Cabo Delgado: Faltam fundos para ajuda aos deslocados
4 de agosto de 2021Para aquela agência das Nações Unidas, a situação da crise alimentar no norte de Moçambique é cada vez mais crítica devido a falta de recursos financeiros para aquisição de alimentos. Milhares de deslocados internos dependem dessa ajuda na província de Cabo Delgado, assolada por ataques terroristas há quase quatro anos.
De acordo com Antonella D´Aprile, diretora nacional do PMA em Moçambique, caso não haja um "apoio internacional urgente", a situação poderá agravar-se nos próximos meses.
Em entrevista exclusiva à DW África esta quarta-feira (04.08), a diretora avançou que o PMA precisa de pelo menos 93 milhões de dólares para prestar assistência a mais de 800 mil deslocados internos em Cabo Delgado até dezembro deste ano.
DW África: O PMA alertou em julho para a iminência de "uma crise alimentar fora do controlo" em Cabo Delgado. Como é que está a situação atualmente?
Antonella D´Aprile (AA): Infelizmente, a situação está em agravamento. A província de Cabo Delgado sofre com a crise de deslocados que mais cresce ao nível do mundo. Desde 2017, a província já registou mais de 800 mil deslocados internos. São pessoas que foram obrigadas a abandonar as suas áreas de produção e isso impacta claramente na segurança alimentar das comunidades. A província tem também a mais alta taxa de desnutrição crónica no país.
E mais de 950 mil pessoas, nas províncias do norte de Moçambique [Cabo Delgado, Nampula e Niassa], vão enfrentar entre abril a setembro próximo uma insegurança alimentar devido aos ataques terroristas e fenómenos naturais.
DW África: As ilhas do Ibo e de Matemo, em Cabo Delgado, são duas áreas muito afetadas devido ao elevado número de deslocados. Segundo a imprensa moçambicana, poderão mesmo estar à "beira da crise humanitária". São zonas que preocupam particularmente o PMA?
AA: O PMA está preocupado com todos os distritos da província. A resposta de emergência do PMA vai ao encontro dos deslocados onde eles estão, ou seja, seguimos o movimento das pessoas.
DW África: Em julho, a agência temia ficar sem recursos para continuar com as ações de assistência alimentar aos deslocados. Qual é o ponto da situação neste momento?
AA: Em junho, o PMA deu assistência alimentar para cerca de 700 mil pessoas deslocadas. Mas devido à falta de fundos para os meses de julho e agosto, o PMA programou assistir os deslocados com apenas uma cesta básica por família para cobrir os dois meses. E a distribuição de alimentos poderá ser retomada em setembro caso haja novos fundos.
Neste momento, o Programa Mundial de Alimentação precisa de pelo menos 93 milhões de dólares americanos para puder assistir mais de 800 mil deslocados até dezembro deste ano. Caso não consiga este valor até lá, a assistência alimentar aos deslocados infelizmente poderá ser suspensa.
DW África: E qual tem sido a resposta da comunidade internacional?
AA: Temos tido alguma resposta, mas não o suficiente, porque, só para assistência aos cerca de 800 mil deslocados mensalmente, o PMA precisa de 16,5 milhões de dólares. Então, devido à crise causada pela pandemia da Covid-19, tem sido um pouco difícil mobilizar mais fundos. Temos estado em contato permanente com muitos doadores, mas o apoio não é ainda o ideal. Quero usar esta oportunidade para agradecer o Governo alemão, que anunciou recentemente um apoio ao PMA com cerca de 26 milhões, para ajudar nas ações de assistência aos deslocados e aos efeitos da pandemia da Covid-19.
DW África: A chegada tropas estrangeiras a Cabo Delgado e as operações no terreno poderão "atrapalhar", por assim dizer, o vosso trabalho? Por exemplo, contribuir para a fuga de mais pessoas para zonas onde já há um número elevado de deslocados?
AA: Acho que não, porque o PMA, como uma organização de ajuda humanitária, trabalha segundo princípios humanitários. Então, as forças militares e todas autoridades locais conhecem bem as equipas de apoio humanitário no terreno. Mas vamos fazer todo o esforço de coordenação para que não haja problemas com o nosso trabalho.