ONU envia missão a São Tomé e Príncipe após morte de detidos
3 de dezembro de 2022Uma missão do Alto Comissariado para os Direitos Humanos da ONU chega na próxima semana a São Tomé e Príncipe, na sequência de maus-tratos e morte de quatro detidos sob custódia dos militares, disse à agência de notícias Lusa fonte diplomática.
A missão das Nações Unidas, adiantou a mesma fonte, pretende verificar os "acontecimentos trágicos" que se seguiram ao assalto ao quartel-general das Forças Armadas são-tomenses, ocorrido na madrugada de 25 de novembro, "com fortes indícios de violações [dos direitos humanos] com base nas imagens de maus-tratos que poderão estar na base da morte de quatro detidos sob custódia dos militares".
Quatro pessoas morreram e cerca de 20, incluindo 12 militares, foram detidas na sexta-feira passada, após um assalto ao quartel-general militar, feito por quatro civis e alegadamente com cúmplices no interior das instalações. O ataque foi classificado pelas autoridades são-tomenses como "uma tentativa de golpe de Estado" e condenado pela comunidade internacional.
Ao início da manhã de dia 25, o primeiro-ministro são-tomense, Patrice Trovoada, garantiu que o ataque tinha sido "neutralizado" e que a situação estava "calma" e "controlada", mas soube-se horas depois que três dos atacantes morreram, bem como Arlécio Costa, que foi detido pelos militares em casa e que foi alegadamente identificado como um dos mandantes do ataque.
Imagens de maus-tratos
Esta quarta-feira foram disseminados vídeos que mostram um detido -- que viria a morrer --, deitado no chão, ensanguentado e com as mãos amarradas atrás das costas, a ser agredido por um militar com um pau, enquanto vários outros militares assistiam. Outras imagens mostram detidos deitados ou ajoelhados no terreiro do quartel, com as mãos amarradas e com ferimentos.
No próprio dia do ataque e nos dias seguintes já tinham sido divulgadas imagens dos homens com marcas de agressão, ensanguentados e com as mãos amarradas atrás das costas, ainda com vida, e também já na morgue.
Esta semana, organizações da sociedade civil pediram uma reunião com as Nações Unidas no país para apelar que os 12 militares detidos sejam "devolvidos" à cadeia, afirmando que estes foram levados para o quartel-general e estão sem acesso às famílias ou advogados.
O inspetor-geral das Forças Armadas, coronel Sebastião Andreza, disse à Lusa que quatro militares foram sujeitos a processos disciplinares por causa dos vídeos, mas que as investigações internas continuam a decorrer. Sobre as averiguações sobre os maus-tratos infligidos aos detidos, o coronel disse igualmente que continuam em curso, sem mais pormenores.
Nova liderança nas Forças Armadas
O chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, Olinto Paquete, pediu esta quinta-feira a demissão, depois de se ter desculpado por ter prestado "informações falsas" à nação. Dois dias após o ataque, o brigadeiro tinha justificado as mortes dos três atacantes com ferimentos causadas por uma explosão e a de Arlécio Costa por se ter "atirado da viatura".
Na sequência da divulgação dos vídeos, o Governo são-tomense fez esta quinta-feira uma denúncia ao Ministério Público para que investigue a "violência e tratamento desumano" de militares contra detidos após o ataque ao quartel-general das Forças Armadas. Após uma reunião extraordinária do Conselho Superior de Defesa Nacional, também o Presidente da República são-tomense, Carlos Vila Nova, defendeu que todos os atos ocorridos após o ataque ao quartel militar do Morro "devem ser cabalmente investigados e os culpados responsabilizados".
Esta sexta-feira, o chefe de Estado nomeou o coronel João Pedro Cravid como o novo chefe de Estado-Maior das Forças Armadas de São Tomé e Príncipe. Cravid, que exerceu a função de juiz do Supremo Tribunal Militar, frequentou o Palácio do Povo durante 10 anos, onde trabalhou como ajudante de campo do ex-Presidente da República Miguel Trovoada.