Lembrar Garissa
1 de abril de 2016Hoje o dormitório de nome "Mount Elgon" está abandonado. Reina o silêncio nos corredores. Os vidros partidos e os buracos das balas nas paredes são testemunhas de um dos mais brutais atentados sofridos pelos quenianos na sua história recente.
Passando pelo átrio, onde os terroristas mataram mais de 80 estudantes, subindo as escadas, depara-se com uma quarto cuja porta se encontra encerrada com tábuas. Quem olha pela janela ainda vê manchas de sangue no chão na forma de um corpo humano. Até agora não foi possível limpar a mancha, diz um funcionário da universidade.
O recomeço?
Uma parte do estabelecimento de ensino foi renovada antes da reabertura em janeiro. Em redor do dormitório foram plantadas árvores em memória dos estudantes que aqui perderam a vida em 2 de abril de 2015. O dormitório agora tem um nome novo, "Ewaso Ngiro", numa tentativa de ajudar os alunos e funcionários a superar o trauma.
"Tantos dos meus amigos morreram no ataque, o que nos entristece muito", diz Sofia Noor Soiyan, de 24 anos, uma estudante no terceiro ano que sobreviveu ao ataque. "Nós pensamos neles todos os dias”, acrescenta. Sofia diz que vai participar na cerimónia marcada para o 2 de abril de 2016, para prestar homenagem às vítimas.
Mesmo passado um ano, para a maioria das pessoas ainda é difícil lidar com o sucedido. Mohammed, que pediu o anonimato, diz que continua a sofrer com o horror que presenciou naquele dia. "Tenho graves dificuldades, porque a maior parte dos meus amigos foi massacrada".
Mohammed diz que teve sorte, porque nesse dia estava doente e ficou em casa com os pais. "Podia ter sido uma das pessoas assassinadas, porque todas as que estavam no dormitório foram mortas".
"Sempre que entro no quarto vejo imagens, sangue", diz o estudante. "Estou a tentar lidar com a situação". Mohammed está satisfeito com o reforço da segurança no recinto da universidade. E espera que muitos mais estudantes regressem, agora que a escola reabriu.
A Universidade de Garissa foi encerrada após o ataque. Os estudantes foram transferidos para outras universidades do país. Alguns desistiram por completo dos estudos, porque estavam demasiado traumatizados, disse à DW o diretor da Universidade de Garissa, Ahmed Warfa. Há quem ainda hoje necessite de acompanhamento psiquiátrico. Alguns estudantes sofrem de depressão. Mas a maioria superou o trauma e regressou aos estudos".
Reviver o horror todos os dias
O diretor admite que não há um dia em que não reviva o ataque: "Tinha planeado ir à mesquita rezar. Mas algo me disse para não ir e fiquei a rezar em casa. Aí ouvi o primeiro tiro".
A casa de Warfa fica a poucos metros da entrada principal da universidade. Hoje, sentado no seu escritório, o diretor recorda-se exatamente do momento em que os terroristas atacaram. "Vieram por ali", diz, apontando pela janela para o portão principal. "Depois atravessaram a entrada e ouvira os estudantes da União Cristã que rezavam. Foi aqui que assassinaram os primeiros doze estudantes".
Warfa pensou na altura que assim que a polícia e o exército chegassem, poriam cobro ao massacre. Mais tarde compreendeu o seu erro: "Em vez de entrar, o exército limitou-se a disparar de uma grande distância. Teriam bastado três ou quatro soldados para salvar os estudantes, mas não o fizeram. Isso chocou-me profundamente".
As autoridades quenianas foram duramente criticadas pela sua reacção demasiado lenta ao ataque, tanto mais que há uma base militar a apenas meio quilómetro da universidade.
Reforço da segurança
Hoje a segurança no recinto é apertada. Foi aberta uma esquadra da polícia com 25 agentes fortemente armados. A polícia escrutina todos os visitantes com rigor. Mas persiste um ambiente de nervosismo.
O Governo queniano prometeu o equivalente a 2,5 milhões de euros para construir um muro à volta da universidade. Faisal Aden, um estudante, diz que o reforço da segurança transformou o ambiente em toda a região. Mesmo os habitantes locais notam o reforço da segurança, acrescenta.
Inicialmente, Aden não contava com a reabertura da universidade. Depois do atentado verificou-se um verdadeiro êxodo de Garissa, não só de estudantes, mas também de negociantes e comerciantes. Foram-se embora porque temiam pela vida, mas também porque perderam os seus únicos clientes: os estudantes.
Aden diz estar contente por ver novos alunos chegarem à universidade. Neste momento são mais de 160 que vieram por conta própria. "Um ano após o atentado, começam a fechar-se as cicatrizes e a Universidade de Garissa volta ao que era antes", diz Aden.