Governo quer "matar a imprensa privada”, acusa jornalista
18 de agosto de 2020O Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA) tornou público, na semana passada, que "os esforços por si realizados em conjunto com os diretores dos órgãos de informação privados, no sentido de se conseguir um apoio, acabou inglório”.
À DW África, Teixeira Cândido, secretário-geral do SJA, diz que o Estado mostrou-se indisponível em apoiar a imprensa privada. O sindicalista lamenta a posição tomada pelo Governo que, a seu ver, coloca estes órgãos numa "situação de incerteza.”
"Porque esta situação poderá colocar, de certo modo, as empresas expostas. Muitas empresas não têm condições de continuar a funcionar. É uma situação de incerteza completa. Entendemos que o Estado tinha a possibilidade de encontrar outras vias porque o que se solicitou não foi necessariamente dinheiro”, justifica.
O que pediram ao Estado?
O que se solicitou, segundo Teixeira Cândido, foi a intermediação do Estado para concessão de créditos que seriam pagos com juros bonificados e a canalização de publicidade institucional à imprensa privada, entre outras propostas.
"Consistia exatamente, por exemplo, o Estado orientar as grandes empresas àquelas públicas que publicitam, a canalizar eventualmente 70% da publicidade para imprensa privada e 30% para imprensa pública”, conta.
"Como outras, os próprios departamentos ministeriais que têm publicidade, têm campanha sobre este ou aquele evento, podiam canalizar 70% para imprensa privada. E um conjunto de medidas que poderiam muito bem serem tomadas para acudir a imprensa privada”, conclui o secretário-geral do SJA.
Imprensa privada a morrer
A DW África tentou sem sucesso ouvir o Governo. O apoio a imprensa privada consta na lei de imprensa há quase trinta anos, mas nunca foi implementado. O analista e jornalista angolano Ilídio Manuel encontra uma única razão para isso:
"Nota-se logo que não há uma vontade. Há uma tendência de se querer matar a imprensa privada”, interpreta.
O Novo Jornal é um dos poucos semanários ainda em circulação. Fora de circulação já andam os jornais privados Visão, Manchete, entre outros. Por outro lado, a rádio UNIA, afeta à Universidade Independente de Angolana, anunciou este mês o encerramento das suas emissões por falta de capacidade financeira.
Vozes críticas abafadas?
Ilídio Manuel lembra que, num passado recente, muitos jornais críticos ao Governo como, por exemplo, o Semanário Angolense e o Agora, foram comprados por pessoas próximas ao poder político.
"Nós já temos episódios de um passado triste em que os órgãos de comunicação social privados com um pendor bastante crítico acabaram por ser comprados e depois foram praticamente aniquilados.”
A passagem do grupo Media Nova - detentor do jornal O País, TV Zimbo e Rádio Mais - para a esfera jurídica do Estado e o eminente confisco da TV Palanca e Rádio Global, poderão empobrecer ainda mais o setor privado da comunicação social nos próximos tempos.
Ilídio Manuel lembra também que uma imprensa livre e plural contribui para o processo democrático angolano.
"Não se tem ainda aquela ideia de que a imprensa é um parceiro importante na democratização do país.”