Novo livro de Pepetela faz críticas à política africana
19 de setembro de 2018O escritor Artur Pestana Pepetela lançou na noite desta terça-feira (18.09), em Luanda, o seu mais recente romance, após anos de distanciamento. Em "Sua Excelência, de Corpo Presente", Pepetela retrata uma história atual, que poderia se passar em qualquer país africano, de acordo com o próprio autor.
Trata-se de um protagonista e narrador com nome desconhecido, mas que se sabe que foi Presidente de um país de África e que teve morte súbita, atingido por uma "maldita doença que apanhou a todos desprevenidos".
"'Sua Excelência', porque nós aqui abusamos muito de ‘sua excelência'. Depois da independência, todos eram 'camaradas', até um ladrão era 'camarada ladrão'. Até há pouco tempo, tudo era ‘Sua Excelência'. O corpo presente diz-se de alguém que está morto, no caixão, com as pessoas a passarem, a fazerem a vigília e a prestar homenagem", explicou o escritor durante a apresentação do romance na capital angolana.
A obra foi lançada 24 horas depois dos festejos do 96º aniversário natalício de António Agostinho Neto. Segundo Pepetela, a sua nova obra retrata a situação crítica das lideranças africanas, com forte inclinação para a perpetuação no poder.
Pepetela disse que "nos anos 80 e 90, começou a aparecer o multipartidarismo, embora com um partido dominante, no caso dos países que tiveram guerra pela independência". "Todos eles tinham de chegar ao multipartidarismo”, continuou o autor, dizendo que "as oposições eram muito fracas, e nalguns casos ainda são muito fracas".
Futuro para África
Esperançoso num futuro melhor para África, o autor reconhece que o continente berço tem estado a dar passos significativos para a pacificação efetiva, mas ainda precisa de um elemento para fechar o velho ciclo.
"De alguns anos para cá, passou a haver um novo ciclo de maior preocupação com a governação, maior preocupação em se cumprir as Constituições, e ultimamente o que eu noto com esperança é que no continente africano há menos guerra do que nunca. Ainda há guerra, claro. Mas há menos guerra. No entanto, parece-me que este ciclo, que começa a ser generalizado, precisa de qualquer coisa para fechar. E por minha parte, modestamente é este livro".
"É por esta razão", explicou o escritor, "que eu quis situar a ação do livro e dos personagens muito mais a nível do continente do que propriamente do país [Angola]".
Críticas
Várias figuras da política e da sociedade civil angolana estiveram no evento desta terça-feira à noite em Luanda. No entanto, o Ministério da Cultura não se fez representar, o que mereceu críticas da ativista cívica Alexandra Simeão.
Ela afirmou que "sempre que um autor angolano faz uma obra, nós ficamos mais ricos. Lamento mais uma vez, não vi aqui institucionalmente o Ministério da Cultura, tive pena. Vão a tantos sítios que, se calhar, são menos importantes. Não pode".
Relevância
Presente no evento, o jovem Fernando Cawendimba não quis perder a oportunidade de se deliciar com o novo romance de Pepetela, por conhecer a importância da leitura e a relevância do autor.
"O título que ele traz é muito sugestivo, o personagem principal é um líder africano, e tinha sido caracterizado como ditador, praticamente, e vai abordar estas questões de liderança em África, a questão do nepotismo, a questão da poligamia, a corrupção, esta obsessão de perdurar no poder, são questões que a mim interessam, para saber como é que Pepetela aborda em forma de romance".
O jovem leitor lembra que o angolanos "acabaram de acompanhar uma mudança de liderança no país, e a anterior durou mais de 30 anos. Denúncias e evidências de corrupção nós também ouvimos na nossa realidade".
Os cerca de 300 exemplares do romance lançados em Luanda esgotaram em menos de 15 minutos, tendo havido centenas de leitores que saíram do local sem a obra. Artur Pestana Pepetela, que já exerceu cargos políticos em Angola, entre 1975 e 1982, é autor de 14 obras, com destaque para "Geração de Utopia", "Maiombe" e "Lueji".