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Magia do sucesso

Gabriela Schaaf (av)7 de julho de 2008

Há dez anos foi lançado na Alemanha o primeiro livro da série "Harry Potter". A autora J.K. Rowling ajuda a desvendar o segredo de um estrondoso êxito de mercado.

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Criar um best-seller não é truque de mágicaFoto: AP

Mais de 400 milhões de leitores em todo o mundo já cederam à fascinação de Harry Potter. As aventuras do aprendiz de feiticeiro imaginadas pela inglesa Joanne K. Rowling foram traduzidas em 67 línguas, inclusive quirguiz, groenlandês e latim.

Quando, há dez anos, foi lançado na Alemanha o primeiro volume, Harry Potter e a Pedra Filosofal, a crítica literária séria simplesmente o ignorou, considerando-o mera obra para crianças.

Porém a situação logo mudou: todos os livros subseqüentes da série de sete foram devidamente examinados nos cadernos de cultura. Agora está claro: trata-se de um best-seller sem precedentes. Quais são os ingredientes da receita Rowling de sucesso literário?

Necessidade humana básica

O fenômeno Harry Potter não conhece fronteiras nacionais ou etárias. Sua própria criadora espantou-se com o êxito de suas histórias sobre o órfão dotado de poderes mágicos. Porém ela sabia que ia ao encontro de uma necessidade humana básica: a de crer em magia.

BdT Frankreich Harry Potter Briefmarke
Correio francês lançou selos Harry Potter em 2007Foto: AP

"A maioria de nós tem, acredito, esse desejo secreto de influenciar algo para o melhor, de mudar as coisas. Só através da magia – se apenas soubéssemos a fórmula certa – seria possível transformar o mundo."

Na opinião de Rowling, aqui se encontra uma das chaves do enorme interesse infantil. "É isso que torna a magia tão atraente para as crianças, pois são elas que menos têm poder. Os adultos decidem tudo. E mesmo quando as crianças são felizes, e os adultos são legais, elas nunca ganham o controle."

Toda semelhança é mera coincidência?

Contudo, os romances de Joanne K. Rowling não são de construção tão simples quanto normalmente dita o gênero da literatura fantástica. Sua sociedade paralela não é nenhum idílio, há lutas pelo poder e rivalidades, inveja e uma boa dose de vaidade – como na vida real.

A crítica literária Frauke Meyer-Gosau é uma fã de primeira hora de Potter. A seu ver, é este realismo, combinado ao humor, que explica, em parte, o fenômeno de sucesso. Um exemplo é o ministro Cornélio Fudge. Sua pretensão é exagerada, ao ponto de ser ridícula até mesmo para o público infantil.

Porém Fudge possui poder de decisão. "E aí a pessoa se pergunta: o que faz uma personagem tão fraca e exibida num cargo tão importante, quando a situação fica realmente séria", comenta a crítica berlinense.

Figuras tridimensionais

E a situação fica mais séria a cada livro. O que no início parecia uma inofensiva história de internato, vai se agravando até tornar-se uma luta de vida ou morte. E aí entramos no grande tema humano da batalha do bem contra o mal, entre Harry e seus amigos contra Lord Voldemort, um racista e ditador.

Porém nenhuma figura de Rowling é unidimensional. Ela as dota com características individuais, uma história de vida. Mesmo o sinistro lorde. "Não queria que o meu vilão fosse assim tão simples, sem profundidade. Ele devia ser tridimensional, eu queria que as pessoas entendessem como ele chegou a ser o que é", explica.

Para a autora, é essencial mostrar como funciona o poder de sedução de Lord Voldemort, como ele atrai tanta gente."E antes de haver estudado esse aspecto em detalhe, não é possível mostrar o grau de bondade que é resistir ao mal." O próprio Harry conhece a atração do poder, porém não cede a ela.

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J.K. Rowling e fãs no lançamento de 'As relíquias da morte'Foto: AP

Humanidade sob ameaça

Meyer-Gosau resume assim a mensagem de Rowling: a qualidade de ser humano está sempre em perigo, e não é fácil atingi-la. Cada indivíduo toma repetidamente decisões. "De que lado me coloco? Aceito as desvantagens para que o princípio do bem se imponha? O que estou pronto a agüentar, o que consigo agüentar?"

Segundo a crítica, a série trata de questionamentos muito diferenciados, sobre bases bem claras. "Racismo é absolutamente tabu, ele é o princípio do mal. Intolerância é totalmente inadmissível. Quer dizer, o leitor é confrontado com um cânone de valores e aprende, ao mesmo tempo, que nada disso é de graça."

Uma história multidimensional, fantasia transbordante, relevância social e um direcionamento basicamente humanista. Aqui já estão vários ingredientes de sucesso para uma série literária, que, entretanto, não explicam inteiramente o mágico "efeito Harry Potter".

No fim, o que deixa J.K. Rowling mais contente é ouvir de tantas crianças: "Este é o primeiro livro que eu li sozinho". Trata-se geralmente de meninos, de oito, nove anos de idade, que jamais leram uma obra até o fim. "Bem, se tenho orgulho de alguma coisa, então é disso", revela a escritora.