Quénia quer usar terras em Moçambique mas divide opiniões
18 de agosto de 2023Durante a recente visita do Presidente do Quénia, William Ruto, a Maputo, foi anunciado que o país da África Oriental pretende utilizar as terras de Moçambique para produzir alimentos destinados ao continente africano. No entanto, essa declaração tem suscitado diferentes reações.
O diretor-executivo do Observatório do Meio Rural (OMR), o economista João Mosca, considera que as afirmações do Quénia não passam de uma estratégia política e aponta para a necessidade de cautela na interpretação dessas intenções.
"Por isso, penso que não podemos dar demasiada importância a essas afirmações de políticas, que não passam exatamente disso, uma afirmação que num determinado momento cujos objetivos poderão ser outros e não os que estão a ser anunciados", avalia Mosca.
"Quénia por si só pode não estar em condições de investir"
No entanto, o analista político Wilker Dias possui uma perspetiva diferente. Ele acredita que o projeto queniano pode ser bem-sucedido, mas provavelmente não abrangerá todo o continente.
Dias salienta que "o Quénia por si só pode não estar em condições de investir tanto", mas a viabilidade dependerá da capacidade logística e financeira do país, podendo a colaboração com parceiros ser fundamental para alcançar resultados significativos.
"E paulatinamente", continua Wilker Dias, "quando forem a ser apresentados os resultados, aí sim pode-se partir de uma vertente mais alta".
Capacidade técnica e financeira
No entanto, João Mosca argumenta que o Quénia não dispõe da capacidade técnica e financeira necessária para empreender tal projeto, questionando a venda de suas terras em favor de estrangeiros.
"Então porque é que vendem as suas terras e não produzem alimentos suficientes para eles próprios e para o resto de África e vem socorrer-se de Moçambique?", questiona.
Direito das comunidades
Mosca ainda alerta para potenciais riscos caso o Governo queniano implemente a ideia de usar terras em Moçambique para produzir alimentos em escala continental, sugerindo que tal iniciativa poderia violar leis de terras e entrar em conflito com os interesses das comunidades e da segurança alimentar.
Wilker Dias também sugere que Moçambique poderá estabelecer leis para proteger as comunidades locais e salvaguardar os interesses do Estado, caso essa empreitada se concretize, "respeitando sempre o processo da soberania".
Contrapondo as preocupações com projetos anteriores, como o ProSavana (Programa de Cooperação Tripartida para o Desenvolvimento Agrícola da Savana Tropical no norte de Moçambique), Wilker Dias enfatiza que o atual cenário se diferencia substancialmente, "porque este caso é extremamente diferente".
"Teremos uma espécie de estarmos a alugar a nossa terra para que o outro possa produzir os alimentos", conclui.