Governo angolano dificulta reconhecimento do Islão
7 de maio de 2014Em Angola a legislação está a ser instrumentalizada para impedir a implantação do Islão, denuncia o ativista dos direitos humanos Rafael Marques e a Comunidade Islâmica de Angola.
Ambas as partes descartam a possibilidade de ser por motivos terroristas ou até pela imigração desenfreada. Segundo os ativistas, trata-se de violação da liberdade religiosa por motivos inconfessos.
CISA acusa governo de discriminação religiosa
Para David Já, secretário-geral da Comunidade Islâmica de Angola (CISA) “o sentimento é de tristeza e de descriminação religiosa".
"Temos uma Constituição que garante o exercício da liberdade de culto a cada um de nós e o país é laico. O Estado não é confissional. Então que se exija na Constituição que os servidores públicos cumpram escrupulosamente, na letra e no espírito da lei, aquilo que a Constituição impõe”, reivindica.
David Já conclui que “discriminar alguém porque pertence a uma religião diferente da cristã viola os direitos humanos".
Em Angola vivem cerca de 800 mil muçulmanos, a maioria proveniente da África Ocidental. Mas as autoridades impedem a prática da religião, tendo até demolido algumas mesquitas em finais de 2013. Atualmente pratica-se o culto apenas em Luanda, uma vez que nas províncias as mesquistas foram encerradas. O argumento usado é a ilegalidade da religião e das construções, uma vez que não obedecem aos requisitos. Primeiro o Governo concedeu licenças temporárias, mas desde 2004 passou a exigir 100 mil assinaturas para permitir um debate sobre o assunto.
O ativista dos direitos humanos angolano Rafael Marques questiona, entretanto, a forma como a legislação é aplicada: “Como é que possível para uma entidade religiosa que queira ser reconhecida em Angola conseguir 100 mil assinaturas para poder apresentar o processo às autoridades?”. Segundo Marques, a lei nesta matéria não é específica e critica: "o próprio processo de recolha de assinaturas passa a ser também um processo ilegal" aos olhos das autoridades.
Legislação como pretexto
Para Rafael Marques a legislação põe em xeque a liberdade religiosa. O ativista não tem dúvidas de que as questões legais não passam de um pretexto para que o Governo angolano atinja objetivos inconfessos.
O ativista questiona o facto do Governo ter gasto 800 mil dólares a investigar o Islão e apenas 250 mil nas restantes confissões. Rafael Marques não acredita que a situação tenha que ver com a associação errada que se faz entre o Islão e o terrorismo, nem com pressão internacional.
O ativista sublinha que circulou informação pública sobre o atual presidente da Assembleia Nacional, o general Fernando Dias dos Santos, antigo primeiro-ministro e vice-presidente, que indicava que este tinha uma associação de negócios com os irmãos Tejideen. Os nomes dos Tedjideen constavam da lista dos Estados Unidos como financiadores do grupo considerado terrorista Hezbolah (movimento xiita).
"Os irmãos Tejideen são libaneses e os libaneses e muçulmanos do norte de África e do Médio Oriente têm boas relações de negócios com a nomenclatura angolana”.
Governo angolano sempre usou a religião em benefício próprio
Marques deixa claro que os membros do Governo angolano não são alheios ao fenómeno religioso, porque “muitos são católicos, outros metodistas e, volta e meia, quando a igreja católica não cumpre com alguns pressupostos exigidos pelo Governo, como o seu apoio incondicional, sofre represálias”.
O site Maka Angola recordou recentemente num artigo que a relação entre o poder e religião em Angola sempre foi marcada pela intolerância política. Mas nota-se claramente uma relação de proximidade entre uma ala da Igreja católica e o Governo.
David Já, secretário-geral da Comunidade Islâmica de Angola, por seu lado, não tem dúvidas de que o Islão é prejudicado em nome do Cristianismo, que a seu ver tem grande influência no seio do poder político: “As pessoas aproveitam-se dos cargos públicos que ocupam e o facto de serem cristãos para estigmatizarem uma outra religião, no caso concreto o Islão”.