Angola poderá beneficiar de experiência portuguesa
22 de março de 2018Angola deve continuar a desenvolver mecanismos para consolidar a prevenção contra os crimes económicos como o branqueamento de capitais. Face aos riscos, compete às autoridades angolanas apostar no acesso a novas tecnologias e na formação ética dos quadros ligados a organizações e estruturas de supervisão. A recomendação é de alguns peritos ouvidos pela DW África, à margem da segunda conferência internacional sobre prevenção e deteção do branqueamento, que decorreu na quarta-feira (21.03) no Instituto Universitário de Lisboa.
O debate sobre o tema branqueamento de capitais acontece numa altura em que decorre em Portugal o julgamento da Operação Fizz, que envolve, entre outros, o ex-procurador português, Orlando Figueira, e o ex-vice Presidente de Angola, Manuel Vicente, acusados dos crimes de corrupção e branqueamento de capitais.
Contexto angolano
Esta realidade não se impõe apenas a Angola, mas a qualquer outro país de África ou da União Europeia. Segundo Miguel Trindade Rocha, presidente do Observatório Português de Compliance e Regulatório, é necessário agora passar para outro paradigma para que os angolanos possam ver na prática a aplicação da legislação em vigor.
Miguel Rocha destaca ainda a importância de criar condições para que a maior parte possível do capital desviado retorne a Angola e seja direcionado para investimentos no país. "Se não houver esse trabalho de sensibilização e trabalho conjunto, é natural que os detentores desse capital escolham não repatriar na totalidade ou no montante que poderiam repatriar, caso sejam garantidas as condições de investimento", explica.
Portugal e Angola mantêm uma colaboração nesta matéria e pretendem lançar um desafio aos parceiros do Observatório Português de Compliance e Regulatório para a realização de iniciativas visando o intercâmbio de experiências entre portugueses e quadros dos países africanos de língua portuguesa. "É com este tipo de interação, de partilha de experiências, que todos temos a ganhar. Nós temos a ganhar com os angolanos e os angolanos têm a ganhar com os portugueses", afirma Miguel Rocha.
Impedir novos casos de branqueamento
Muitos dos fluxos financeiros passaram pelo sistema bancário angolano e português. E, até por uma questão de defesa da reputação, importa saber como impedir ou prevenir novos casos de branqueamento de capitais.
Paulo Figueiredo, administrador executivo do Banco BIG, cuja uma pequena percentagem das ações pertence a capital angolano, afirma que é preciso colocar um acento tónico na formação das entidades públicas envolvidas no combate deste tipo de criminalidade, uma vez que a capacitação, baseada na ética e na competência, é “absolutamente essencial”.
Especialistas defendem também a supervisão preventiva. Segundo Filipe Alves, diretor de "O Jornal Económico”, que tem publicado artigos sobre as mudanças em Angola, afirma que a adoção da nova diretiva europeia implica um fardo burocrático para os bancos e entidades financeiras, mas reconhece a importância da implementação. "É também uma oportunidade de fazer uma melhor seleção dos clientes, até de conhecer os próprios colaboradores”, ressalta.
Uma prática que o setor financeiro português deve levar para além da União Europeia. "E toda essa experiência, que o setor financeiro português está a ter e que foi aqui debatida, permitirá também tirar conclusões para outros países, como é o caso de Angola, país com quem nós temos uma forte ligação, uma forte interação entre os agentes económicos”, diz Filipe Alves.
Não basta a regulamentação
Luis Leitão, diretor da revista Forbes Portugal, afirma que o cenário atual não é uma particularidade de Angola, Moçambique ou de Portugal, mas do mundo todo. "É [preciso] criar mecanismos para que todos consigam competir no mesmo plano. E é nesse sentido que existe um conjunto de leis, quer nacionais quer mundiais, para cada vez mais apertar o ciclo, de forma a que todos possam concorrer equiparadamente”, explica.
Na perspetiva de Luís Leitão, para combater os crimes de branqueamento não basta a regulamentação. "É preciso igualmente uma justiça forte e isso só se consegue com um Estado forte e sólido, que crie leis mais apertadas e mais sérias, para que as pessoas implicadas sejam verdadeiramente condenadas”.