Rafael Marques denuncia novos atos de tortura de garimpeiros
16 de junho de 2016A "tortura da catana continua na região diamantífera das Lundas", denuncia o blogue Maka Angola, do jornalista e ativista dos direitos humanos Rafael Marques.
Num vídeo de 7 minutos e 14 segundos, apresentado no portal, homens fardados batem com uma catana nas mãos e nos pés de garimpeiros, estendidos no chão e a gritar de dor. Segundo o Maka Angola, as imagens foram captadas a 21 de abril de 2016 na área do Dambi, na zona de Cafunfo, província da Lunda-Norte. O blogue avança que os homens armados são guardas da empresa de segurança privada Bicuar, contratada pela Sociedade Mineira do Cuango (SMC).
Rafael Marques foi condenado, em maio do ano passado, a seis meses de prisão, com pena suspensa, por 12 crimes de denúncia caluniosa contra empresas de exploração mineira e sete generais envolvidos em negócios de diamantes. A condenação, de que entretanto Marques recorreu, seguiu-se à publicação do livro "Diamantes de Sangue - Corrupção e Tortura em Angola", em 2011.
Em entrevista à DW África, o autor diz que, para quem ainda tinha dúvidas sobre a sua investigação, estão agora aqui novas provas, em vídeo.
DW África: Que garantias há hoje em dia, para quem compra os diamantes de Angola, que esses diamantes são limpos?
Rafael Marques (RM): Não há garantias absolutamente nenhumas, excepto os certificados do Governo que não têm qualquer relação com a realidade no terreno. Porque o Governo dá cobertura a crimes que ocorrem na região das Lundas – por exemplo, o Governo, através da sua empresa Sodiam, que tem uma parceria com Isabel dos Santos e o seu marido Sindika Dokolo, tem autoridade para comprar diamantes dos garimpeiros ilegais. Quando estas empresas compram os diamantes, os diamantes são legais. Mas os vendedores são ilegais e, portanto, as autoridades julgam-se no direito de os torturar e até matar, em contravenção à legislação angolana que proíbe a tortura e tratamentos desumanos.
No vídeo vê-se claramente que continua a usar-se catanas para torturar os garimpeiros -estamos em 2016! Se um indivíduo bate mal com a catana, faz um corte na cabeça e [o garimpeiro] morre logo – foi assim que muitos foram mortos.
DW África: Falou com as empresas identificadas no artigo?
RM: Eles já não ouvem, nem respondem. E inventam sempre histórias – a Sociedade Mineira do Cuango tem o desplante de continuar a afirmar que não opera em Cafunfo. E esta [empresa de] segurança está ao seu serviço, é a única empresa que opera naquela região - a [empresa de segurança privada] Bicuar faz parte da empresa.
DW África: Houve mudanças nas Lundas desde que publicou o livro "Diamantes de Sangue"?
RM: Houve uma mudança significativa. Houve a retirada da Teleservice, a companhia que sempre acusei de fazer vários desmandos. Durante algum tempo, houve uma relativa acalmia. A Bicuar substitui a Teleservice e mantém as mesmas práticas. São práticas institucionalizadas e que, de certa forma, as próprias autoridades encobrem e incentivam, porque, com tantas denúncias que há, não tem havido, por parte da Procuradoria-Geral, das autoridades locais ou da própria polícia, medidas que venham pôr termo a esse tipo de arbitrariedades.
DW África: Em que ponto está o caso em tribunal a propósito do seu livro, "Diamantes de Sangue"?
RM: Estou à espera da condenação do Supremo. Dizem que eu estava a falar à toa, e estão aí as provas e os vídeos a surgir. Obviamente, agora vão dizer que eu inventei o vídeo, que fiz montagem ou que aquela não era a área do Dambi, mas os garimpeiros estão ali, no vídeo. E pode-se ver os rostos dos efetivos da segurança Bicuar.
DW África: Espera para breve uma resposta ao recurso da condenação?
RM: Nós temos um sistema judicial em que não há respeito nenhum pela lei e pelos cidadãos. Quando eles decidirem tomar uma decisão, que tomem. E se decidirem que eu tenho de ir preso, então que me venham buscar a casa. Se decidirem que tenho de ir embora… Qualquer que seja a decisão que venha a ser tomada, não impedirá que eu continue a fazer o meu trabalho e a denunciá-los. Ponto final.
A DW África tentou falar várias vezes com a Sociedade Mineira do Cuango, mas, quando ligámos, ouvia-se uma mensagem gravada, informando que os números contactados não estavam a aceitar chamadas no momento.