Bissau: Como terminará a guerra entre Sissoco e Nabiam?
16 de novembro de 2021O chefe de Estado guineense, Umaro Sissoco Embaló, ameaça demitir o Governo ou dissolver o Parlamento na reunião do Conselho de Estado marcada para esta quarta-feira (17.11) em Bissau. Sissoco Embaló diz que o primeiro-ministro, Nuno Gomes Nabiam, "não ganhou as eleições para chegar ao poder".
"Não podemos escamotear a verdade - há uma crise", afirma João Alberto Djata, vice-líder da bancada parlamentar do Partido da Renovação Social (PRS), que faz parte da coligação governamental. "Mas a magnitude da crise não justifica nem a dissolução do Parlamento, nem a demissão do Governo".
Para Djata, "o que se nota é uma dificuldade de relacionamento dos órgãos de soberania, algo que deve ser negociado".
Avião suspeito veio aumentar a tensão
O conflito entre os dois governantes agudizou-se quando o Governo mandou reter um "avião suspeito"no aeroporto de Bissau.
O Presidente da República reconheceu que a aeronave aterrou sob as suas ordens. Mas o primeiro-ministro pediu apoio à comunidade internacional para investigar "as circunstâncias suspeitas" envolvendo o Airbus A340, frisando em comunicado que "estancar" o tráfico de armas e drogas "é um objetivo de altíssima prioridade para o Governo".
Esta terça-feira (16.11.) de manhã, Umaro Sissoco Embaló cumprimentou todos os convidados presentes nas comemorações do 56.º aniversário da criação das Forças Armadas, mas ignorou por completo o primeiro-ministro. Nuno Gomes Nabiam relativizou o caso: "As minhas relações com o Presidente da República são normais. Pode haver divergência de pontos de vista, mas penso que isso é conjuntural, não existe nada de anormal", disse.
"O sistema político guineense já deu o que tinha a dar"
Nelvina Barreto, vice-presidente do Partido da Unidade Nacional (PUN), sem representação parlamentar, diz que esta guerra aberta põe a nu as fragilidades sistémicas da Guiné-Bissau.
"O sistema político guineense já deu o que tinha a dar", comenta Barreto em declarações à DW África. "É um sistema que claramente não está para servir a população e que se autoalimenta destes conflitos. Basta ver o que se passa em relação à questão do narcotráfico e, agora mais recentemente, com esta história do avião."
A Procuradoria-Geral da República (PGR) da Guiné-Bissau esclareceu que o caso do "avião suspeito" não tem qualquer ligação com a operação de combate ao tráfico de droga, que está em curso no país.
Remodelação e diálogo são a solução
A antiga ministra da Agricultura, Nelvina Barreto, está expectante em relação ao anúncio de Sissoco Embaló desta quarta-feira.
De qualquer forma, Barreto não acredita que "qualquer solução que o Presidente tire da cartola, de surpresa, possa servir corretamente o país. Vai servir, de momento, os interesses de um ou de outro grupo".
O Presidente da República "não tem certamente uma solução para esta crise, porque ele próprio faz parte do problema. Portanto, não espero nada de bom, porque qualquer solução não será estável e sustentável", antevê.
No último fim de semana, o chefe de Estado guineense afirmou que o Governo não tem conseguido lidar com a onda de greves e problemas sociais. No entanto, para o deputado do PRS João Alberto Djata, a solução não é dissolver o Parlamento, mas remodelar o Governo e dialogar com todas as forças políticas.
"Pensamos que pode haver uma remodelação profunda para que haja uma nova dinâmica que venha resolver estes problemas definitivamente", entende.
"Rutura com consequências imprevisíveis"
O politólogo guineense Rui Jorge Semedo diz que a Guiné-Bissau mergulhou numa crise institucional porque o Presidente deixou de respeitar a Constituição da República.
"Por aquilo que temos acompanhado, o Presidente tem assumido esse papel de agitador, às vezes com saídas desnecessárias, com acusações, com ataques, o que provoca um desequilíbrio institucional entre os órgãos de soberania", argumenta.
Mas o analista refere que o Presidente está a dar tiros nos próprios pés, porque tanto Nabiam como Sissoco Embaló chegaram ao poder "sem obedecerem" a várias normais legais.
Jorge Semedo prevê uma rutura com consequências imprevisíveis. Por isso, espera "da parte do Conselho de Estado um equilíbrio necessário para poder orientar o Presidente da República, que parece nessa altura um pouco desorientado. Está a abrir frentes em todos os lados: com o Parlamento, o Governo e o poder judicial, algo que não é bom para um país que quer estabilidade".
Por último, o politólogo deixa um conselho a Sissoco Embaló: que "pare de pensar" que vive "num regime presidencialista com pendor militar".