Para onde vais, RENAMO, com Ossufo Momade?
17 de junho de 2019A Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) tenta minimizar a aparente crise interna exposta com a revolta de um grupo de guerrilheiros contra o presidente Ossufo Momade. Na semana passada, os guerrilheiros ameaçaram matar Momade, se ele não renunciasse ao cargo.
O porta-voz do maior partido da oposição, José Manteigas, garantiu numa conferência de imprensa que o ambiente na base da RENAMO na Serra da Gorongosa é cordial e de união. E sublinhou que Momade continua a controlar o partido e o seu braço armado.
Mas a revolta reacendeu o debate sobre se Ossufo Momade foi a melhor escolha para dirigir a RENAMO. Entrevistado pela DW, o analista político Calton Cadeado entende que falta a Momade capital político, algo que o deixará em posição de desvantagem na corrida eleitoral de outubro próximo.
DW África: A RENAMO deu pouca relevância às denúncias feitas por alguns guerrilheiros do partido. Pareceu-lhe uma tentativa de minimizar a aparente crise dentro da RENAMO?
Calton Cadeado (CC): É, de facto, uma tentativa de minimizar a crise. Mas, mais do que isso, é uma tentativa de mostrar que a RENAMO, como partido, tem uma certa coesão, embora se note que é uma coesão frágil. Além disso, é uma tentativa de mostrar que a RENAMO é um partido com vitalidade - basta olhar para um comunicado de imprensa da RENAMO que faz uma utilização de retórica extramente elogiosa ao próprio partido e à ligação com as bases, sobretudo para mostrar que está comprometida com o processo de pacificação no país, algo que só pode acontecer com uma RENAMO forte e unida.
DW África: Quais são as consequências desta crise para as negociações de paz em curso?
CC: Isto fragiliza a RENAMO e a ligação entre a RENAMO e o Governo. Fragiliza a posição do Sr. Ossufo Momade como um interlocutor principal e válido na negociação com o Presidente da República - pelo menos à primeira vista, num primeiro momento, no calor da tensão dentro da própria RENAMO. Veremos o que vai acontecer nos próximos momentos, se o Sr. Ossufo Momade sobrevive a esta crise ou se sai de cena. Espero que não saia de cena do ponto de vista físico, como foi dito naquela entrevista que os guerrilheiros descontentes deram a alguns órgãos de comunicação social.
DW África: Ossufo Momade terá sido uma má escolha da RENAMO?
CC: Esta é uma pergunta que vem confirmar o debate que houve na altura da sucessão. Muitos diziam que Ossufo Momade não tinha um capital político muito forte para suceder a Afonso Dhlakama, que foi um líder que se impôs no partido, a tal ponto que a RENAMO passou a ser Dhlakama e Dhlakama passou a ser a RENAMO.
Apesar de todos os problemas de má gestão, Dhlakama era um líder que conseguia mobilizar todo o eleitorado da RENAMO (e até de fora do partido) com um certo carisma, algo que Ossufo Momade não tem. Quem olhar para as teorias de liderança dirá que Ossufo Momade não tinha um grande capital político para substituir um líder carismático dentro da própria RENAMO. Para além disso, Ossufo Momade teve oportunidade de entrar na gestão partidária quando foi secretário-geral, mas não se conhece nenhum feito político relevante, ou extremamente valioso, que lhe desse pujança ou capital político para poder substituir Afonso Dhlakama.
DW África: Portanto, isso vai fazer com que a RENAMO entre na corrida eleitoral já fragilizada?
CC: Exacto. Esse é outro prejuízo político que a RENAMO vai ter nesta situação. Não tenho informações precisas para dizer se o Sr. Ossufo Momade se foi recensear ou não - espero bem que se tenha recenseado… Mas sei que, neste momento, ele ainda nem sequer apresentou a candidatura pessoal para participar no processo eleitoral.
Quanto tempo precisará para apresentar a candidatura eleitoral? Quanto tempo precisará para preparar essa candidatura, com toda esta tensão que está a ocorrer agora? É verdade que o secretário-geral e o partido podem fazer a máquina andar, mas esta incerteza joga a desfavor do Sr. Ossufo Momade. Para agravar a situação, o Sr. Ossufo Momade não é alguém conhecido no mapa político moçambicano. Joga a seu desfavor o facto de as eleições presidenciais não serem na base de uma lista de um partido, como acontece, por exemplo, nas eleições autárquicas. Então, precisa de se fazer conhecer no mapa político moçambicano. E só tem dois ou três meses para fazer isso, até chegarmos às eleições.