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Moçambique: Madgermanes mais perto de indemnizações?

António Cascais
13 de julho de 2023

No parlamento alemão levantam-se vozes que defendem o pagamento de indemnizações aos "madgermanes", os antigos trabalhadores moçambicanos na ex-Alemanha do Leste. Estará dado o primeiro passo para se fazer justiça?

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Marcha de pritecto dos madgermanes em Maputo
Foto: picture-alliance/dpa/G. Fioster

Há décadas que os chamados madgermanes lutam sem sucesso pelo reconhecimento das injustiças de que foram vítimas. 
A história remonta a fevereiro de 1979, quando a República Democrática Alemã (RDA) e Moçambique assinaram um tratado sobre o envio de trabalhadores moçambicanos para o que era então a Alemanha comunista. Na sequência, cerca de 20.000 trabalhadores contratados rumaram em direção à RDA, para trabalhar em fábricas e executar sobretudo trabalhos que os alemães rejeitavam. Auferiam apenas uma parte dos salários acordados, sob promessa que lhes seria pago o resto depois do regresso a Moçambique. 
O que nunca aconteceu. De regresso ao país, os fundos prometidos foram retidos por instâncias governamentais, até hoje. 
Muitos madgermanes também se queixam que foram vítimas de discriminação, racismo e segregação na RDA dos anos 80. Um golpe adicional a aparar foi o seu regresso forçado a Moçambique após a reunificação alemã em 1990. De um dia para o outro passaram a indesejáveis.

Parlamento alemão
No parlamento alemão há quem defenda o pagamento de indemnizações aos madgermanes Foto: Abdulhamid Hosbas/AA/picture alliance

Um assunto que diz respeito à Alemanha de hoje

Hoje, a maioria dos antigos trabalhadores destacados já alcançou a casa dos 60. Alguns morreram sem nunca ver reconhecidos os seus direitos e as injustiças de que foram vítimas.
Mas agora, finalmente, parece haver uma certa abertura por parte do parlamento alemão, Bundestag, para apoiar os madgermanes. Evelyn Zupke, a encarregada do parlamentar para as vítimas do partido governamental único na RDA, o SED, acaba de lançar uma iniciativa que visa pressionar o Governo de Berlim a indemnizar os antigos trabalhadores moçambicanos. 
"Fui à Comissão dos Direitos Humanos do Parlamento alemão e expliquei a situação dos madgermanes. Disse-lhes que esses trabalhadores estão a passar por maus momentos, e muitos dos deputados ficaram surpreendidos", disse Zupke à DW África. "Disse-lhes que este não é um assunto interno de Moçambique, mas sim um assunto que diz respeito também à Alemanha, e que a Alemanha tem responsabilidades históricas", acrescentou.

Evelyn Zupke
A encarregada parlamentar Evelyn ZupkeFoto: Michael Kappeler/dpa/picture alliance

Em Moçambique a luta continua

Zupke conta que parlamentares de todos os partidos reconheceram as injustiças sofridas pelos madgermanes. Os deputados concordaram que deve ser paga uma compensação financeira aos lesados, como forma de atenuar os danos provocados pelos dois regimes de então. 
Segundo Zupke, cabe agora aos Governo de Berlim, nomeadamente ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, e aos parlamentares, tomar medidas céleres neste sentido. A encarregada para os assuntos das vítimas do regime comunista alemão promete insistir, caso não seja apresentada em breve qualquer proposta concreta.

Arnaldo Mendes líder dos madgermanes
Imagem de arquivo de Arnaldo MendesFoto: DW/Romeu da Silva

Em Moçambique, os madgermanes receberam a notícia com um misto de ceticismo e esperança, diz Arnaldo Mendes, um dos ex-trabalhadores que se manifestam há décadas, todas as quartas-feiras, no Jardim 28 de Maio, em Maputo, hoje mais conhecido por "jardim dos madgermanes".
"Tínhamos a espectativa que o nosso problema fosse reconhecido na Alemanha e que o Governo na Alemanha assumisse parte da responsabilidade. Qualquer iniciativa nesse sentido é bem-vinda", disse Mendes à DW África. 
A luta dos madgermanes não vai esmorecer, garante: "Nós percebemos que fomos vítimas de um grande engano. Fomos enganados pelos governos. Eles têm que assumir responsabilidades e chegar a uma solução que satisfaça todas as partes".

Protesto de madgermanes
Há décadas que os madgermanes protestam todas as quartas-feiras em MaputoFoto: Ismael Miquidade

‘Esqueceram-se das pessoas’

A encarregada parlamentar Zupke concorda que cabe à Alemanha de hoje uma parte da responsabilidade pelo que aconteceu aos madgermanes. Na altura, diz, foram assinados contratos pensados para beneficiar os dois países. "Mas esqueceram-se das pessoas. As pessoas não contavam, eram apenas mercadoria. O regime moçambicano vendeu os seus filhos, por assim dizer, para pagar a dívida que tinha para com a Alemanha do Leste. E a RDA aproveitou-se descaradamente do facto. Burlaram os trabalhadores de forma premeditada. Para além disso, não trataram bem os trabalhadores moçambicanos."
Será este, finalmente, o passo que faltava para dar resposta aos anseios dos madgermanes? Em Maputo, no Jardim 28 de Maio, a esperança ganhou um pouco mais de força.