Namíbia: Eleições expõem divergências na SWAPO
26 de novembro de 2019As eleições presidenciais desta quarta-feira (26.11) na Namíbia deverão "marcar" a política do país, considera o analista Ndumba Kamwanyah. Isto porque trouxeram um desafio ao atual Presidente Hage Geingob: o surgimento de um candidato independente dentro das fileiras da Organização do Povo do Sudoeste Africano (SWAPO), partido no poder.
Dentista de profissão, Panduleni Itula, de 62 anos, é apontado como o principal rival de Geingob. Recusou-se a renunciar à militância no partido SWAPO, apesar das ameaças de que poderia ser expulso.
A SWAPO está no poder desde a independência do país, em 1990. Mas, recentemente, foi abalada por grandes escândalos de corrupção que obrigaram à demissão de dois ministros. A agravar a situação está a actual crise económica do país, que conduziu a um aumento do descontentamento entre a população, especialmente entre os jovens, 46% dos quais estão desempregados.
Em entrevista à DW, Ndumba Kamwanyah, professor académico da Universidade da Namíbia, afirma que a crise pode ser apontada como a principal responsável pelo surgimento de duas facções dentro da SWAPO. "Embora não seja dito, pensamos que uma das facções está por trás do candidato independente [Panduleni Itula]", disse.
Oposição fraca
Ainda assim, consideram vários analistas, o partido no poder não corre o risco de perder as eleições gerais. Mas, diz Henning Melber, do Nordic Africa Institute, na Suécia, "pode obter menos votos".
Na última eleição, em 2014, a SWAPO obteve 80% dos votos, a sua maior percentagem de sempre, enquanto Geingob foi eleito Presidente com 87% dos votos. Agora, "todos concordam que arrecadará muito menos [votos]. Pela primeira vez desde a independência, é provável que o Presidente obtenha menos votos do que o seu partido", disse Melber à DW.
O descontentamento com a situação atual do país alimentou o apoio a Panduleni Itula, que poderá assim conseguir votos, tanto da oposição, como dos membros da SWAPO descontentes com Geingob. Itula acaba por assumir um papel que deveria, por direito, pertencer à oposição. "Esse é o principal problema: temos uma oposição muito fraca", disse Kamwanyah.
À DW, Henning Melber explica que a inexistência de um candidato forte nos partidos da oposição pode ser explicada por vários motivos. Entre eles estão a falta de fundos e a dificuldade dos partidos mais pequenos em fazer campanha num país tão vasto. Mas, acrescenta, a principal razão está relacionada com aspetos históricos.
"Acho que a SWAPO foi um caso historicamente único, porque foi reconhecida pelas Nações Unidas em meados dos anos 70 como a única e autêntica representante do povo namibiano", disse o analista Melber. Assim, a SWAPO ganhou um "monopólio sobre a cultura política do país", que usou para espalhar a noção de que "a SWAPO é a nação e a nação é a SWAPO", explicou Melber.
Crise que tem de ser resolvida
Os candidatos dos partidos da oposição têm poucas ou nenhumas hipóteses de progredir. McHenry Venaani, do Movimento Popular Democrático (PDM), não deverá conseguir mais do que cinco por cento dos votos obtidos nas eleições de 2014. Um dos focos da sua campanha foi a crise económica em que se encontra o país e que é resultante, segundo ele, da seca e alterações climáticas, mas também da má gestão e corrupção.
Por seu lado, o Movimento dos Sem Terra, liderado por Bernadus Swartbooi, concentrou-se na expropriação das terras neste país, que tem uma das mais altas taxas de desigualdade do mundo. Até hoje, aproximadamente 70 por cento das terras agrícolas da Namíbia são propriedade de brancos. Os cidadãos negros ou de cor socialmente desfavorecidos possuem apenas 16 por cento.
Primeira candidata feminina às presidenciais
A eleição desta quarta-feira (27.11) tem outra estreia: uma mulher no boletim de voto. Esther Muinjangue é membro da etnia Herero e uma das principais personalidades que têm lutado por uma indemnização para o país por causa do massacre aos povos Herero e Nama perpetrado pelas tropas alemãs, durante o domínio colonial, em 1904-08. Durante a campanha para as presidenciais, Esther Muijangue denunciou também a corrupção e o clientelismo do regime.
Com uma população de 2,45 milhões de habitantes, a Namíbia é um dos países mais ricos da África, no entanto, a sua riqueza não está espelhada na vida da população em geral. E, segundo Henning Melber, o cenário não deverá mudar. "O futuro imediato das pessoas comuns parece bastante sombrio. O facto de a SWAPO ser reeleita é basicamente o resultado de não haver praticamente nenhuma outra opção".