar computadores de inocentes, o [epidemiC] preferiu proliferá-lo entre o público da Biennale, distribuindo camisetas com o código-fonte. Para marcar sua admiração pela cultura hacker, os artistas declamaram – com as normas de recitação da poesia fonética – o código-fonte o vírus "I love you", que acabara de provocar em todo o mundo prejuízos de 8,75 bilhões de dólares.
Vírus como arma e obra de arte
Este trabalho do [epidemiC] é parte da exposição I love you, iniciada pelo Museu de Artes Aplicadas de Frankfurt e agora em cena na Transmediale, em Berlim. A mostra revela posições controversas de web artistas, programadores, especialistas em segurança de TI e code poets em relação a um fenômeno que afeta diretamente o nosso cotidiano: o vírus de computador.
Independente do julgamento ético, os hackers não deixam de exercer uma certa fascinação dentro da comunidade de internautas e também entre artistas que identificam a programação de vírus com um ato criador e subversivo. A história do fenômeno existente há 30 anos também mostra que a meta dos cientistas pioneiros era desenvolver a inteligência artificial e formas rápidas de aperfeiçoar programas de computadores. A atual motivação de hackers e crackers, black hats e white hats, script kiddies ou como quer que se chamem os programadores de vírus, vai da mera curiosidade de intervir num mundo digital cada vez mais hermético até a pura sabotagem industrial, passando pela crítica à monocultura e hegemonia da Microsoft.
Manipulando o código-fonte
Os code poets, por exemplo, redescobriram a linguagem de programação como material da poesia. Resgatando técnicas de espacialização da poesia visual e concreta, eles lançam mão do código que rege a cultura digital, manipulando-o como material de uma escrita cifrada, que não deixa de conter metáforas próprias. Print STDOUT q / Just another Perl hacker, / Unless $spring: soa um haiku de Larry Wall, de 1991. A linguagem de programação PERL inspirou toda uma geração de code poets, como o alemão Florian Crämer.
A possibilidade de manipular o código-fonte de programas que moldam diariamente a nossa percepção, sem a nossa autorização explícita, com certeza tem algo de subversivo e prometeico. Eventos como o concurso "The international obfuscated C Code Contest", festas de hackers em estádios de esporte ou círculos restritos de internautas se curvam à fascinação do código-fonte, uma linguagem que já se tornou hype nas artes digitais.