Discurso de Filipe Nyusi chega tarde e é "extremamente duro"
19 de novembro de 2024Há muito que os moçambicanos aguardavam por um pronunciamento oficial do chefe de Estado sobre a crise política que o país vive, face às denúncias de fraude eleitoral e má-governação.
O candidato presidencial Venâncio Mondlane, insatisfeito, convocou uma onda de protestos. Finalmente, Filipe Nyusi, 30 dias depois do início do levante popular, falou ao povo. Porém, foi questionado pela demora: "Era preciso passar quase 30 dias para o chefe de Estado fazer um discurso para chamar a razão as partes, mostrando que o Estado sempre resolveu os problemas na base do diálogo?", indaga o académico Hilário Chacate.
"Era preciso morrerem tantas pessoas? Era preciso fecharem-se as fronteiras, sobretudo a maior fronteira com a África do Sul, de Ressano Garcia, com o maior volume de negócios? Era preciso chegarmos ao ponto em que os portos funcionam a meio gás? Era preciso uma reação da comunidade internacional bastante contundente sobre tudo o que está a acontecer no país?"
Prevalece a arrogância?
O Presidente da República defraudou as expetativas do analista Hilário Chacate, que esperava um tom menos rígido, considerando o nível de tensão política e consequente violência.
"Eu esperava outro tipo de discurso do chefe de Estado", comenta Chacate em declarações à DW. "Eu esperava um discurso muito ponderado, muito reconciliatório, muito mais de aproximação das partes desavindas, e eu nos primeiros minutos não encontrei isso, mas sim um discurso um pouco próximo do que temos estado a acompanhar através do comandante-geral da Polícia, através do ministro do Interior, através do porta-voz do Governo."
A Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), que governa o país há quase 50 anos, é vista como bastante arrogante e pouco aberta às insatisfações de outros setores. Mas avaliando concretamente o discurso de Filipe Nyusi, Hilário Chacate divide-o em dois momentos.
O primeiro como "um momento extremamente duro, tendo em conta o contexto. E quando o discurso é bastante contundente, [mostra] que não está a perceber todas essas vozes que clamam [por mudanças nos protestos], não me parece bastante inteligente."
O segundo momento, aos olhos do analista, foi o da demonstração de abertura para o diálogo com os seus opositores com vista ao fim da crise. Questionado sobre a genuinidade desta oferta de Filipe Nyusi, Chacate mostra reticências, baseadas também na demora do poder político em reagir a crise e a abrir-se ao diálogo.
Chacate entende que todas as consequências nefastas dos protestos poderiam ter sido evitadas, se tivesse havido vontade política.