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A Europa sem Obama

17 de novembro de 2016

A relação entre a UE e o presidente americano foi marcada por altos e baixos, mas ele nunca deixou dúvidas sobre sua lealdade. Com sua saída, os europeus terão de resolver sozinhos seus problemas externos.

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Obama na Coluna da Vitória, ainda como candidato em 2008
Obama na Coluna da Vitória, ainda como candidato em 2008: discurso históricoFoto: picture-alliance/dpa/R. Jensen

Tudo começou em meados de 2008, quando uma grande festa na Coluna da Vitória em Berlim. Alemães e europeus aplaudiam o homem que conquistou os corações com o slogan Yes, we can. Não se sabia exatamente o que o então candidato à presidência Barack Obama poderia render, mas ele espalhava um otimismo generalizado e representava, principalmente, um contraste em relação a George W. Bush, cuja política intervencionista no Iraque dividiu a Europa. Naquela ocasião, esperava-se alguém que fosse um fator de união.

Em Praga, no início de 2009, Obama prometeu, pouco depois de assumir o poder, se esforçar por um mundo sem armas nucleares. Com raras exceções, os europeus ficaram entusiasmados. Em outro discurso no Cairo, ele prometeu construir um novo relacionamento com o mundo árabe. No mesmo ano, o homem que impulsionou a retirada das tropas americanas do Afeganistão recebeu o Nobel da Paz.

Recentemente num programa de talk show, numa das muitas entrevistas de despedida, Obama brincou: "Eu realmente não sei por que eu recebi o prêmio." Foram louros antecipados, uma decisão que aos olhos de muitos europeus se mostrou prematura.

A Europa se recuperou muito mais lentamente da crise financeira global do que os Estados Unidos. A crise do euro e do endividamento abalou profundamente a União Europeia, seguida do conflito na Ucrânia e da crise migratória dos anos passados. Na opinião de Obama, a UE se tornou cada vez mais incapaz e relutante de agir.

Numa entrevista à revista The Atlantic, em abril de 2016, o presidente americano criticou de forma suave os parceiras na Europa, que, segundo ele, gostavam de usufruir a liderança e o desempenho americanos, mas não estavam dispostos a mostrar solidariedade ou aumentar seus gastos militares.

No mesmo mês, Obama exortava os europeus na Feira de Hannover a não deixar a coragem minguar e a lutar contra as próprias crises. "A Europa é um dos maiores avanços políticos dos tempos modernos", afirmou. Podia-se perceber mais uma vez o Obama de 2008, que empregava o seu Yes, we can contra o "medo europeu".

Prioridade para Ásia

Nesse meio-tempo, no entanto, os europeus também tiveram sérias dúvidas sobre a seriedade de Obama quanto à cooperação com a Europa. Ele queria tornar a Ásia o pivô de sua política externa, o que funcionou apenas parcialmente. Na intervenção na Líbia, confiou demais que França e Reino Unido assumiriam a responsabilidade, algo que ele próprio atualmente admite. Obama também demonstrou a sua decepção com os aliados do Oriente Médio, como os sauditas.

Em oito anos de mandato, Obama visitou sede da UE somente uma vez, em 2014
Obama em Bruxelas: em oito anos de mandato, ele visitou a sede da UE somente uma vez, em 2014Foto: picture-alliance/dpa/J. Warnand

Elmar Brok, político experiente na área de relações exteriores no Parlamento Europeu, fez um balanço sóbrio depois de quatro anos de política externa contida por parte de Obama: "No nível de trabalho, há uma boa relação. Mas, até agora, a UE e os EUA não puderam definir nenhum ponto forte estratégico que fizesse com que europeus e americanos cooperassem mais estreitamente", declarou Brok à DW em 2012.

Ao menos do ponto de vista dos alemães, o ponto baixo das relações foi o escândalo de espionagem envolvendo a Agência de Segurança Nacional (NSA) dos EUA. Não somente todos os europeus foram espionados em grande escala, como nem mesmo o celular particular de Angela Merkel foi poupado pelos americanos. Algo embaraçoso, levando em conta que, dizia-se na Casa branca, Obama estimava a chanceler federal alemã como a única líder europeia de verdade.

Fator russo

Provocada pela Rússia, foi a crise na Ucrânia que primeiro conseguiu reunir mais fortemente a comunidade transatlântica. Obama e a UE não agiram em sintonia em relação a Moscou, mas no final se mostraram relativamente coesos. O presidente americano não fez nenhum segredo de sua frustração sobre os morosos processos de decisão dos europeus, como também sobre as constantes disputas entre os países-membros do bloco. Esse ponto de vista culminou na declaração da vice-secretária de Estado, Victoria Nuland, no auge da crise da Ucrânia: "Fuck the EU". Esqueça os europeus, eles não vão concordar nunca uns com os outros.

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Merkel brinca com Obama em Hannover, em abril de 2016: para ele, ela era a única líder europeiaFoto: Reuters/K. Pfaffenbach

Obama nunca deixou dúvidas sobre a sua lealdade à aliança transatlântica. Em várias cúpulas da Otan, ele assegurou o seu apoio aos países-membros do Leste no caso de uma agressão russa. Novos contingentes, mesmo que pequenos, foram estacionados nos Países Bálticos, Polônia, Romênia e Bulgária. Sob o governo do primeiro presidente negro dos EUA, o país aumentou seus gastos militares para a Europa. E, finalmente, após dez anos de difíceis negociações, a UE e os EUA conseguiram convencer o Irã a desistir de seu programa de armas nucleares.

No entanto, a tentativa de negociar um acordo de livre-comércio, o chamado TTIP, fracassou. Para o presidente da comissão de comércio no Parlamento Europeu, Werner Lange, os EUA fizeram, simplesmente, poucos esforços. Mas também com a Ásia um acordo comercial não conseguiu ser validado. Até hoje, o Senado americano não o ratificou.

O líder da bancada liberal no Parlamento Europeu, Guy Verhofstadt, diz que os cidadãos do Velho Continente ainda vão sentir muita falta de Obama. Segundo ele, com a eleição de Trump, os EUA passarão a se preocupar somente consigo, e o TTIP:

"Quando os EUA intervieram internacionalmente, como no Iraque, a Europa respondeu com palestras moralistas sobre a expansão imperial. Quando os EUA não intervieram ou o fizeram muito tarde ou não suficientemente, como na Líbia e na Síria, os europeus exigiram mais liderança dos EUA."

Segundo Verhofstadt, essa dinâmica agradável das relações transatlânticas chegou agora ao fim. Com Trump, não somente a era Obama acabou, diz o eurodeputado: agora os europeus terão de resolver sozinhos os seus problemas e não podem mais contar com os EUA.

Bernd Riegert
Bernd Riegert Correspondente em Bruxelas, com foco em questões sociais, história e política na União Europeia.