Filho de poeta Craveirinha quer eternizar memória do pai
5 de fevereiro de 2016Ao chegar em Munhuana, Maputo, encontramos aberta a porta da bela casa de dois andares. Logo na entrada, quem nos recebe é Zeca Craveirinha, filho do poeta maior moçambicano, José Craveirinha, com quem viveu por muitos anos no local.
Depois da morte do pai, em 2003, mudou-se. Mas fez questão de conservar a moradia quase intacta. A mesa de jantar está cercada por fotografias e pinturas do rosto do poeta e sobre ela repousam seus livros e a medalha e o diploma de Herói Nacional - conferidos a Craveirinha depois de sua morte. Com sua poesia de combate, Craveirinha sonhava com um país independente.
Sentado no sofá de couro na sala de estar, decorada por inúmeras obras de arte, Zeca Craveirinha partilha conosco lembranças da vida cotidiana ao lado do pai.
"A memória mais bonita que guardo do meu pai é estarmos sentados precisamente aqui nesta sala. E eu ia-o provocando. Ele, quando se sentisse provocado, puxava pelos galões e começava a falar. Eu, aí, preparava-me para absorver tudo quanto ele dissesse", recorda.
Intimidade do poeta
Uma escada atrás do sofá nos leva ao segundo pavimento da casa, doada a Craveirinha pelo então Presidente Samora Machel. É aqui que o visitante penetra na intimidade do poeta.
Em seus últimos dias, Craveirinha passava a maior parte do tempo no quarto. Ao lado do armário, uma cadeira de rodas indica dias de pouco movimento. Ao centro, a cama de solteiro está cuidadosamente estendida.
"Ele tinha que fazer uma ginástica para chegar à cama, porque estava toda rodeada de livros. Isto é só uma pequena amostra da roupa. Era uma pessoa que se vestia muito bem. Sempre de casaco, sempre bem posto. Era de uma elegância extrema. Era, sim senhor," diz Zeca Craveirinha.
Ao lado do quarto fica a biblioteca. A estante lotada de livros sobre os mais diversos assuntos é, segundo Zeca Craveirinha, a maior herança que o pai lhe deixou.
"Eu não tinha essa dimensão, mas depois de uma conversa em que meu pai me disse, com muita seriedade: 'Não vos vou deixar dinheiro, vou morrer pobre como nasci. Mas vocês vão ficar como uma grande fortuna. Esses livros aqui.' De fato, sinto-me um multimilionário por ter estes livros, este acervo," revela o filho do poeta.
Fundação José Craveirinha
Zeca Craveirinha quer criar uma fundação, em memória do poeta. O pedido já foi autorizado pelo Conselho de Ministros. Aguarda-se agora as últimas formalidades.
Zeca acredita que, quando a instituição existir oficialmente, será um património de todo o povo moçambicano e uma responsabilidade a ser assumida futuramente por outros membros da família: "Depois de mim, os meus filhos. Os meus filhos terão a responsabilidade de passar esse legado para os meus netos."
Em princípio, "a sede da fundação vai ser a casa onde ele viveu. Os documentos estão lá todos", conclui Zeca Craveirinha.
A casa de José Craveirinha deverá, então, abrir suas portas aos visitantes.