O Sudão ainda está no caminho da democracia?
6 de janeiro de 2022Em outubro, um golpe militar levou o primeiro-ministro sudanês Abdalla Hamdok a fazer um acordo com as forças de segurança que indignou a população. Após um fim-de-semana de protestos em massa, Hamdok acabou por anunciar a sua demissão, no domingo passado (02.01).
A decisão de Abdalla Hamdok gerou opiniões polarizadas. Por um lado, há quem pense que a demissão simboliza o final da transição para um governo democrático no Sudão. Os militares podem tomar o poder através da força, apontando um novo primeiro-ministro escolhido por eles.
Esta quarta-feira, a chamada 'troika' do Sudão, composta pelos Estados Unidos da América, Reino Unido e Noruega, e a União Europeia (UE), avisaram os governadores militares de Cartum que não devem nomear um primeiro-ministro de forma autocrática.
Hamdok "não tinha escolha"
Na opinião de Christine-Felice Röhrs, diretora da fundação alemã Friedrich-Ebert no Sudão, as coisas só podiam ter ocorrido desta maneira. "Hamdok já não tinha escolha, isso tem de ser dito", afirma Röhrs.
O antigo primeiro-ministro quis candidatar-se para prevenir mais derrames de sangue resultantes dos confrontos entre os protestantes e as forças de segurança.
Na opinião da diretora, Hamdok falhou nestas pretensões, tendo em conta que 57 pessoas morreram durante os protestos nas últimas semanas, duas delas no domingo passado.
Manifestantes unificados?
Há também quem veja a demissão do primeiro-ministro como uma maneira de unificar as diversas frentes pró-democráticas.
Na opinião de Fatima, uma residente de Cartum que não quis dizer o seu nome completo por não ser representante de nenhum movimento democrático, antes da demissão, "os civis estavam muito divididos".
Entre os pró-democratas, havia quem dissesse que Hamdok "não poderia ser apoiado porque aceitou este acordo político terrível", enquanto outros defendiam que este "deveria ser apoiado porque pode reparar alguns estragos por dentro", explica Fatima.
Para esta residente, a situação "era um conflito enorme, agora que ele foi embora é mais fácil".
Jihad Mashamoun, investigador sudanês e analista político no Reino Unido, também está otimista: "Penso que Hamdok nos fez um favor ao demitir-se, porque expôs o papel dos militares à comunidade internacional".
Futuro incerto
Se há algo com que todos concordam é que é difícil prever o que vai acontecer. Há muitos rumores e interpretações da situação. Há quem diga que as eleições deviam acontecer mais cedo e outros estão preocupados que o novo primeiro-ministro seja escolhido unilateralmente pelos militares.
No entanto, caso isto aconteça, daria nova força aos protestantes o que mergulharia o país noutro fervor revolucionário e, potencialmente, em mais violência.
A UE, os Estados Unidos, Reino Unido e Noruega avisaram esta quarta-feira que não iriam apoiar um governo eleito sem intervenção civil e que os apoios económicos ao Sudão estão dependentes dessa decisão.