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Moçambique: Mais protestos "poderão trazer efeito reverso"

9 de novembro de 2024

O politólogo Fidel Terenciano considera que mais protestos podem ser danosos para Moçambique. Em entrevista à DW, diz que Mondlane conseguiu mostrar ao Governo que tem de estar no centro das negociações pós-eleitorais.

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Manifestante protesta em Maputo, no dia 7 de novembro de 2024
Os tumultos das últimas semanas em Moçambique fizeram cerca de quatro dezenas de mortos em todo o paísFoto: Siphiwe Sibeko/REUTERS

O Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, recebeu, na sexta-feira (08.11), o líder espiritual de Venâncio Mondlane, suscitando a esperança de que um diálogo para pôr fim à crise política possa estar a ser traçado.

Mas para Fidel Terenciano, o encontro com o apóstolo Luís Fole da Igreja Ministério Divina Esperança não significa a possibilidade de um diálogo, mas sim a permissão de acesso ao olimpo do poder.

O politólogo vê o facto como o reconhecimento da relevância política do candidato presidencial.

DW África: Este encontro de Venâncio Mondlane com o seu líder espiritual pode significar o início do fim da crise política em Moçambique?

Fidel Terenciano (FT): Penso que não significa necessariamente o início da abertura de um tipo do diálogo, mas significa essencialmente que, a partir deste momento, Venâncio Mondlane como pessoa e não como instituição já é reconhecido pelas estruturas do Estado moçambicano, particularmente o Presidente da República, como um ator que, de alguma maneira, deve participar no processo de construção da democracia, mas também do nosso desenvolvimento político como nação. Esse encontro também simboliza a ideia de que os religiosos neste país desempenham um papel estratégico no processo de mobilização dos atores políticos para encontrar algum acordo. 

Apoiantes do partido PODEMOS percorrem as ruas de Maputo, Moçambique, no dia 7 de novembro de 2024
Os protestos foram convocados por Venâncio Mondlane, candidato da oposição que ficou em segundo lugar na corrida à Presidência de MoçambiqueFoto: ALFREDO ZUNIGA/AFP

Mas não me passa pela cabeça que seja um acordo que tem de se encontrar antes da tomada de posse do próximo Presidente. Nesse caso, deveria acontecer no dia 15 de janeiro 2025. O que pode acontecer é que poderão começar a criar-se as condições, os momentos, as etapas e os pontos essenciais para esse diálogo, que quem vai levar avante vai ser o próximo Presidente da República que eu acho que vai ser o Daniel Francisco Chapo.

DW África: As armas estão de repouso neste momento. Que tipo de ações tem de ser preparadas nesta fase de trégua?

FT: Penso que já é o momento de começarmos a mobilizar-nos como sociedade para termos uma plataforma de diálogo que extravasa os próprios partidos políticos e o próprio Governo. Eu penso que Moçambique nunca teve esse tipo de plataforma.

DW África: Esses mesmos setores a que se refere têm estado a mostrar-se predispostos a fazerem parte desse diálogo, não só com pronunciamentos, mas com ações que têm estado a levar a cabo. Concorda?

FT: Sim, eles têm-se mostrado dispostos para o efeito, mas em Moçambiquehá uma particularidade: as coisas não dependem daquilo que é o normal e o genuíno. Dependem particularmente dos maus interesses dos membros do partido político, neste caso a FRELIMO, e essencialmente aqueles que entendem que participaram na luta de libertação [acham que são eles] quem devem determinar quando começar o diálogo, o que tem que se dialogar, quem deve participar no diálogo e quais são os resultados previstos que devem ser alcançados. Mais uma vez o país ressente-se dos interesses, das amarras, das vontades e das decisões dos libertadores desta pátria.

Ruas da capital de Moçambique, Maputo, no dia 9 de novembro de 2024
A capital moçambicana, Maputo, amanheceu tranquila neste sábado (09.11)Foto: Amos Zacarias/DW

DW África: Os protestos vão continuar. Antevê alguma intransigência no país?

FT: A marcha de ontem [quinta-feira], que foi nacional, mas com maior incidência em Maputo, mostrou-nos que esta tinha de ser a última fase. A probabilidade de as pessoas não irem às próximas marchas e de as marchas ganharem outros contornos, como invasões, roubos, e pilhagens, é maior. O PODEMOS e o candidato Venâncio Mondlane já têm dados mais que suficientes que ilustram que eles são atores relevantes nesta nação e que eles devem ser tidos em consideração no processo de tomada de decisão e, em particularmente, que sejam decisões mais inclusivas e que permitam que os outros atores, que não foram beligerantes, possam participar em pé de igualdade para sugerir os melhores caminhos que a nação pode trilhar.

Estas manifestações continuando, significa, essencialmente, mais uma vez, que o PODEMOS e o candidato Venâncio Mondlane começam a autodesgastar-se, porque já surtiram o efeito necessário, o efeito cascata, que pretendia chamar a atenção do Governo de que existem outros atores relevantes que devem ser incluídos. A continuar estas marchas, na minha opinião, estaríamos a esvaziar aquilo que conseguimos, como a chamada de atenção, e começaríamos a sujar o país junto das entidades internacionais, que têm particularmente contribuído com grandes recursos para a estabilidade da nação, seja financeiramente, seja socialmente, seja politicamente. Novas marchas poderão trazer um efeito reverso.

RADAR DW: Crise pós-eleitoral em Moçambique

Nádia Issufo
Nádia Issufo Jornalista da DW África