A duradora amizade entre berlinenses e americanos
1 de julho de 2013A pergunta casual de um velho senhor com quem conversava no metrô de Berlim deixou o americano Juan Diaz atordoado. "Qual é a sua nacionalidade?" Juan se lembra de ter ficado irritado com a questão – uma ousadia, ainda mais que ele havia se esforçado ao máximo para falar bem alemão.
Mas após responder que era dos Estados Unidos, Juan se surpreendeu: o velho senhor o abraçou e contou que os americanos haviam salvado sua vida ainda quando criança, com a chamada ponte aérea de Berlim.
No verão de 1948, as tropas soviéticas haviam isolado a capital alemã do resto do mundo. Por quase um ano a cidade foi abastecida apenas por aeronaves – a maioria americanas, mas também algumas britânicas – que lançavam do ar mantimentos aos moradores.
A memória daquele abraço no metrô, ocorrido há sete anos, emociona Juan até hoje. Ele afasta as lágrimas antes de contar que, depois daquele dia, nunca mais escondeu sua nacionalidade.
Relação especial
O especialista Mark Hallerberg diz entender a postura de Juan. Nos tempos de George W. Bush, argumenta, nem sempre era fácil ser americano. O professor de política econômica na Hertie School of Governance, de Berlim, conhece muitos compatriotas que preferiam se declarar canadenses para não ter que lidar com as críticas à política externa de seu país. Os Estados Unidos haviam iniciado a Guerra do Iraque contra a vontade de muitos de seus aliados, incluindo a Alemanha.
Ser americano significava ser alvo de reclamações. "O respeito que os Estados Unidos tradicionalmente tinham na Alemanha havia sido severamente abalado", lembra Hallerberg. "Mas, em Berlim, ainda era um pouco mais tranquilo, por causa dessa história especial."
Na Berlim dividida do pós-Guerra, tropas americanas garantiram a segurança da cidade, principalmente no período em que a Guerra Fria se aprofundava, dividindo o mundo em dois blocos. O Muro de Berlim, erguido em 1961, era o símbolo maior daquela época.
"As pessoas tinham medo", lembra a diretora do Museu Kennedy, Alina Heinze. O pequeno museu documenta a vida do presidente americano até a sua morte, em 1963. Ela aponta para uma fotografia em preto e branco, onde se vê milhares de pessoas reunidas para ver o presidente John F. Kennedy na praça em frente à prefeitura de Berlim Ocidental. Na ocasião, ele proferiu seu famoso discurso, no qual pronunciou, em alemão, as palavras Ich bin ein Berliner – "eu sou um berlinense" –, reafirmando seu apoio à cidade.
A diretora do museu explica que as pessoas se esquecem que Kennedy estava em viagem pelo país e passou também por outras cidades alemãs. A visita à cidade dividida ofuscou o resto da passagem do presidente pela Alemanha – o que é lógico, pois ele esteve em Berlim apenas dois anos após a construção do Muro, lembra Heinze, durante um dos períodos mais críticos da Guerra Fria.
De protetores a parceiros
Ainda hoje alguns visitantes mais velhos se emocionam ao relembrar aquela época, a confiança deixada pela visita do presidente e a esperança de poder contar com Washington e suas Forças Armadas contra os soviéticos.
"Hoje o relacionamento entre Washington e Berlim é completamente diferente, é uma parceria em pé de igualdade", lembra Heinze. Depois da reunificação da Alemanha, em 1990, Berlim não precisava mais de proteção, e quase todas as tropas americanas foram retiradas da cidade.
Mas a poucos metros do museu ainda tremula uma bandeira dos Estados Unidos. Ao lado dela está um soldado fardado. Ele observa a multidão de turistas que transitam em torno de Checkpoint Charlie – o antigo posto de controle da fronteira entre as duas metades da cidade, preservado como memória da Berlim dividida.
Uma mulher posa para uma foto com o soldado, fazendo com os dedos o V da vitória. Ela pergunta a ele se de fato é americano. Como resposta, o soldado apenas "dá de ombros", impaciente. O próximo grupo de turistas já aguarda para tirar uma fotografia com ele. O que importa é ganhar dinheiro. Para questões de identidade, ele não tem tempo.
Novos tempos
O cientista político John Thimm, do Instituto Alemão de Relações Internacionais e de Segurança (SWP) em Berlim, fala que o final da Guerra Fria acabou com o "romantismo" nas relações entre os EUA e a Alemanha. Washington voltou-se mais para outras regiões, em especial a Ásia. Muitos políticos alemães temem que os EUA não deem mais importância para as chamadas relações transatlânticas.
Mas Thimm não compartilha dessa preocupação. Para ele, a reorientação para a Ásia é uma prova de que a Europa é um caso bem-sucedido na política externa americana, que não há mais grandes crises que exijam uma intervenção dos EUA.
As relações dos EUA com a Europa, principalmente em termos econômicos e culturais, são mais estreitas do que com outras regiões, argumenta Thimm. Mais de 100 mil americanos estão registrados na Alemanha, e quase 15 mil vivem na capital alemã, de acordo com a prefeitura de Berlim.
São pessoas como Juan Diaz. Há alguns anos, ele optou pela cidadania alemã e hoje tem dois passaportes. Em tom de brincadeira, Juan relata ter sido privilegiado na hora de fazer a prova de conhecimentos de alemão. Ele conta que, depois de ter terminado a prova, a mulher que aplicava o teste continuou conversando com ele por mais uma hora – simplesmente porque "é tão bom conversar com americanos", disse ela.