Presidente do Sudão do Sul minimiza crise de refugiados
25 de agosto de 2017O Sudão do Sul é palco de confrontos desde dezembro de 2013, depois do Presidente Salva Kiir acusar o seu vice, Riek Machar, de orquestrar um golpe de Estado. O conflito deixou várias zonas do país à beira da fome. Um em cada quatro sul-sudaneses foi obrigado a fugir, dois milhões procuraram refúgio em países vizinhos.
Nos últimos quatro anos, vários acordos de cessar-fogo foram quebrados. Em maio de 2017, Kiir lançou oficialmente um Diálogo Nacional. É uma nova tentativa de conquistar a paz no país, criado em 2011.
DW: Por que está tão otimista de que o Diálogo Nacional funcionará desta vez?
Presidente Salva Kiir (SK): Acredito que a última tentativa de diálogo nacional é uma oportunidade para quem não viu as suas queixas serem respondidas no acordo de paz [de 2015] chegar à frente e apresentá-las para discussão. Depois disso, quando as resoluções forem aprovadas por membros da equipa do Diálogo Nacional, poderão ser levadas em consideração em próximas constituições governamentais.
DW: Mas nem todas as partes parecem dispostas a participar. O seu antigo vice-Presidente, Riek Machar, atualmente a viver no exílio na África do Sul, não parece muito disposto a juntar-se ao diálogo.
SK: Não excluímos ninguém. Mas, quanto ao Riek, ele sabe porquê. Não é ele que não esteja interessado em juntar-se ao diálogo, a região inteira é que não quer [que ele se junte]. Foi esse o acordo, porque, se ele vem cá, geraria uma situação de regresso à guerra. A sua presença desestabilizaria a região inteira, não só o Sudão do Sul.
DW: Ele ainda é uma ameaça ao seu Governo?
SK: Ele não é uma ameaça ao Governo. Ele só provoca desordem quando telefona aos apoiantes. Ele sabe onde eles estão escondidos e estas são as pessoas que continuam a provocar problemas, que continuam a combater e não querem paz. Ele não tem espírito de liderança, não tem espírito de união; quer que pessoas morram todos os dias.
DW: Há outros grupos rebeldes a combater em várias zonas do país. Os seus críticos acusam-no de desempenhar mais as funções de edil da capital, Juba, do que de Presidente da República, porque pouco sai daqui. É verdade?
SK: Se precisar de sair, saio, para fazer uma visita. Na sexta-feira passada, fui a Kigali para assistir à tomada de posse do Presidente do Ruanda e voltei. Portanto, não só o edil de Juba. Juba tem os seus próprios governadores e edil. Não é essa a minha tarefa.
DW: Mas é livre para se deslocar no país?
SK: Sim, sou livre. A que parte do país se refere?
DW: Pode ir a Bentui ou Malakal [no extremo norte do país, perto da fronteira com o Sudão]? Quando foi a última vez que esteve nesses sítios?
SK: Posso ir a todo o lado. Se quiser ir hoje a Bentui, vou.
DW: Há relatos de violações dos direitos humanos por parte de todas as partes no conflito, incluindo por parte das forças da oposição e do Governo. Quão difícil é controlar os seus combatentes nas áreas rurais, onde alguns não recebem rações e saqueiam comida?
SK: Não é verdade que as forças governamentais estejam envolvidas em atividades desse género. No Sudão do Sul, há muitas pessoas armadas. Essas pessoas adquiriram uniformes do exército e fazem-se passar por membros das forças de segurança sul-sudanesas, seja por polícias ou por guardas prisionais ou militares.
DW: Muitos servidores públicos, incluindo soldados e polícias, não são pagos há quatro meses. Isto não inflama o conflito? Quando é que eles serão pagos?
SK: Não inflama o conflito. É lamentável que a economia tenha registado uma quebra. Numa situação de guerra, não se consegue ter uma economia forte. A guerra pode acabar com todos os recursos disponíveis.
DW: Não acha que isso torna difícil a situação dos soldados a combater na linha da frente?
SK: Estes soldados são voluntários; voluntariaram as vidas para lutar pela libertação e independência do seu país. Lutaram durante 21 anos sem salário. Hoje não é diferente.
DW: Há atualmente uma certa tensão entre a missão das Nações Unidas para o Sudão do Sul, a UNMISS, e o Governo. Há quem acredite que o Executivo não está realmente disposto a ter essas tropas aqui. [Este ano, o Governo sul-sudanês rejeitou o envio de 4.000 capacetes azuis adicionais.]
SK: Pergunte aos líderes regionais quem sugeriu a presença de uma força regional de proteção. A força regional que veio não é da região. O nome está incorreto. Trouxeram para cá nepaleses, que não têm função aqui, mas nós aceitámos que viessem. Qualquer que seja o diferendo, será resolvido.
DW: A situação humanitária no país é severa. Quase 2 milhões de pessoas estão desnutridas, 1 milhão teve de fugir só para o Uganda. Como pensa melhorar esta situação?
SK: A situação melhorará com o calar das armas. As organizações humanitárias regressarão e servirão as pessoas, e todos voltarão às suas casas. Nada de mais.
DW: Isso significa que não é uma prioridade para o seu Governo?
SK: É uma prioridade. É por isso que estamos a trabalhar com organizações não-governamentais, para servir as pessoas. Não é motivo para deixarmos de olhar para as pessoas. Foi por elas que lutámos, para serem livres. Não podemos deixar que elas morram de fome. As pessoas que fugiram para o Uganda foram afugentadas pelos média. Não havia confrontos na região. Disseram-lhes para sair porque sabiam que um oficial das Nações Unidas esteve lá para avaliar a situação humanitária para ver se era necessária assistência. Em vez disso, ele foi e anunciou que o Sudão do Sul estava próximo do genocídio, algo que não aconteceu até agora. Disseram às pessoas para sair de casa e fugir, que se não saíssem numa hora seriam mortos.
DW: Está a sugerir que o relatório enganou as pessoas?
SK: Sim, enganou as pessoas e é uma conspiração contra o Governo da República do Sudão do Sul.
DW: É uma conspiração das Nações Unidas?
SK: Não das Nações Unidas, mas é uma conspiração de algumas pessoas contra o Governo de Juba.
DW: Pode nomear alguém?
SK: Não vou mencionar nomes, mas você sabe que há interferência internacional em assuntos internos dos países.