A morte do "apóstolo dos alemães"
6 de junho de 2004A Igreja Católica da Alemanha comemora neste fim de semana os 1250 anos da morte de São Bonifácio. Cerca de 20 mil fiéis de todo o país participam da festa em Fulda (Estado de Hessen), cuja catedral abriga os restos mortais do santo. Ele foi um homem "comprometido com a verdade", como diz o slogan dos festejos que marcam o ponto alto do "ano bonifaciano" na Alemanha.
Bonifácio morreu assassinado por ladrões, aos 80 anos de idade, no dia 5 de junho de 754, junto com mais 50 acompanhantes numa viagem missionária à Frísia (noroeste da Alemanha). Foi enterrado em Fulda, onde fundara em 744 um mosteiro beneditino, que foi o embrião da cidade, hoje com cerca de 60 mil habitantes.
A festa de São Bonifácio começou com uma procissão com relíquias do santo e seus companheiros Sturmius e Lioba. Neste sábado (05/06), 40 bispos católicos da Alemanha e do exterior celebram uma missa solene na praça da Catedral de Fulda.
Segundo o presidente da Conferência dos Bispos da Alemanha, cardeal Karl Lehmann, São Bonifácio foi "um missionário, reformador da Igreja, mártir e um homem que lançou os fundamentos cristãos da Europa. Ele é e sempre será o apóstolo dos alemães".
O protestantismo alemão distanciou-se de São Bonifácio, acusando-o de demasiada fidelidade ao Vaticano. "Sua dependência de Roma tornou-o menos respeitado entre nós do que, por exemplo, os santos Martinho de Tours ou Elisabete da Turíngia", disse o bispo evangélico Martin Hein, responsável pela Igreja Luterana na região de Fulda.
O machado de Deus
São Bonifácio é o padroeiro nacional dos católicos alemães. Nascido entre 672 e 675 no então reino anglo-saxão de Wessex (sudoeste da Inglaterra) e batizado com o nome Winfried (amigo da paz), recebeu em 719 do papa Gregório II o codinome Bonifatius (benfeitor) e a missão de evangelizar os alemães. Poucos anos depois, foi ordenado bispo missionário. Gregório III promoveu-o a arcebispo e representante do papa junto aos germanos.
Bonifácio atravessou os Alpes para chegar à Germânia, onde atuou na Turíngia, em Hessen, na Baviera e na Frísia. Criou os bispados de Eichstätt e Würzburg, reorganizou os de Passau, Regensburg e Salzburgo (Áustria), foi bispo de Mainz, fundou vários mosteiros e realizou, entre 743 e 747, os chamados Concílios Germânicos, encontros episcopais para reformar a Igreja.
Ele converteu ateus e enfrentou adversários dentro da própria Igreja, que não eram lá muito cristãos. Em carta de 742 ao papa Zacarias reclamou: "A maioria das cúrias tornaram-se propriedade de leigos ou clérigos gananciosos e adúlteros, entregues à perdição do dinheiro". Diante dos recentes escândalos de pedofilia envolvendo padres e bispos católicos em vários países, críticos da Igreja vêem uma certa atualidade nessa reclamação.
Conta-se que, em Geismar (Hessen), Bonifácio teria derrubado um carvalho dedicado ao deus do trovão, para demonstrar a impotência de uma das principais divindades germânicas. A partir daí passou a ser chamado também de "machado de Deus".
No século 19, quando o catolicismo alemão buscava um novo perfil, São Bonifácio virou santo nacional. "Estou convicto de que ele é um impressionante exemplo de consciência missionária, que hoje nos falta, embora seja mais do que necessária em nosso país", disse o cardeal Lehmann.
O presidente da CNB alemã destacou a dimensão européia da obra do santo. "É impressionante a cooperação que houve entre diversos reinos e igrejas da época. Bonifácio veio da Inglaterra, esteve várias vezes em Roma, fundou e renovou bispados na Baviera. Muitas das atuais estruturas da Igreja remontam à sua atuação histórica", disse.