Moçambique: Um ano após a tragédia na campanha de Nyusi
11 de setembro de 2020Os familiares das vítimas da tragédia de 11 de setembro de 2019, que causou uma dezena de mortes e mais de meia centena de feridos, na cidade de Nampula, queixam-se de abandono e falta de assistência por parte da direção da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO).
Rufino Luanda, de 25 anos, perdeu a sua mãe durante a tragédia. O jovem conta que, fora o apoio para as cerimónias fúnebres, o partido, do qual a sua mãe era membro, nunca mais se dignou em prestar outros apoios.
"A minha mãe deixou oito filhos, dos quais eu sou crescido. Eles tinham dito que estariam juntos a nos assistir, pelo menos as crianças na educação até ao nível secundário. Não vi nenhum apoio e muito menos fomos consolados [depois de terminar as cerimonias fúnebres]", diz.
Investigação
Após o incidente, o primeiro secretário do Comité Provincial da FRELIMO encorajou as autoridades a esclarecerem o caso. Dias depois, criou-se para o efeito uma comissão de inquérito, liderada pelo Ministério do Interior. No entanto, até ao momento, não há notícia sobre as atividades desenvolvidas pela comissão.
Rufino Luanda, que vive de biscates, conta que a morte da mãe o forçou a assumir a guarda dos seus irmãos menores e que está sem condições para seguir em frente. Enquanto não chegam apoios, Rufino quer que, pelo menos, se esclareça os contornos da tragédia e se responsabilize os autores.
"Estamos há um ano, e o que mais me doi é que diziam que haviam de fazer uma investigação, mas não há resultados. Agora não sei de quem é a responsabilidade, mas eu acredito que a cerimónia já passava de partidária até o Estado poderia pronunciar-se. Agora nem do inquérito não ouvimos, nem da responsabilização e nem do apoio material", lamenta.
Assunto resolvido para a FRELIMO
Entretanto, o porta-voz da FRELIMO, Caifadine Manasse, não explica em concreto se, além das cerimónias fúnebres, o partido apoiou ou não as famílias e se continua interessado em saber dos culpados e a sua responsabilização.
"Aconteceu sim, com a ida do Presidente [na campanha eleitoral], e todo acompanhamento foi feito. Realizou-se, a rigor, as cerimónias fúnebres, o partido esteve lá e participou ativamente. Isso é o que aconteceu com a família FRELIMO e o assunto foi resolvido e fez-se tudo. Não é um assunto para problematizar", afirma.
A DW contactou o porta-voz da polícia moçambicana na província de Nampula, Zacarias Nacute, para saber o estágio atual da investigação. Nacute disse que "o assunto está sob alçada do Ministério (do Interior), já não está sob alçada do Comando Provincial [da Polícia]". "O ministério é que tomou as rédeas do caso", garantiu.
A DW África também procurou o porta-voz do Comando-Geral da Polícia da República de Moçambique, Orlando Mudumane, que se mostrou indisponível a falar até ao fecho desta reportagem.
O que diz a lei?
Por seu turno, o jurista Bogaio Nancalaza entende que a FRELIMO pode não ser responsabilizada criminalmente, porque o Código Civil não responsabiliza a pessoa coletiva.
Nancalaza defende a investigação por parte do Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC), para a identificação do autor da tragédia e responsabilização.
"Por outro lado”, explica o jurista: "temos a responsabilidade civil, a pessoa teve danos e prejuízos, neste caso a pessoa coletiva responde civilmente atos praticados por seus titulares".