Ruanda desvaloriza tiroteio na fronteira com a RDCongo
18 de junho de 2022Um soldado da República Democrática do Congo (RDCongo) morreu na sexta-feira (17.06), num tiroteio num posto fronteiriço com o Ruanda, num contexto de crescentes tensões ao longo das últimas semanas, devido aos últimos combates entre o exército de Kinshasa e o grupo rebelde Movimento 23 de março (M23).
As tensões entre o Ruanda, que tem uma das mais eficazes forças armadas de África, e a RDCongo, um dos maiores e mais problemáticos países do continente, são antigas, mas acentuaram-se nos últimos meses, com Kinshasa a acusar Kigali de apoiar os rebeldes do M23, desde novembro acusado de realizar ataques contra posições do Exército da RDCongo no Kivu do Norte.
O soldado, armado com uma AK47, atravessou o posto fronteiriço 'Petite Barrière', no distrito de Rubavu, e abriu fogo contra os seguranças ruandeses e civis na fronteira, ferindo dois polícias ruandeses.
Crise diplómatica
As relações entre a RDCongo e o Ruanda vivem momentos de crise desde a chegada em massa ao leste da RDCongo de hutus ruandeses acusados de terem massacrado os tutsis durante o genocídio do Ruanda de 1994.Após um período de alguma acalmia diplomática, o conflito voltou a intensificar-se no final do mês passado, quando o Governo de Kinshasa convocou o embaixador ruandês para denunciar o suposto apoio do país ao M23.
"Consideramos isto apenas como um incidente. Foi aberta uma investigação por parte do mecanismo de verificação conjunta e o nosso Ministério dos Negócios Estrangeiros já discutiu esta questão com os seus homólogos congoleses", disse a porta-voz do Governo do Ruanda, Yolande Makolo, em declarações ao 'New Times'.
A porta-voz também saudou os apelos do Governo da RDCongo para combater a estigmatização dos ruandeses no país e garantiu que, como membro da Comunidade de Estados da África Oriental, o Ruanda está pronto a desempenhar um papel na força regional convocada pelo Presidente do Quénia, Uhuru Kenyatta, para restaurar a paz no leste da RDCongo.
No entanto, a República Democrática do Congo, não quer o Ruanda numa eventual força regional no seu território e apelou em comunicado nesta sexta-feira (17.06), ao primeiro-ministro britânico, Boris Johnson em vésperas da sua visita à Kigali que vai acolher uma cimeira da Commonwealth, que convença Paul Kagame a terminar a "agressão".
"Os terroristas do M23 [grupo rebelde Movimento 23 de março], apoiados pelo Ruanda, atacaram [segunda-feira a localidade de Bunagana", na fronteira com o Uganda, "e saquearam-na", acusou, mais uma vez, o Governo de Kinshasa num comunicado de imprensa do Ministério das Comunicações e Media.
O comunicado recorda que decorreu na quarta-feira um "Conselho Superior de Defesa" extraordinário, presidido pelo chefe de Estado, Felix Tshisekedi, após o qual a RDCongo decidiu suspender os acordos bilaterais com o Ruanda.
"A segurança continua a deteriorar-se no leste, basicamente porque o Ruanda está a tentar ocupar o nosso país, rico em ouro, coltan [mistura de columbita e tantalita] e cobalto, para seu próprio proveito. É uma guerra económica pelo controle de recursos, travada por gangues terroristas do Ruanda", afirma o Presidente da RDCongo, citado no documento.
Mediação angolana
Angola tem procurado mediar a tensão entre Ruanda e RDCongo, no âmbito de um mandato atribuído a Luanda pela União Africana na recente cimeira realizada em Malabo.
Em 31 de maio, o Presidente angolano, João Lourenço, abordou com o Presidente Tshisekhedi "questões relativas à crescente tensão" entre a RDCongo e o Ruanda, tendo discutido "vários aspetos que podem contribuir para a resolução pacífica do diferendo entre os dois países".
Na terça-feira (14.06), o líder angolano transmitiu ao secretário-geral da ONU, António Guterres, preocupação com a situação na relação entre aqueles dois países, "o que justifica a realização, com urgência, da Cimeira de Luanda, entre o mediador Angola" e os respetivos chefes de Estado.