Queixa-crime angolana contra ativista português
1 de outubro de 2020Bornito de Sousa e a filha interpuseram uma queixa-crime por difamação em Portugal. Para já não foi deduzida nenhuma acusação contra o ativista Paulo de Morais. Fonte que conhece o processo levantado junto do Ministério Público português disse à DW África que este está na fase de inquérito. Paulo de Morais é acusado pelo governante angolano e sua filha de ter feito sucessivas declarações públicas que alegadamente denigrem a imagem de Naulila Diogo Graça e de seu pai.
A 23 de janeiro passado, o ativista denunciou, através da rede social Facebook e do canal televisivo CMTV, uma alegada compra "de luxo" da filha do governante angolano. Naulila Diogo Graça teria adquirido vestidos de noiva criados por uma estilista israelita e acessórios para o seu casamento, ocorrido em outubro de 2014, que terão custado mais de 200 mil dólares.
"Nova princesa de Angola"
Abordado pela DW África, Paulo de Morais, líder da Frente Cívica e um dos fundadores da Transparência e Integridade (TIAC), reafirma as críticas que fez na altura e considera inadmissível a ostentação destas práticas, mantendo ser um facto de conhecimento público a "filha do atual vice-Presidente de Angola ter gasto no seu casamento muitos milhões".
A queixa não tem a ver apenas com as referências à compra dos vestidos de noiva em Nova Iorque (EUA), em 2014. Paulo de Morais fez outras afirmações que, de acordo com os queixosos, se traduzem em ofensa à sua imagem e bom nome.
Entre as ofensas está a colagem que o ativista português faz a práticas do anterior Executivo, nomeadamente a comparação à empresária Isabel dos Santos, popularmente conhecida como a "princesa de Angola", visada no conhecido escândalo de corrupção denunciado no âmbito do "Luanda Leaks".
"Selvajaria"
Na sequência deste episódio do vestido de noiva, Paulo de Morais qualificou Naulila Diogo Graça como a "nova princesa de Angola", o que terá desagradado aos denunciantes, que não se reveem nas práticas do anterior Executivo de José Eduardo dos Santos. O ativista faz alusão a Bornito de Sousa, então ministro da Administração do Território (2010-2017), que considera estar a perpetuar práticas condenáveis vindas de anteriores titulares do poder político angolano.
"Ora, num país em que há gente a morrer na rua de fome e de doença, um país que tem das maiores taxas de mortalidade infantil do mundo, um dos países que tem das mais baixas esperanças de vida à nascença do mundo, o vice-Presidente do país gastar no vestido da filha, no seu casamento, cerca de 200 mil dólares, dar disso nota em programas televisivos em Angola e nos Estados Unidos, permitir que a sua filha se trate nos Estados Unidos como se fosse da realeza africana, eu acho isto uma agressividade, eu acho isto até um selvajaria relativamente a um povo que o vice-Presidente do seu país tem que respeitar", disse o ativista à DW África.
Liberdade de expressão
Paulo de Morais deverá ser ouvido no Ministério Público do Porto no dia 20 de outubro, pelo que diz estar seguro das revelações que fez antes. "Os factos que eu revelo nestas comunicações que tenho feito sobre o assunto são objetivos, comprováveis e não carecem de qualquer prova. As opiniões que eu emito sobre esses factos, emito-as no uso de um direito constitucional, que é o meu direito de liberdade de expressão", afirmou.
Igualmente contactado pela DW África, Paulo de Moura Marques, ligado a uma sociedade de advogados, em Lisboa, que representa os denunciantes, não quis avançar mais informações sobre este caso. "Por razões legais, não posso dar nenhuma declaração, em discurso direto, porque o processo está em segredo de justiça. Detalhes, infelizmente nesta fase, eu não posso dar", disse.