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Ilha de Ano-Bom estabelece ligação da Guiné Equatorial à lusofonia

Glória Sousa5 de agosto de 2014

Integração da Guiné Equatorial na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa tem feito correr muita tinta. Uma pequena ilha está no centro da ligação cultural, histórica e linguística do país à lusofonia.

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Foto: picture alliance/ANP

Apesar das críticas ao regime do Presidente Teodoro Obiang Nguema, à situação dos direitos humanos no país e à fraca difusão da língua portuguesa, a Guiné Equatorial integrou oficialmente a comunidade lusófona a 23 de julho, na cimeira de Timor-Leste.

Uma pequena ilha da Guiné Equatorial, no Golfo da Guiné, com pouco mais de cinco mil habitantes e 17 km² estabeleceu a ligação cultural, histórica e linguística do país à lusofonia. Na ilha de Ano-Bom fala-se Fá d’Ambô (em português, Falar de Ano Bom), língua que é fruto da presença portuguesa. De acordo com o investigador Gabriel Antunes Araújo, da Universidade de São Paulo (USP), o Fá d’Ambô advém mais precisamente do crioulo de São Tomé.

“Depois de a colonização de São Tomé ter começado a ser mais ou menos bem sucedida, os portugueses a partir de São Tomé passaram a colonizar as ilhas mais próximas, como a ilha do Príncipe e a ilha de Ano-Bom”, explica o investigador.

“Populações que já falavam essa língua ancestral em São Tomé foram levadas para a ilha do Príncipe e de Ano-Bom. Em Ano-Bom, a população ficou isolada. E a língua criou características totalmente novas e acabou por tornar-se numa espécie linguística chamada Fá d’Ambô”, revela.

São Tomé na rota do “português” na Guiné Equatorial

Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, Präsident von Äquatorial-Guinea
Teodoro Obiang Nguema, presidente da Guiné EquatorialFoto: DW/C. Vieira Teixeira

Segundo o investigador, a expansão do antigo império português em África, no final do século XV e início do século XVI, deu origem à formação de novas línguas. Do português e das línguas locais, apareceram as chamadas línguas crioulas de base portuguesa.

As duas ilhas estão relativamente próximas, no Golfo da Guiné. Para ir de Ano-Bom à capital da Guiné Equatorial, Malabo, é necessário cruzar São Tomé. Por isso, existe uma proximidade semântica e fonética principalmente entre o Fá d’Ambô e o crioulo de São Tomé, mas também com o português.

“A palavra ‘preto’, da cor preta, é pronunciado em Fá d’Ambô ‘péto’. É muito parecido e consegue-se rastrear a origem, mas ela não é idêntica ao português”, exemplifica, explicando que “o mesmo acontece com muitas outras palavras”.

Uma equipa de investigadores da universidade brasileira esteve na ilha, em 2011, para estudar o idioma local a conferir a sua origem portuguesa. Segundo o investigador Gabriel Antunes Araújo, a herança portuguesa na ilha Ano-Bom, da Guiné Equatorial, além de linguística é também cultural e religiosa.

"A religião da ilha Ano-Bom é a religião católica. É claro que é misturada com muito sincretismo. Mas se pensarmos no contexto africano, o catolicismo tem um alcance muito mais raso em África do que em Ano-Bom”, considera o especialista. Nesta ilha, de acordo com Gabriel Antunes Araújo, “as pessoas são católicas como no século XVI, de uma forma bem diferente do catolicismo atual”.

Adesão do país é “jogada no xadrez político e econômico”

O investigador entende que a Guiné Equatorial conseguiu integrar o espaço lusófono porque a própria CPLP colocou requisitos “muito simples”. A ilha de Ano-Bom serviu como prova de ligação histórica e a adoção do português como língua oficial fez-se formalmente num decreto assinado pelo Presidente Teodoro Obiang Nguema. Mas, na realidade, o português praticamente não existe.

Apesar de o português ser agora a língua oficial do país, o investigador acredita que “não se consegue encontrar 20 pessoas na Guiné que saibam português”. “Não existe difusão do português na Guiné Equatorial. Para termos uma ideia, tirando os corpos diplomáticos do Brasil e Portugal e alguns funcionários da embaixada, um ou outro fala português de Portugal, ou porque morou lá ou porque casou com alguém que é de Portugal”, afirma o investigador brasileiro, Gabriel Antunes Araújo, concluindo que a adesão da Guiné Equatorial é mais uma jogada no xadrez da política e economia internacionais.

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