Analistas veem interesse político em não esclarecer crimes
15 de julho de 2022Pouco antes de ser assassinado, o jornalista Ricardo de Melo foi confrontado por um general que lhe pediu ponderação nas matérias ligadas operações militares secretas, publicadas no seu jornal Imparcial Fax.
O bissemanário dedicava-se a denunciar corrupção e o abuso de poder, salienta José Gama, jornalista angolano radicado na África do Sul.
Gama acrescenta que, por altura do seu assassinato, Ricardo de Melo preparava-se para entrevistar, no Bailundo, Jonas Savimbi, líder fundador da UNITA. "E, estranhamente, Ricardo é baleado com um tiro no peito à porta de casa", no dia 18 de janeiro de 199, recorda. O jornalista tinha 38 anos.
Um crime por esclarecer há mais de um quarto de século
Durante toda a governação do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, que substituiu António Agostinho Neto na liderança do país em 1979, este crime não foi esclarecido.
O assassinato foi do "interesse do governo", disse José Gama à DW África, adiantando que as autoridades "nem sequer perderam tempo em levar a cabo a investigação até ao fim, para apresentar os principais responsáveis."
Nfulupinga Nlando Victor, ex-presidente do Partido Democrático para o Progresso de Aliança Nacional Angolana (PDP-ANA), foi morto a tiro, a 2 de julho de 2004, na sede do seu partido.
Político morre depois de criticar Presidente
O homicídio ocorreu depois de participar de uma reunião do Conselho da República, onde terá criticado duramente o então Presidente dos Santos.
Para José Gama, o uso da arma de fogo não deixa espaço para dúvidas sobre os perpetradores e suas intenções: "Quer dizer que o autor do crime, ou os autores do crime, queriam que ele morresse."
O jornalista reitera que estes casos não foram esclarecidos porque o Estado não estava interessado. Tanto mais que os serviços de investigação de Angola são competentes para o efeito, diz.
Esclarecimento improvável
Gama defende que sejam continuadas as investigações destes dois casos, para que o Estado não seja visto como o culpado.
"O Estado não procurou justiça pelas essas mortes. Portanto, o Estado acaba por ser o culpado pelo desfecho deste processo que envolve Ricardo de Melo e o político Nfulupinga Nlando Víctor", salienta.
Sediangani Mbimbi, sucessor de Nfulupinga no (PDP-ANA), não acredita que o caso do seu ex-presidente, em particular, venha a ser investigado na atual governação.
"Desde 1975 que existe a governação do MPLA. Até hoje é a mesma governação. Portanto, a mudança de José Eduardo dos Santos para João Lourenço é tipo um motorista que saiu de um para outro entrar, mas a viatura é a mesma", diz.
A DW África tentou, sem sucesso, ouvir as autoridades sobre possíveis progressos na investigação destes casos.