Polícia de Moçambique comporta-se como exército privado da FRELIMO, critica analista
Ainda estão por apurar os resultados finais das eleições autárquicas de Moçambique, levadas a cabo na quarta-feira, 20 de novembro, mas já se levantam críticas ferozes à atuação da polícia nalgumas províncias, onde há mortos a lamentar.
A DW África falou com o diretor editorial do jornal Canal de Moçambique, Fernando Veloso, que se encontra em Quelimane e tem observado de perto os acontecimentos no país. Para este analista, não há dúvida de que as ações da polícia são um indício de grande insegurança do partido no Governo, a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) face aos avanços do partido da oposição, Movimento Democrático de Moçambique (MDM).
DW África: Resultados preliminares indicam a possibilidade da vitória do MDM em baluartes importantes da FRELIMO, como Maputo e Matola. Como avalia estes avanços da oposição?
Fernando Veloso (FV): É muito cedo para dizer o que quer que seja, porque não tenho os resultados consolidados e estou fora de Maputo. O que se pode dizer já é que, independentemente de quem ganhar em Maputo e Matola, a oposição ganhou imenso terreno. A diferença entre a FRELIMO e o MDM nas assembleias vai ser tão pequena como nunca. Em Inhambane, as coisas melhoraram para a oposição, para quem estava no poder, que era o MDM e Manuel de Araújo. Na Beira, idem, também melhorou muito para o presidente do MDM, Daviz Simango, e mesmo para o partido. Na Zambézia, há problemas em Milange, em Gurué e em Mocuba. As coisas estão muito renhidas, mas tudo indica que o MDM ganhou e há evidentes esforços para se alterar o quadro e fazer reverter a tendência. Em Mocuba e em Quelimane já houve mortos.
DW África: Mas esses esforços vêm de que lado?
FV: A polícia está claramente do lado de um dos concorrentes, que é o partido que controla o governo a nível central. É o partido do Ministério do Interior, digamos assim, que tutela a polícia de choque, a polícia de intervenção rápida e todos os outros ramos da polícia.
DW África: Há o perigo de se abrir mais uma frente de conflito, depois de tudo o que aconteceu?
FV: Eu duvido muito que isso aconteça, porque ninguém está interessado em que as coisas sejam levadas a esse extremo. O que se pode dizer já é que, depois de a RENAMO se retirar deste contexto, está visto que há outro beligerante que não pára de usar armas contra a vontade dos eleitores. E o que estamos a ver é que a polícia está nitidamente do lado da FRELIMO. Ontem, aqui em Quelimane, chegou-se ao extremo: um indivíduo à civil matou um conhecido músico aqui de Quelimane, o Max Love.
DW África: Pode-se dizer que estes são esforços desesperados, porque com o avanço do MDM (também à custa da RENAMO), haverá uma percepção no país de que as pessoas querem uma mudança e que essa mudança se vai acentuar nas eleições gerais de 2014?
FV: Sente-se que há um total descontrolo nas forças de lei e ordem, sente-se que nem todos os polícias são maus, fica-se com a impressão de que a maioria dos polícias vai fazer sempre parte da solução. Mas há situações em que a polícia tem vindo a intervir que são um total absurdo.
DW África: O que é que este cenário todo, incluindo o conflito que ainda persiste entre a RENAMO e a FRELIMO, preconiza para as eleições gerais de 2014?
FV: É muito cedo para se deduzir alguma coisa, mas o que ouço as pessoas dizerem é que o presidente Dhlakama tem razão, quando diz que não é possível fazer eleições no atual quadro legal. Realmente, a polícia comporta-se como o exército privado do partido FRELIMO. Para 2014, penso que é preciso prosseguir de forma firme. A grande incógnita é o que se irá passar em Moçambique depois destas eleições. E fica a questão: vai ou não haver eleições em 2014?