A insustentável hesitação de Lucien Favre
2 de outubro de 2019Em abril de 2014, o Borussia Mönchengladbach realizava a sua convenção anual com os associados do clube. Quando Lucien Favre subiu ao palco, foi recebido com aplausos estrondosos. Visivelmente constrangido, o treinador respondeu com modestos acenos.
A equipe sob seu comando caminhava célere rumo à obtenção de uma vaga para a Liga Europa. Seria sua segunda participação nesse torneio em três anos. Desde 2011, quando o professor suíço salvou o clube do rebaixamento, era patente o desenvolvimento do time. Reinava a opinião praticamente unânime de que o papel do técnico foi fundamental nesse processo de crescimento.
Já naqueles tempos, Favre era considerado um técnico do mais alto nível, mas também hesitante em momentos cruciais de uma partida, ou quando da contratação de reforços para uma nova temporada. À boca pequena comentava-se também que, vez ou outra, o suíço era tomado por crises agudas de pessimismo. Nessas horas cogitava até renunciar ao cargo que ocupava no momento.
Foi exatamente o que aconteceu apenas um ano e meio mais tarde, no início da temporada 2015/2016. Após cinco derrotas consecutivas na Bundesliga, o até então festejado treinador simplesmente jogou a toalha. O Borussia Mönchengladbach estava em último lugar na tabela, e Favre achou por bem entregar o cargo. O pessimismo inerente à sua personalidade desde seus tempos de infância na pequena aldeia camponesa de Saint-Barthélemy, na Suíça, foi a mola propulsora de sua saída do clube.
Com o time segurando a lanterna, talvez ele já estivesse imaginando uma nova luta contra o rebaixamento tal qual em 2011. Era demais para sua cabeça. Preferiu ir embora. A ironia nessa história está no fato de que os "potros" acabaram se classificando para os playoffs da Champions League naquela temporada ao terminar a Bundesliga em quarto lugar.
Lucien Favre é um obcecado pelo jogo de futebol. Ele esmiúça e prepara seu time nos mínimos detalhes, peça por peça, setor por setor. Montar esquemas táticos é com ele mesmo. É a partir daí que desenvolve um plano que, uma vez posto em prática, deverá levar a equipe à vitória. O problema surge quando o plano pré-estabelecido não dá certo.
Inteligente como é, Favre percebe quando a teoria desanda na prática, e é justamente nessa hora que a hesitação do técnico vem à tona. Dificilmente ele faz alguma mudança na estratégia previamente traçada e demora uma eternidade até se decidir por uma substituição em campo.
Thorgan Hazard é apenas um exemplo desses momentos hesitantes do treinador. O meio-campista belga, pelo menos até agora, não mostrou a que veio. Está muito longe de ser um reforço que agrega valor ao ataque aurinegro. Mesmo assim, o professor suíço insiste em sua permanência no time titular. Foi assim contra Barcelona, Eintracht Frankfurt e Werder Bremen. Nessas três partidas, Julian Brandt só entrou para substituir Hazard faltando pouco mais de quinze minutos para o fim do jogo.
Outro que ainda não achou sua grande forma da temporada passada atende pelo nome de Jadon Sancho. Desde a terceira rodada, o jovem inglês não está rendendo à altura do seu indiscutível talento. A nota média que o portal Kicker conferiu ao atacante nas últimas quatro partidas da Bundesliga foi apenas 4,5 – muito aquém do seu potencial.
Mesmo assim, Hazard e Sancho parecem ser titulares intocáveis no esquema do técnico suíço.
Outro claro sinal da hesitação de Favre ocorre quando sua equipe sofre um gol. Em vez de se levantar do banco e motivar seus comandados, via de regra ele puxa seu bloco de notas para fazer anotações com sua caneta esferográfica. Reação típica de um obcecado por aspectos táticos. Motivação não é mesmo o forte do treinador. Para ter certeza disso, basta presenciar suas coletivas de imprensa ou ouvir sua fala no vestiário. É um deserto de emoções. E isso num clube cuja torcida vive de fortes emoções.
Desde fins de maio, a diretoria do Borussia Dortmund não deixou nenhuma dúvida sobre qual passou a ser o objetivo do clube para a temporada 2019/2020. "Queremos o título da Bundesliga", palavras de ordem proferidas à exaustão pelos dirigentes Watzke e Zorc antes mesmo de a nova campanha começar.
Curiosamente, a fala do técnico aurinegro que mais se aproximou do discurso otimista dos cartolas foi a de que "nós queremos sempre o máximo". Os mais atentos certamente devem ter percebido a sutil diferença retórica entre as duas afirmações, além de deixar à mostra, mais uma vez, o lado hesitante de Lucien Favre.
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Gerd Wenzel começou no jornalismo esportivo em 1991 na TV Cultura de São Paulo, quando pela primeira vez foi exibida a Bundesliga no Brasil. Desde 2002, atua nos canais ESPN como especialista em futebol alemão. Semanalmente, às quintas, produz o Podcast "Bundesliga no Ar". A coluna Halbzeit sai às terças. Siga-o no Twitter, Facebook e no site Bundesliga.com.br
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