Angola: "Preocupante declínio da liberdade de imprensa"
29 de outubro de 2020Em comunicado divulgado esta quinta-feira (29.10), a RSF apela às autoridades angolanas para que não recorram a métodos de predação da informação que remetam aos "dias sombrios da ditadura".
Mais de cem manifestantes, que protestavam no sábado por melhores condições de vida e pela realização das eleições autárquicas, foram detidos sob acusação de crimes de arruaça e dano de bens públicos, estando o julgamento a decorrer esta semana.
No decurso da manifestação, dois jornalistas, Suely Moreno e Carlos Tomé, um fotógrafo, Santos Samuesseca, e o motorista, Leonardo Franciso, todos da Rádio Essencial, foram detidos e presos "sem justa causa pela polícia", sendo apenas libertados na segunda-feira (26.10).
Segundo a RSF, foram igualmente detidos e soltos algumas horas depois dois jornalistas da TV Zimbo, dois fotógrafos da Agência France Press, Georges Nsimba e Osvaldo Silva, este último relatou cenas de "agressão policial" referindo que foram "forçados a apagar as imagens".
"Retrocesso lembra a ditadura"
"Ao cobrir uma manifestação, os jornalistas não estavam fazendo nada além do seu trabalho", afirma, no comunicado, o responsável pelo escritório da RSF para África, Arnaud Froger.
Essa "onda de prisões e agressões", refere, constitui "um retrocesso preocupante que lembra os momentos sombrios da ditadura".
"Três anos após a queda do Presidente José Eduardo dos Santos, a liberdade de imprensa continua ser uma conquista em grande parte inacabada em Angola", aponta a RSF.
Reação das autoridades
Para Arnaud Froger, se as autoridades angolanas "desejam sinceramente virar a página de anos de predação das informações, elas não têm escolha a não ser condenar tais atos e punir seus infratores".
A RSF diz que já havia documentado, em outubro, as "graves ameaças" dirigidas a "vários meios de comunicação e jornalistas angolanos pela cobertura do caso Edeltrudes Costa", chefe do gabinete do Presidente angolano, João Lourenço, suspeito de ter desviado fundos públicos.
"O 'site' de notícias independente Correio Angolense, bem como o jornalista 'freelance' e ex-correspondente da RSF, Siona Casimiro, foram alvos de ataques cibernéticos, e o jornalista Carlos Rosado de Carvalho foi censurado por vários canais com os quais colaborava", lê-se no comunicado.
Nesta quinta-feira, na abertura da quarta sessão ordinária do comité central do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA, no poder desde 1975), o Presidente angolano, João Lourenço, lamentou as detenções de jornalistas, "devidamente credenciados", augurando que tal situação "não volte a se registar no país".
Angola ocupa, atualmente, o 106.º lugar entre 180 países no Raking Mundial da liberdade de Imprensa estabelecido pela RSF em 2020.