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Entrevista

12 de dezembro de 2009

A alemã Herta Müller, Nobel de Literatura deste ano, não quer que essa premiação influencie sua forma de ser e escrever. Em entrevista, ela fala sobre a contribuição individual do escritor.

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Para escritora, a literatura aborda os efeitos da história que ainda afetam as pessoasFoto: ullstein bild - Roth

Agora a senhora recebeu em mãos o Prêmio Nobel de Literatura de 2009. Como foram os dias passados em Estocolmo?

Na verdade, foi uma experiência bonita, mas também subjugante; e ser subjugado não é nada fácil. Sempre costumam dizer que é um pouco demais: a atenção que a pessoa é obrigada a receber, os diversos compromissos e as inúmeras pessoas que surgem de repente... Bem, devo dizer que não tenho tanta substância interior assim para retribuir tudo isso. E é claro que isso também acaba mexendo com a gente.

Como todos os escritores que receberam o Nobel de Literatura, a senhora passa a ser abordada como uma autoridade moral. Isso a incomoda?

Bom, em primeiro lugar, não sou nenhuma autoridade, nem pretendo me tornar. Também não sou nenhuma instituição. Sou uma pessoa bastante simples e foi nessa qualidade que também escrevi livros. Não é possível que eu, na qualidade de ter escrito livros e com tudo o que vivenciei, de repente seja obrigada a me tornar uma outra coisa, só porque recebi um prêmio. Não posso corresponder a isso, nem quero. Ou seja, eu gostaria de continuar sendo como sou, e é isso que vai acontecer.

A literatura era o antídoto que a ajudou. O que a senhora diria a pessoas que também são obrigadas a viver numa ditadura, que são vítimas, mas que não possuem essa linguagem, que no fundo é um talento, um dom?

Acho que a literatura não é nada de especial. Também não é nenhum antídoto especial. Se funcionou como antídoto, então só em relação a mim mesma. Ou seja, a literatura acabou me sustentando interiormente, mas não pôde mudar nada lá fora. Eu tinha uma certa postura durante a ditadura. O quanto fosse possível, eu queria ser íntegra e não me envolver em coisas que desprezo. Eu sabia o que esse regime faz com as pessoas, e não só comigo. Não é só a gente que está em jogo, é tudo o que se vê à volta. Vi tanta infelicidade, vi tantas pessoas agonizando. Vi como o regime despreza as pessoas. E aqueles zeros-à-esquerda, aquelas pessoas polidas e arrogantes, aqueles funcionários, que figuras miseráveis aquelas...

Tudo o que uma ditadura faz com as pessoas... Temo que esse assunto nunca vá chegar ao fim.

Provavelmente não, pois o assunto não acaba quando a ditadura chega ao fim; afinal, as pessoas continuam a viver e os danos continuam a existir. E as sequelas são passadas para os familiares, que acabam sofrendo os principais danos, talvez até a segunda ou terceira geração. Os temas são histórias de família, então. A História é constituída de histórias pessoais; e enquanto as pessoas arrastarem isso consigo, isso continuará sendo um tema, inclusive na literatura.

O prêmio agora lhe trouxe tanta atenção, tantos leitores... A senhora acredita que isso vai mudar sua forma de escrever ou sua postura em relação à profissão do escritor?

Não. Ao escrever, não tenho em mente quem vai ler os livros. Nem tenho a mim própria em mente. Ou seja, tenho que me deixar para fora, pois o que está em jogo é a coisa em si, o próprio trabalho. Talvez seja isso o que sustenta, o fato de a pessoa não ter mais que perceber a si, pois o que a absorve é o próprio trabalho.

Autor: Wolfgang Herles (ZDF)
Revisão: Marcio Damasceno