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"Excessos" de Efigénio Baptista não afetam a sua idoneidade

4 de abril de 2022

O posicionamento de Efigénio Baptista no caso das dívidas ocultas tem sido criticado em Moçambique. Analista reconhece "alguns excessos", mas que não põem em causa a conduta do juiz que não quis ouvir Nyusi em tribunal.

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Juiz moçambicano Efigénio Baptista
Foto: Romeu da Silva/DW

Em Moçambique, o Tribunal Superior de Recurso negou o requerimento de alguns advogados de defesa no caso das "dívidas ocultas", que pedia o afastamento do juiz Efigénio Baptista no julgamento sobre arresto de bens dos 19 arguidos.

Os advogados - afastados por Baptista do julgamento do caso - defendem que o juiz de primeira instância não devia pronunciar-se sobre o requerimento do Ministério Público, enquanto estiver pendente um pedido de afastamento do magistrado, que está a ser analisado pelo Tribunal Supremo.

Em entrevista à DW África, Dércio Alfazema, do Instituto para a Democracia Multipartidária (IMD), analisa o posicionamento de Efigénio Baptista ao longo do processo. Reconhece que tem havido "alguns excessos" que, ainda assim, não colocam em causa a conduta do juiz.

Entrevista com o politólogo Dércio Alfazema

DW África: Como encara a decisão do Tribunal Superior de Recurso de indeferir o requerimento dos advogados e manter o juiz Efigénio Baptista?

Dércio Alfazema (DA): É uma posição sensata. É preciso ver quais foram os argumentos trazidos pelos advogados e também a forma como o tribunal sustentou a sua posição, mas é, quanto a mim, sensata, no sentido em que uma decisão contrária poderia, hipoteticamente, ter implicações no próprio julgamento. Com um pedido destes, numa altura em que as audições já estavam praticamente terminadas, era preciso também perceber o que isso significaria para o calendário do próprio julgamento. Por outro lado, é compreensível a posição dos advogados. Eu olho isso dentro de uma estratégia de defesa que teve outros contornos, e eles, em função disso, foram se reposicionar.

Mas este juiz já conhece o processo de uma ponta a outra e chegar a essa altura e trocá-lo, é preciso perceber o que isso poderia significar.

DW África: Os advogados afastados alegam que o juiz da causa não tem sido imparcial na condução do julgamento. Concorda com esse posicionamento?

DA: Bom, esse é um caso bastante complexo, com diferentes nuances em termos também da natureza dos próprios intervenientes, tanto os advogados como os arguidos que estão a ser julgados. Este é um caso que tem um interesse mediático muito grande, tem implicações económicas, políticas e até sociais. Então, seria muito estranho se o curso desse julgamento fosse tão consensual, tão sereno. É um caso que mexeu com a sociedade e o próprio julgamento também está a mexer com a sociedade.

Veja imagens da audição de Ndambi Guebuza

É normal que um ou outro ator não se sinta satisfeito com alguma situação e é normal que, dada a complexidade do caso, o juiz também cometa alguns excessos, dentro de um determinado contexto. Não vejo isso como algo para questionarmos a idoneidade do juiz e do tribunal ou até questionarmos o julgamento. Não houve nada de tão estranho assim que pode desqualificar tudo o que aconteceu até aqui.

Agora, a nossa expetativa maior é em relação à sentença, que tem que ser justa, e isso não significa que as pessoas devem ser condenadas a todo o custo. Têm de ser condenadas à medida da sua responsabilidade. Não é porque o caso tem uma dimensão política que todos devem ser condenados.

DW África: A escolha de Efigénio Baptista para este caso foi encarada com algum ceticismo e, desde o princípio, não reuniu consenso. Ao longo do processo foi apelidado de "tirano". Já na reta final do julgamento, como classifica a conduta do juiz?

DA: Esse é um caso que tem uma dimensão política muito forte, olhando para a natureza dos atores e os valores envolvidos, e também para a estratégia de ataque e desgaste de parte a parte. Nós, como sociedade, tínhamos uma expetativa muito grande em relação à própria Ordem dos Advogados, que seria talvez um ponto de equilíbrio, mas [o julgamento] acabou sendo desgastante até para a própria Ordem dos Advogados. Houve excessos de parte a parte.

Juiz Efigénio Baptista e magistrada Ana Sheila Marrengula
Juiz Efigénio Baptista e magistrada do Ministério Público, Ana Sheila MarrengulaFoto: Romeu da Silva/DW

O Ministério Público é que me pareceu ser um dos atores que esteve mais sereno em termos do exercício do seu papel. Houve excessos [do juiz] que me pareceram ser mais do jeito da personalidade e do ambiente de tensão que o próprio julgamento foi tendo. A natureza do caso conduziu a essas situações todas. Mas, de forma objetiva, ainda não vejo matéria para questionar a idoneidade do juiz pela forma como as coisas aconteceram.

DW África: O facto de o juiz ter negado por diversas vezes – e em definitivo em fevereiro – ouvir o Presidente da República, Filipe Nyusi, em tribunal no caso das dívidas ocultas, belisca de alguma forma a idoneidade de Efigénio Baptista?

DA: Eu penso que o juiz poderia explorar um pouco mais a lei e encontrar possibilidades de como é que isso poderia acontecer. Tudo bem, é complexo, não é fácil ter que chamar ao tribunal um Presidente que está em exercício, e isso não é uma questão só de Moçambique. Eu penso que, para qualquer juiz pelo mundo fora, seria sempre um desafio, ainda mais para este que é um jovem.

Mas eu penso que, a bem da transparência, havendo possibilidades, poderia muito bem ter sugerido a audição do Presidente da República. Mas isto não é algo que se trate de ânimo leve. De facto, ainda fica essa questão que vai sempre ficar como um pendente no julgamento.

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