Depois de 11 rondas, as negociações entre o maior partido da oposição moçambicano, a RENAMO, e o Governo trouxeram, pela primeira vez, resultados.
Relativamente ao pacote eleitoral, poderão ser feitas as mudanças exigidas pelo maior partido da oposição. Os políticos chegaram, por exemplo, a um acordo parcial sobre a composição da Comissão Nacional de Eleições (CNE). Já quanto à desmilitarização da RENAMO, exigida pelo Governo, permanece o impasse. Mas até que o acordo final seja alcançado ainda haverá mais rondas para os últimos acertos, bem como preparativos para o encontro entre o Presidente Armando Guebuza e o líder da RENAMO, Afonso Dhlakama.
Em entrevista à DW África, o analista político moçambicano Silvério Ronguane deu nota positiva a este primeiro consenso no diálogo entre o Governo e a RENAMO.
DW África: Como avalia os resultados destas negociações?
Silvério Ronguane (SR): Admito que milhões de moçambicanos se sentiram muito reconfortados com aquela que foi a prova viva de que os nossos governantes e dirigentes políticos ainda têm esta capacidade de se encontrar e resolver os problemas. Porque, a grande questão era a paridade e a participação dos partidos políticos nos órgãos eleitorais. Acho que é uma questão justa, porque o processo político tem de ser dirigido pelos interessados. Portanto, tem muito sentido que os dirigentes dos processos eleitorais também sejam pessoas do mundo da política, mormente dos partidos políticos.
Para nós, foi uma ótima notícia, um sinal de esperança muito grande. Significa que, efetivamente, as coisas já estão a começar a encaixar.
DW África: Caso cheguem a acordo, será formada então uma nova Comissão Nacional de Eleições (CNE), mais equilibrada?
SR: Se calhar, "novo" não é o termo mais adequado, mas haverá um novo figurino. Isto pode ser duas coisas: ou se refaz toda a CNE, e acho que não é essa a via mais correta, ou simplesmente há uma acomodação. Se diminuírem os membros do partido FRELIMO ou que vieram pela sociedade civil, mas que, para todos os efeitos, pertencem à FRELIMO porque foram votados pela bancada maioritária, e, depois, a RENAMO indicar os seus membros e o MDM fazer o mesmo, então caminhamos para a paridade.
DW África: A ser assinado, o acordo não satisfaz apenas a RENAMO, mas também a sociedade civil moçambicana, que tem criticado a composição da CNE e também questões relativas às eleições em si. Podemos considerar, com isso, que as bases para eleições justas, credíveis e transparentes poderão ficar garantidas com o acordo?
SR: Sem dúvida nenhuma. Moçambique, como qualquer país subdesenvolvido, é aquilo que nós chamamos de "país sobrecarregado por condições desfavoráveis". Num contexto destes, nunca se pode fazer processos tão transparentes, tão justos, mas pelo menos serão as eleições possíveis e serão eleições com o maior número de consenso. Por essa via, é mais fácil que [as eleições] sejam aceites e reconhecidas.
Nesse sentido, podemos dizer que serão eleições mais transparentes, porque todos os atores vão sentir que fazem parte do processo. Eles vão assumir os seus erros, os constrangimentos, assim como os êxitos. Isso significa que serão eleições que vão garantir aquilo que efetivamente é importante numa democracia, que é a capacidade de criar consensos, acomodar interesses conflituantes e criar uma estabilidade governativa.
DW África: A serem aprovadas as mudanças no âmbito do processo eleitoral, acha que o recenseamento será prolongado ou será feito um outro recenseamento, tomando em conta que a RENAMO está a boicotar o processo?
SR: Não. Pela primeira vez na história de Moçambique, o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE) veio reconhecer que só se iam recensear 75% dos eleitores. O que significa que há um grupo de 25% da população que não se recenseou por várias razões, mas é possível acreditar que uma parte deles é porque são filiados à RENAMO.
Acredito que, a partir de hoje, com este anúncio de que já foi encontrado um consenso e que estão abertas as portas para o povo participar, muita gente vai começar a afluir às mesas de recenseamento. Portanto, é de acreditar que um prolongamento já se fazia sentir.