Refugiados namibianos no Botswana não querem voltar a casa
27 de agosto de 2018Inicialmente eram 3000 os refugiados da Namíbia. Agora, já só vivem no Botswana pouco mais de 700. Mas não por muito mais tempo, se depender dos governos dos dois países. "Eles são namibianos e são bem-vindos no seu país de origem. Vamos recebê-los de braços abertos", disse em entrevista à DW o comissário para os refugiados da Namíbia, Likius Valombola.
Em maio, o Governo do Botswana pediu aos refugiados que regressassem voluntariamente até 11 de julho. Depois dessa altura, seriam declarados estrangeiros indesejados e deportados. A Namíbia aprova o plano.
Os dois governos argumentam que a crise em Caprivi acabou e agora a Namíbia é um país seguro. "O Governo da Namíbia vai recebê-los de braços abertos, com dignidade e segurança, como já recebemos outros refugiados que regressaram voluntariamente a casa", afirma Likius Valombola.
Medo de voltar
Os refugiados não parecem tão otimistas. A pedido destes, o Tribunal Supremo do Botswana proibiu, por enquanto, a sua deportação. A Amnistia Internacional (AI) também está preocupada. "Há o risco de serem alvo de perseguição ou outras violações graves dos direitos humanos na região de Caprivi, mesmo que o Governo namibiano garanta que há segurança", afirma Shireen Mukadam, especialista da AI. "As pessoas não podem simplesmente ser largadas nas ruas nem ser forçadas a regressar à Namíbia se têm medo", diz.
A onda de violência no final dos anos 90 acabou, mas não foi esquecida. Após a independência da Namíbia, em 1990, Caprivi, uma estreita faixa no nordeste, era uma das zonas mais pobres do país. Muitos moradores sentiam-se abandonados pelo governo central e um movimento separatista da região resolveu agir.
O facto desta região pertencer à Namíbia é apenas uma consequência da era colonial. Em 1890, a faixa de Caprivi (tal como a ilha de Helgoland) pertencia à Grã-Bretanha, passando depois para as mãos dos colonialistas alemães, que ocuparam o território onde hoje se situa a Namíbia.
Culturalmente, os moradores sentem-se mais próximos dos vizinhos do Botsuana. Em 1999, a luta pela independência de Caprivi viveu dias sangrentos: combatentes ocuparam esquadras da polícia, estações de rádio e o aeroporto da capital regional Katima Mulilo. O Governo da Namíbia declarou o estado de emergência e o exército foi chamado a intervir. Segundo a Amnistia Internacional, mais de 300 pessoas foram presas.
Em 2006, o Governo da Namíbia proibiu o Partido Democrático Unido (UDP), o braço político do movimento de libertação de Caprivi. Os líderes do partido vivem no exílio na Dinamarca e alguns refugiados ainda pertencem ao UDP. Por isso, é grande o medo de voltar para casa. "Alguns dos que regressaram recentemente foram presos", diz Letseweletse Martin Dingake, advogado dos refugiados namibianos no Botswana.
Os que participaram na revolta de 1999 devem responder por isso, diz o comissário para os refugiados da Namíbia. "O nosso sistema judiciário é livre de quaisquer interferências políticas, sociais e económicas", diz Likius Valombola. "Se sabem que participaram na revolta fracassada, porque é que estão com medo? Eles devem voltar para casa e responder às perguntas que lhes estão a ser feitas", defende.
Refugiados pressionados
Mas até no Botswana está a aumentar a pressão, dizem os refugiados. Num e-mail enviado à DW, um deles fala de inúmeras restrições - como programas de emprego, que permitiram aos refugiados ganhar algum dinheiro extra, que entretanto foram cancelados. Também foram suspensos determinados serviços e programas médicos para jovens.
Segundo o advogado dos refugiados, em breve os namibianos também deixarão de receber comida. "Está a ser usada uma tática coerciva, repressiva e de divisão para quebrar o espírito e a unidade deste grupo de pessoas", acusa Martin Dingake. "O desespero vai aumentar e alguns podem até preferir morrer na sua própria terra do que numa terra estrangeira", conclui.
A DW solicitou uma entrevista à Comissão de Refugiados da ONU, mas até agora não teve resposta.
O advogado, que representa os refugiados desde 2015 de forma voluntária, quer continuar a lutar. O seu objetivo é que os namibianos sejam novamente reconhecidos como refugiados. No entanto, é pouco provável que haja uma decisão em breve: o processo pode levar entre três a quatro anos a ser concluído, diz Dingake. Para os refugiados esquecidos da Namíbia, a incerteza pode prolongar-se por muito mais tempo.