Líder do MDM: Moçambicanos têm de resolver os seus problemas
11 de julho de 2016O maior partido da oposição, a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) exigiu, como condição para recomeçar as negociações com o Governo, a presença de mediadores internacionais e sugeriu a União Europeia e a Igreja Católica, entretanto convidadas formalmente. O líder da RENAMO, Afonso Dhlakama, anunciou que os mediadores deveriam chegar à capital moçambicana esta semana. Daviz Simango, líder da segunda maior força da oposição, diz, porém, que a solução para a tensão política tem de ser encontrada a nível interno.
Em Moçambique as forças políticas e a sociedade exigem ainda a descentralização do poder, uma das causas da crise política. Para Simango, há perspetivas divergentes sobre o conceito. A DW África, em Bona, entrevistou Daviz Simango sobre a situação política e económica do país.
DW África: Como o MDM se posiciona no caso da crise política e como está a contribuir para o seu fim, na qualidade de partido com assento no Parlamento?
Daviz Simango (DS): Tentamos convencer as duas partes, quer a partir da Assembleia da República, quer nos encontros que temos tido [com o Governo da FRELIMO e a RENAMO] no sentido de compreenderem, primeiro, que o futuro do país não pode depender de duas forças políticas. Essas duas forças fizeram a sua história, contribuíram para o desenvolvimento do país e para a construção da sociedade moçambicana, mas, neste momento, o mundo é dinâmico e é preciso envolver as outras forças políticas e também a sociedade civil no processo do diálogo moçambicano. E é preciso compreender que em Moçambique temos cerca de 24 milhões de habitantes, os eleitores são cerca de dez milhões, mas os que votaram foram apenas quatro milhões. Portanto, pessoas que elegeram o Governo e os políticos são uma minoria em relação a toda população, que está a ser excluída do processo de diálogo.
DW África: Falou sobre uma maior autonomia na questão dos governadores. A RENAMO também exige o fim da centralização do poder e, recentemente, o Presidente Filipe Nyusi manifestou a intenção de iniciar a descentralização em Moçambique. Todos falam da descentralização como um termo cujo significado vos é comum ou têm perspetivas diferentes de um mesmo conceito?
DS: Penso que há perspetivas diferentes de conceitos diferentes. O que está a acontecer é que, enquanto o Governo fala da descentralização gradual, o MDM diz que não pode haver gradualismo, vamos avançar na descentralização efetiva, em todo o território nacional. É natural que haverá espaços vazios, e esses vão ter um tratamento especial. Já a RENAMO fala em autarquias provinciais, de conselhos provinciais, o MDM não fala disso. O que a RENAMO quer é que nas autarquias provinciais haja um governador, um presidente da autarquia provincial e que tenha um presidente do município. É muita gente para um país pobre, é muita confusão de fronteiras de exercício de funções.
O que nós queremos, de facto, é que o governador seja eleito de duas maneiras: [como] cabeça de lista ou eleito de forma direta. E o MDM também quer as autarquias locais, porque se é um problema de poder e economia, se nós mapearmos todo o país onde a sociedade civil, os políticos e partidos possam concorrer a essas eleições municipais, estaremos a evitar os riscos. Mesmo lá em Satundjira, Maringué, Inhambane, em Gaza, seja lá onde for, cada um terá o seu território para gerir.
DW África: E como se pode fazer essa redução? O MDM, como partido político com assento parlamentar, pode solicitar uma mudança de regime de governação em Moçambique?
DS: Neste momento, não pode porque o MDM não tem os dois terços [necessários para isso], depende dos outros pares. Então, este é um exercício que tem de ser feito na base de compreensão mútua. Porque se o problema da guerra e do desentendimento entre os moçambicanos é um problema político e económico, então vamos talhar o país para permitir o exercício do poder político e a partir daí o poder económico, porque todos os recursos estarão lá, nas autarquias e ao nível dos governos provinciais.
DW África: Uma nova fase na negociação com vista a por fim à crise política em Moçambique deve começar em breve, com a participação de mediadores estrangeiros. Quais são as suas expetativas em relação a este assunto?
DS: Os mediadores não vão resolver o problema moçambicano. Se calhar vão trazer as suas habilidades para tentar convencer as partes a viverem num estado civilizado. Moçambique hoje não vive um estado civilizado, é sobre isso que os mediadores podem persuadir as partes. Mas quem tem de resolver os problemas dos moçambicanos são os moçambicanos. Nesse diálogo têm de estar as outras partes da sociedade moçambicana, os outros partidos políticos devem estar.
Não podemos continuar a pensar que os dois partidos políticos devem representar os interesses nacionais. Tanto mais que os dois partidos políticos têm uma cifra pequena em termos de eleitores no meio de 24 milhões de habitantes. Esses dois partidos podem representar, no máximo, quatro milhões de moçambicanos, e os outros vinte milhões como ficam excluídos de um processo desses?
Não estamos contra os mediadores ou contra os observadores, tanto mais que nem uma, nem outra parte sabem dizer se são mediadores ou observadores, não há um perfil claro em relação ao que vão fazer. E também temos a experiência: Tivemos a EMOCHIM [Equipa Militar de Observadores Internacionais da Cessação das Hostilidades Militares], vários mediadores, tentou-se de tudo, gastou-se rios de dinheiro, deu-se mordomias a toda gente, mas não se resolveu nada. Os problemas dos moçambicanos têm de ser resolvidos pelos moçambicanos, envolvendo todas as partes. As outras partes vêm apenas para fazer a sua parte, mas não vão resolver os problemas enquanto os moçambicanos não tiverem os pés no chão.