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Violação: um crime sem castigo na Libéria

28 de abril de 2012

Durante a guerra civil na Libéria a violação era usada como arma de guerra. Nove anos decorridos sobre o final do conflito e apesar da legislação aplicável em crimes sexuais ter sido agravada, a impunidade permanece.

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Die Liberianerinnen Jenny Brown (l) und Ester Macualey berichten am 6.8.2003 einem Berater über ihre Gruppenvergewaltigung durch Milizen im SKD-Stadion in Monrovia, wo Tausende vor den Kämpfen Zuflucht gesucht hatten. Es gibt 648 Fälle von Vergewaltigung und Gruppenvergewaltigung. Die Frauen wenden sich an das Concerned Christian Community Counceling-Zentrum um Hilfe. UN-Hilfsorganisationen haben die Lage in der liberianischen Hauptstadt Monrovia als sehr Besorgnis erregend bezeichnet. Es gebe massive Menschenrechtsverletzungen, Plünderungen und Vergewaltigungen, sagte die Sprecherin des UN-Koordinationsbüros für humanitäre Hilfe, Elisabeth Byrs, am 5.8. in Genf.
Frauen Vergewaltigung in LiberiaFoto: picture-alliance/dpa

Na Libéria, uma pequena nação da África Ocidental, com quase tantos habitantes como na capital alemã, Berlim, ou seja pouco menos de três milhões e meio, mais de mil e quinhentas mulheres são anualmente violadas. Aos tribunais chegam apenas seis por cento dos casos. A tradição dita que os casos de violação sejam "resolvidos em casa" e que os violadores gozem de impunidade.

No interior de uma pequena casa de tijolos numa plantação de borracha na Libéria Theophilus Togbah e a sua mulher olham para a fotografia da filha Caroline, de 13 anos. “Esta fotografia foi tirada na escola”, conta. Na imagem vê uma menina alta e magra vestida com um uniforme escolar verde e amarelo.“ E ela era uma boa aluna”, acrescenta . Pouco tempo depois de a fotografia ter sido tirada Caroline adoeceu .“Ela começou a ficar doente, a vomitar, e eu perguntei Caroline o que se passa contigo?”. Por fim, Caroline contou aos pais que um vizinho a tinha amarrado à cama e a tinha violado.

O pai Togbah sai para o exterior e aponta para a casa onde tudo aconteceu.“Foi aqui que ele a violou. Aqui na porta ao lado. Fiquei muito zangado porque ele era o meu melhor amigo e nós trabalhávamos juntos”, diz.

O amigo de Theophilus admitiu que tinha violado Caroline, deu ao pai algum dinheiro e duas nozes de cola, pequenas nozes castanhas que contém cafeína e que são um gesto de perdão na tradição liberiana.“ Ele trouxe-as para me pedir desculpa. Para nós elas são um sinal de paz e compromisso”. O vizinho implorou a Togbah para não o levar a tribunal.

Violêncial sexual no seio da família

As violações acontecem maioritariamente no seio da família
As violações acontecem maioritariamente no seio da famíliaFoto: picture alliance/dpa

Estamos numa clínica onde são tratadas vítimas de violação. A enfermeira-chefe, Elizabeth Kerkula, diz que Caroline é um caso típico na Libéria onde mais de metade das vítimas de violação têm menos de 14 anos.“Às vezes podem ter cinco, quatro ou mesmo três anos de idade”, acrescenta. O violador é normalmente um membro da família, um amigo ou um vizinho. E os casos de violação raramente chegam a tribunal. Em 2010 chegaram à clínica mais de mil vítimas, mas a enfermeira-chefe só foi chamada a depôr em tribunal seis vezes.“ O problema é a pressão familiar e da vizinhança, pressão que faz com que se façam compromissos. É preciso punir os violadores", sublinha.

A legislação não tem surtido efeito

Durante a guerra civil na Libéria a violação foi usada como arma de guerra. Porém, decorridos nove anos sobre o final do conflito porque é que a violação continua a ser tão comum?

Em 2005 os liberianos escolheram uma mulher como presidente, Ellen Johnson Sirleaf. No seu mandato as penas de prisão aplicáveis ao crime de violação tornaram-se mais pesadas e foi criado um tribunal especial para os crimes sexuais. Mas mesmo este endurecimento jurídico não produziu efeitos. Kerkula mostra um novo livro infantil publicado pelo Ministério da Justiça. O livro chama-se "Musu vai a tribunal". Trata-se da história de uma menina, Musu, que leva a tribunal o homem que a violou. A obra destina-se ao encorajar as jovens vítimas de violação a processar os criminosos.

Ellen Johnson-Sirleaf agravou as penas aplicadas aos crimes sexuais
A presidente Ellen Johnson-Sirleaf agravou as penas aplicadas aos crimes sexuaisFoto: Reuters

Pobreza é explicação parcial

Segundo Felícia Coleman, a procuradora geral para os crimes sexuais na Libéria, na origem do problema está a pobreza e a cultura. “ Muitas dessas famílias têm rendimentos muito baixos. Por isso, se o violador oferecer cem dólares ou 200 dólares isso é uma fonte de rendimento para eles”. Na Libéria o conceito de família alargada é muito importante e levar alguém da própria comunidade a tribunal é visto como uma traição dentro da família. Além disso, enviar para a cadeia um homem implica que a haja uma família que fica sem alguém para a alimentar. Muitos dos violadores são o pai ou o padrasto da criança e portanto mesmo que ele tenha violado a própria filha é ele o ganha pão da família. E a questão é o que acontece se ele for para a cadeia?

Justiça funciona mal

Num centro para mulheres no interior da Libéria, mulheres de todas as idades formam um círculo e cantam. Algumas foram violadas. Uma delas grita: "Não há justiça na Libéria, em toda a Libéria não há justiça”. Mesmo que quisessem ter recorrido à justiça o sistema judicial é confuso, corrupto e sobretudo muito caro. "Como pode uma criança eu pagar a um advogado?", pergunta uma jovem.

Há um mês a filha de Theophilus Togbah morreu. O relatório médico diz que ela foi vítima de uma assepsia e do choque depois da violação. A mãe de Caroline quer processar o seu vizinho. “Quero ir a tribunal porque estou muito magoada. Eu perdi a minha filha”, diz. Mas as hipóteses para a mãe de Caroline não são promissoras. Há oito meses que o caso foi reportado à polícia. A polícia não o enviou para o Tribunal e não sabe onde para o dossier. O violador ainda está na prisão , mas será libertado em breve se não for acusado pelo. Aliás como acontece com a maioria dos violadores na Libéria.

Autoras: Bonnie Allen/ Helena Ferro de Gouveia
Edição: António Rocha/Madalena Sampaio

Violação: um crime sem castigo na Libéria