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Guiné Equatorial aumenta prisões arbitrárias, diz Anistia Internacional

22 de junho de 2011

Detenções no país ocidental africano aconteceram antes de cimeira da União Africana, órgão atualmente presidido pela Guiné Equatorial, que estaria usando argumento da “segurança” antes do evento

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O presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang, disse no início de junho que não há violações de direitos humanos no país ocidental africano
O presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang, disse no início de junho que não há violações de direitos humanos no país ocidental africanoFoto: AP

Em relatório publicado na terça-feira (20/6), a organização de defesa dos direitos humanos Anistia Internacional denunciou um “aumento das prisões arbitrárias” na Guiné Equatorial, que preside atualmente a União Africana (UA) e que acolhe entre 29/6 e 1/7 a 17ª cimeira do órgão.

Segundo a Anistia Internacional, aparentemente, as detenções estariam sendo justificadas pelo governo da Guiné Equatorial como medidas de segurança antes do encontro africano. “Mais recentemente, houve estrangeiros que foram presos – o que tem ligação direta com a organização da Cimeira da União Africana que acontecerá no final do mês”, afirma Erwin van der Borght, diretor do Programa África da Anistia Internacional. “Temos medo que as autoridades abusem dos direitos das pessoas, especialmente os estrangeiros – também os que estão legalmente no país. Tudo isso o governo faria usando o argumento da segurança [para a cimeira]”.

Cimeira simbólica esbarra na imagem negativa do país ocidental africano

Enquanto o petróleo aumentou a renda per capita no país, concretamente a população vive com muito pouco
Enquanto o petróleo aumentou a renda per capita no país, concretamente a população vive com muito poucoFoto: AP

A Anistia cita que muitos dos detidos teriam sido submetidos a maus tratos, segundo a organização. “Em maio, por exemplo, vimos [a detenção de] cerca de cem estudantes [sem razão aparente], ou também [a prisão de] políticos e supostos opositores, em abril. Essas pessoas foram libertadas com rapidez relativa, mas as prisões foram completamente arbitrárias”, descreve Erwin van der Borght.

Segundo a imprensa, o presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang, vê na primeira cimeira da UA a ser sediada pelo país um encontro simbólico, já que ele quer mostrar os mais novos progressos da Guiné Equatorial – um país que, até a descoberta de petróleo em meados dos anos 1990, era um dos mais pobres do continente africano. Os lucros do petróleo deram à Guiné Equatorial rendas per capita equivalentes à da Alemanha, do Japão ou do Reino Unido em 2010, mas os padrões de vida são muito pobres, diz a organização de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch.

Também a Human Rights Watch denunciou, em conjunto com a organização EG Justice, baseada nos Estados Unidos, que o governo da Guiné Equatorial teria gasto mais de 830 milhões de dólares na construção de um complexo de luxo para a cimeira em Sipopo, um sítio paradisíaco a 10 km da capital Malabo.

Segundo as duas organizações, que divulgaram informações nesta quarta-feira, 22/6, o governo da Guiné Equatorial também restringiu manifestações públicas e relatos críticos na imprensa.

No início de junho, Teodoro Obiang afirmou que a Guiné Equatorial não viola os direitos humanos, uma declaração que bate de frente com as acusações, já há anos, de várias organizações internacionais. “A Guiné Equatorial tem uma longa história de maus tratos, de torturas, de prisões; infelizmente, parece que estas práticas continuam”, diz van der Borght.

Tawanda Hondora, vice diretor da Anistia Internacional, exigiu que as autoridades guinéu-equatorianas acabassem com a “alarmante onda de prisões, de torturas e de maus tratos contra pessoas que estão apenas exercendo seu direito de expressão”.

Manifestações proibidas após início de revoltas no mundo árabe

Rico em petróleo, país também se tornou alternativa de investimento para países como os EUA
Rico em petróleo, país também se tornou alternativa de investimento para países como os EUAFoto: AP

A Anistia Internacional denuncia ainda que todas as manifestações na Guiné Equatorial foram proibidas desde o início da chamada “primavera árabe” – a onda de revoltas populares em países como Tunísia, Egito, Líbia, Síria e outros.

A organização de defesa dos direitos humanos diz que também os controles policiais aumentaram a partir de meados de junho na cidade portuária de Bata, na parte continental da Guiné Equatorial (composta por um arquipélago no Golfo da Guiné e por um território que fica entre Camarões e Gabão, no continente). A Anistia Internacional pede que os migrantes em situação irregular sejam tratados “com humanidade e em conformidade com a lei”.

Marise Castro, pesquisadora sobre a Guiné Equatorial da Anistia Internacional, disse à Deutsche Welle que as revoltas no norte da África parecem ter criado “temores de que os protestos poderiam se repetir no país. Então eles começaram a prender pessoas, como medida de prevenção, no caso de cidadãos pensarem em manifestar em ocasiões como o 1º de maio [dia internacional do trabalho]. Organizações políticas que tentaram fazer manifestações tiveram os protestos proibidos”, relatou Castro.

Além disso, a divulgação de informações a respeito de assuntos como as violências pós-eleitorais na Costa do Marfim e a posse do atual presidente daquele país, Alassane Ouattara, teriam sido proibidas pelo governo da Guiné Equatorial. “Não existe imprensa livre na Guiné Equatorial. Não existe imprensa independente. Existe a imprensa antiga, que é nacional e que não diz nada para contradizer o governo”, denuncia a pesquisadora Marise Castro.

“Após as revoltas no mundo árabe, e também a crise na Costa do Marfim, a imprensa citou o norte da África, mas o assunto da Costa do Marfim foi totalmente proibido. Um jornalista da rádio do governo foi tirado do ar e suspenso por ter mencionado a questão na Líbia. As emissões em língua francesa foram suspensas por tempo indeterminado”, relata.

Sobre o fato de a Guiné Equatorial libertar presos políticos, o que iria de encontro ao comportamento repressivo do governo, a pesquisadora rebate: “Nos últimos anos, o governo tentou limpar a própria imagem. No início de junho, libertaram vários prisioneiros políticos. Mas o problema é que não há mudança estrutural. Prender ou soltar pessoas não muda nada no sistema, a não ser que haja vontade política para mudar o sistema todo”, afirma.

“Então, até que haja medidas implementadas para acabar com prisões arbitrárias e para permitir a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa, por exemplo, prender ou soltar pessoas não melhora a situação de direitos humanos no país”, diz Marise Castro.

Autora: Renate Krieger

Edição: António Rocha