Conflito fronteiriço: Bissau deve convocar CEDEAO?
15 de fevereiro de 2018Em conversa com a DW África sobre os incidentes ocorridos na fronteira entre os dois países, o jurista guineense, Carlos Vamain, recorda que a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) propôs a implementação de mecanismos para uma integração económica na região fronteiriça entre a Guiné-Bissau e o Senegal, abrangendo também a Guiné-Conacri, mas que o acordo ainda não saiu do papel.
Segundo explica, nesses países "há muitas barreiras não tarifárias que impedem a liberdade de circulação das pessoas, que contraria o princípio sacro-santo daquela organização regional. Portanto, ninguém tem que pagar para atravessar a fronteira”.
Carlos Vamain lembra ainda que existe uma diretiva da CEDEAO nesse sentido, mas que "nenhum Estado, lamentavelmente, cumpre”.
Talvez, se a diretiva apontada pelo jurista fosse cumprida, alguns dos incidentes na região fronteiriça entre a Guiné-Bissau e o Senegal, que já resultaram, inclusive, na morte de cidadãos guineenses podiam ser evitados.
Sessão extraordinária da CEDEAO
Na segunda-feira (12.02) um grupo do Movimento de Cidadãos Inconformados tentou realizar uma vigília em frente à Embaixada do Senegal, em Bissau, em sinal de repúdio pelos assassinatos de cidadãos guineenses por elementos de segurança do país vizinho. Mas, a iniciativa foi impedida pela polícia guineense.
Entretanto, o advogado Carlos Vamain considera que a Guiné-Bissau deveria tentar convocar uma sessão extraordinária da CEDEAO para debater esta questão, pela sua gravidade. E questiona: "O que se pode esperar do Presidente da República, José Mário Vaz?”
Para o jurista, embora não se pode esperar muita coisa, mas pode-se fazer pressão para que o Presidente da República, José Mário Vaz, consiga movimentar no sentido de resolver essa questão, pelo menos para prevenir que não ocorra mais incidentes desse tipo nas zonas da fronteira entre a Guiné-Bissau e os países vizinhos.
"Estou a falar da Guiné-Conacri e também do Senegal. Portanto, eu penso que ele como chefe de Estado da Guiné-Bissau, que é parte integrante da CEDEAO, devia perfeitamente convocar uma sessão extraordinária da Comunidade para debater esse assunto”, afirma Carlos Vamain.
O problema – na opinião do jurista – está na ausência do sentido de Estado por parte dos governantes e a ausência do Estado em toda a extensão territorial da Guiné-Bissau.
Outro conflito por resolver
Além dos incidentes nas zonas fronteiriças, um outro conflito que carece de solução diz respeito à fronteira marítima entre a Guiné-Bissau e o Senegal. Segundo Carlos Vamain, há questões que ficaram por resolver no âmbito do acordo assinado entre os dois países em 1995, com validade de 20 anos, que prevê uma exploração conjunta dos recursos marinhos.
"Ali significa que não houve equilíbrio nessa negociação que resultou do acordo de cooperação conjunta. Para a exploração de recursos haliêuticos [o acordo determina] 50 por cento para cada uma das partes e para a exploração de petróleo a Guiné-Bissau teria 15 porcento e o Senegal, 85 por cento”, sublinha Vamain.O advogado concorda com a negociação em curso para a revisão do acordo, que caducou no ano passado. A tentativa, com outro Governo legítimo, seria no sentido de obter melhor compensação para a Guiné-Bissau no que toca à partilha dos recursos existentes – reforça Carlos Vamain.
"Se bem que Senegal estaria disposto que houvesse mais rapidamente um acordo, mas penso que não dá, não é possível”, argumenta o jurista.
O contencioso entre os dois países faz parte do novo livro do constitucionalista guineense, que é lançado esta sexta-feira (16.02) em Lisboa. No livro, de cunho académico, intitulado: "Ação de Nulidade do Laudo Arbitral perante a Corte Internacional de Justiça: o caso Guiné Bissau-Senegal", o autor apresenta ainda perspetivas para a solução desta questão do ponto de vista jurídico (doutrinal e jurisprudencial).
"Resta à Guiné-Bissau a via diplomática para tentar resolver o problema a nível da cooperação conjunta", sublinha o jurista. "Ou, se entenderem que não faz sentido, que se termine pura e simplesmente com essa cooperação entre o Senegal e a Guiné-Bissau naquela zona", acrescenta.